domingo, 30 de agosto de 2009

Momentos e Imagens - 31


A actriz Delphine Seyrig e o realizador Alain Resnais num momento descontraído durante as filmagens de um dos mais belos e enigmáticos filmes de sempre: "O Último Ano em Marienbad" (1961).

sábado, 29 de agosto de 2009

Mastroiani e Fellini



A autobiografia ("Eu Lembro-me, Sim, Bem me Lembro", Teorema, 1997) do actor italiano Marcello Mastroiani é pródiga em episódios curiosos da sua carreira. Como a passagem em que Mastroiani conta como foi filmar o mítico filme "La Dolce Vita" (1960) às ordens de Federico Fellini:
"Foi talvez o período mais belo não só da minha vida de actor, mas da minha vida de homem. O ambiente era sempre festivo, sempre, porque com Fellini não havia momentos de dramatismo - tirando um ou outro problema pela falta de dinheiro, ou de qualquer coisa que não chegava à cena a tempo. Para ele, fazer cinema foi sempre realmente uma brincadeira, uma festa, uma festa contínua.
Só posso repetir-me, ao recordar tanta felicidade, durante aqueles dias, naquele filme que durou seis meses mas que deveria ter durado seis anos. De cada vez um episódio novo, novos encontros. Foi demasiado belo aquele período, foi mesmo demasiado!
Quando dirigia, Fellini conseguia juntar uma grande quantidade de personagens, das maiores às mais pequenas, estabelecendo entre os actores e até entre os figurantes uma relação como que de amigos que estão a fazer uma grande festa. Tinha, por exemplo, uma grande capacidade de se lembrar dos nomes de todos, até da última figurante que estava ao fundo da cena: "Maria! Vai um pouco mais para a direita!, exclamava. Mas este é apenas um pormenor insignificante da personalidade de Fellini. Falar de Fellini num sentido mais completo, mais amplo, levaria livros que ainda não foram escritos."

Mais imagens do Apocalipse

Os produtores do filme do Apocalipse - "2012" - revelaram mais três cartazes de promoção. Destruição e mais destruição, cinema-catástrofe em todo o seu esplendor. Será que que o marketing do filme irá continuar a divulgar imagens de destruição de mais países, com o intuito de globalizar o Apocalipse?
E Portugal, vai ficar de fora? Não se arranja um cartaz com a ponte Vasco da Gama a ser dizimada pelas águas revoltas do Tejo? Ou o Terreiro do Paço a ser engolido pelas entranhas da terra? Talvez estas imagens não tenham o mesmo potencial catastrófico que o Cristo Redentor brasileiro, com os braços abertos, a cair desesperadamente sobre a população...



Quem sou eu para duvidar

"I steal from every movie ever made"

Quentin Tarantino

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Across the Universe

A canção "Across The Universe" dos Beatles, escrita em 1969, tem múltiplas versões. Não tantas quanto o clássico "Yesterday", creditada como a canção com mais "covers" de sempre.
A cantora e compositora Fiona Apple fez uma versão deste tema que foi incluída no interessante filme "Pleasentville" (1998) de Gary Ross. A versão está muito bem conseguida, captando as belas nuances da melodia de Lennon e McCartney. Mas queria era chamar a atenção, sobretudo, para o excepectional videoclip, talvez um dos melhores de toda a década de 90. O cenário é o de um café dos anos 50 (década em que se passa a acção do filme) e vemos Fiona a cantar, com uma calma imperturbável, enquanto ao seu redor, em câmara lenta, vemos actos de violência e vandalismo.
Este contraste entre a violência das imagens e a serenidade da música, contribui para uma sensação visual de grande impacto e estranheza (a qualidade plástica das imagens é inegável). Apesar da minha pesquisa, não consegui apurar o nome do realizador deste magnífico videoclip:

Refresh

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Bergman, by Sparks


E por falar em Ingmar Bergman, convém dizer que os Sparks (duo de músicos americanos com quase 40 anos de carreira) fizeram um álbum totalmente dedicado ao realizador sueco. "The Seduction of Ingmar Bergman" é o resultado de uma encomenda da Rádio Nacional Sueca no sentido da criação de um musical em jeito de homenagem ao cineasta de "Morangos Silvestres".
Os Sparks são um projecto multifacetado que soube adaptar-se às mudanças estéticas ocorridas ao longo das várias décadas, sem nunca perderem o faro para a experimentação pop (numa acepção muito lata) e um sentido de humor assaz subversivo (na esteira de uns The Residents). Os seus últimos três discos são notáveis peças de relojoaria e estética synth-pop (por vezes barroca), sobretudo "Lil' Beethoven" (2002) e "Hello Young Lovers" (2006).
Deste novíssimo disco de tributo a Bergman editado dia 15 de Agosto, ouvi já alguns temas que não desiludem. Muito pelo contrário...
O disco pode ser descarregado aqui.

A ilha de Bergman


Visitei a página da prestigiada editora de DVD Criterion - a "cinemateca online" - e deparei-me com três boas novidades: a edição de uma colecção de filmes de autor e de culto (“art house”), a edição de filmes no novo formato de alta definição Blu-Ray e, mais importante ainda, o lançamento do documentário “Bergman Island” de Marie Nyreröd. Um documentário filmado quatro anos antes da morte do realizador sueco na sua ilha natal, Fårö, em que este revela pormenores do seu método de trabalho, da sua visão da vida e do cinema em geral. Um documentário raro (Bergman não era dado a entrevistas) e de grande qualidade (segundo as críticas) que vale a pena descobrir. Há excertos deste filme no Youtube, e o trailer pode ser visto aqui.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

The Two Man Gentleman Band


Woody Allen haveria de gostar destes The Two Man Gentlemen Band. Mais: era música perfeita para um filme seu. Uma deliciosa mistura de folk, jazz, country, vaudeville, hillbilly, dixieland, ragtime, swing e bluegrass. Editaram há pouco tempo o último disco, "Drip Dryin'", que pode ser ouvido aqui. A par da música irresistível que vem do fundo das entranhas da América rural (que a espaços faz lembrar os Squirrel Nut Zippers), o humor subtil dos The Two Man Gentleman Band também é característica a registar. Como se constata neste videoclip:

Discos que mudam uma vida - 74


Tricky - "Maxinquaye" (1995)

O universo Buñuel - "O Último Guião"


Hoje gostaria de estar, de novo, em Madrid. Às 21h30 estreia, no Museu Reina Sofia, o documentário "El Último Guión - Buñuel en la Memoria", de Javier Espada e Gaizka Urresti, com a prestimosa colaboração do filho do realizador espanhol, Juan Luis Buñuel (à esquerda na imagem), e do argumentista Jean Claude Carrière (à direita). O documentário, de 90 minutos de duração, pretende apresentar um retrato íntimo do cineasta espanhol mais importante de sempre, tendo como base o itinerário das cidades e terras que o marcaram, como Calanda (terra natal), Zaragoza, Madrid, Toledo, Paris, Nova Iorque, Los Angeles y México, onde esteve exilado muitos anos.
Juan Luis Buñuel e Jean Claude Carrière percorrem todos estes sítios relatando os episódios marcantes da vida do realizador, desde as aventuras surrealistas em Paris (onde realizou os seus primeiros dois filmes), as suas amizades com o pintor Salvador Dalí e o poeta Federico Garcia Lorca, até ao exílio nos EUA e no México. O documentário é baseado na magnífica autobiografia do cineasta espanhol: "O Meu Último Suspiro".
Eis o trailer de "El Último Guión - Buñuel en la Memoria", com os depoimentos de duas pessoas que melhor conheceram e admiraram Lus Buñuel:

terça-feira, 25 de agosto de 2009

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Madrid me mata - 2



A livraria madrilena Ocho y Medio é um caso especial. Não é só por se tratar de uma livraria especializada numa dada matéria. É um caso especial porque se trata de uma livraria que parece obedecer a um conceito próprio, especializada em cinema e em cultura audiovisual, num espaço bastante amplo e acolhedor, bem no centro de Madrid. Não deverão existir muitas assim no mundo. Em Espanha, pelo menos, é única. Foi fundada há 20 anos e desde há 6 que se encontra na rua Martin de Los Heros, numa transversal da Plaza de Espanha, mesmo em frente a salas de cinema que programam filmes alternativos. É um espaço no qual o cliente respira a paixão pela sétima arte, não só pela imensidão de livros que cobrem as prateleiras sobre todas as temáticas possíveis e imaginárias sobre cinema, mas também pela decoração da própria livraria, pelos objectos que estão expostos nos vários espaços. A música é seleccionada e de muito bom gosto, criando um ambiente ainda mais agradável para os clientes. Enfim, um paraíso para cinéfilos, amantes de livros e coleccionadores.

Fiquei surpreendido com a quantidade de mensagens (devidamente molduradas) que realizadores e actores famosos deixaram, em jeito de autógrafo, à livraria: desde os granes cineastas espanhóis como Pedro Almodóvar, Bigas Luna, Alejandro Aménabar, Carlos Saura, Alex de La Iglesia, até Woody Allen ou Kim Ki-Duk - sem esquecer actores como Javier Bardem, Penélope Cruz, Natalie Portman entre outros, que passaram pela Ocho y Medio e deixaram o seu especial testemunho de apreço para com esta singular livraria (como a imagem em baixo revela, de Pedro Almodóvar: "O cinema educou-me!"). Para além dos muitos objectos ligados ao cinema (que oferecem um colorido muito especial ao ambiente), destaque para um quadro a giz que serviu de adereço no filme "Volver" (2006), de Pedro Almodóvar. Esse quadro, oferecido pelo realizador à livraria, servia de anúncio do restaurante da protagonista do mesmo filme, Penélope Cruz.
De referir que ainda a livraria dinamiza uma programação própria, como sessões de autógrafos, exposições ou apresentação de livros e tertúlias, como a que aconteceu há poucos meses com o encontro de José Saramago e o realizador Fernando Meirelles, como se pode ver neste vídeo.

A primeira sensação que se fica quando se entra é de grandeza. Julgava que seria uma pequena livraria com meia dúzia de prateleiras. Não imaginava uma espaço tão grande e arejado, com prateleiras imensas divididas por múltiplos temas: realizadores, história do cinema, cinema do mundo, fotografia e cinema, géneros cinematográficos, literatura, biografias de actores, guiões de filmes (alguns com anotações manuscritas pelos próprios realizdores!), cartazes, temas relacionados com produção e questões técnicas, audiovisual, som e música no cinema, t-shirts, revistas (muitas em segunda mão), muitas edições espanholas, mas também francesas e inglesas, etc. Alguns livros são particularmente caros, chegando aos 35 ou 40 euros.

Não houve tempo para vasculhar, prateleira a prateleira, os livros à venda. Seria necessário quase um dia inteiro. Demasiados livros interessantes. Como uma colecção de quatro volumes da editora Salvat sobre a relação entre cinema e música ao longo da história. Só não a trouxe porque custava... 90€. Outro aspecto muito positivo é que a livraria tem três funcionários altamente compententes, conhecedores e atenciosos.
Assim, fiz uma selecção criteriosa e trouxe para casa os seguintes livros:
- "Luis Buñuel: Entre Los Sueños y la Pesadilla" - Jorge Manuel Pardo (uma magnífica biografia sobre o pai do surrealismo no cinema).
- "Acerca de Andrei Tarkovski" - Vários autores (colecção de textos e artigos de técnicos, actores e familiares sobre o cineasta russo).
- "Kubrick - Biografia" - John Baxter (biografia muito interessante sobre a vida e obra do autor de "Laranja Mecânica").
- "En Busca de Woody Allen: Sexo, Muerte y Cultura en su Cine" - Ramón Luque (uma abordagem singular ao universo temático da obra de Woody Allen).
Para ver um vídeo de apresentação da livraria, clicar aqui ou visitar o blogue.

O médico cinéfilo


Só ontem reparei, ao ver um episódio da série "Dr. House" na televisão, que o colega de House, o Dr. James Wilson (interpretado pelo actor Robert Sean Leonard) tem na parede do seu gabinete (pelo menos) dois posters de filmes: "Touch of Evil" (1958) de Orson Welles, e "Vertigo" (1958) de Alfred Hitchcock (na imagem, vislumbra-se do lado esquerdo o poster de "Touch of Evil" e do lado direito o poster de "Vertigo"). Um médico com excelente gosto cinéfilo, portanto.
Se um dia eu entrasse num consultório médico e me deparasse com estes posters de cinema na parede, certamente que a minha confiança e consideração para com esse médico subiria em flecha. Um doutor cinéfilo só pode dar boas garantias médicas!

Díptico - 69


Kirk Douglas e Charles Muntz ("Up")

domingo, 23 de agosto de 2009

Madrid me mata


Cinco dias na capital espanhola dão para muita ou pouca coisa. Depende de vários factores. Seja como for, regressar a Madrid depois de 10 anos é sempre uma experiência revigorante: pelo irresistível ambiente cosmopolita da grande metrópole, pela diversidade e qualidade da oferta cultural, pela riqueza do património histórico, pela simpatia do povo espanhol, e por mais o que se queira. Apesar das altíssimas temperaturas (média de 35 a 45 graus) e do sol impiedoso, passear pelos bairros de Madrid, pela Plaza Mayor, Plaza Cibeles, pela Puerta del Sol ou pela Gran Via, é sempre uma incessante descoberta de sensações. Uma cidade que acolhe turistas de todo o mundo, que fervilha de actividades e propostas para todos os gostos, bolsas e exigências culturais. Um dos motivos que contribuiu para a revitalização cultural da Madrid deveu-se ao movimento cultural na ressaca do franqusimo, ocorrido no início dos anos 80, com a célebre "movida madrileña", da qual fizeram parte inúmeros artistas (músicos, cineastas, artistas plásticos) como o realizador Pedro Almodóvar.
Na capital de "nuestros Hermanos" sente-se que o urbanismo é levado a sério; os transportes públicos funcionam lindamente; não se vê um único prédio degradado (por mais centenas de anos que tenha), os espaços verdes abundam, a arquitectura é límpida e bela como poucas, a limpeza das ruas é imaculada, e os museus oferecem algumas das melhores propostas de arte de toda a Europa. Foi um prazer regressar aos labirintos de salas do Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, e redescobrir os eternos Dalí, Picasso, Man Ray, Miró, Duchamp, Max Ernst, Lichtenstein, Picabia, Klein, Magritte, mas também as exposições temporárias do surpreendente Juan Muñoz (já passou por Serralves). Também surpreendente foi a exposição sobre o modernismo e surrealismo, com obras literárias e audiovisuais dos mestres de sempre. Em duas salas diferentes, duas projecções de dois filmes essenciais de Luís Buñuel: "Las Hurdes" (1933) e "La Edad de Oro" (1930) em cópias magníficas cedidas pela Filmoteca de Madrid.
Por seu lado, outro importante museu da cidade, o Thyssen-Bornemisza, expõe uma extraordinária retrospectiva de Matisse, com pinturas nunca expostas em Espanha. Isto já para não falar da notável exposição permanente de Jan Van Eyck. O museu, que se situa quase em frente do incontornável Prado, implementou uma nova política de portas abertas: até às 23h, diariamente. À custa desta iniciativa, já recebeu perto de 150 mil visitantes nocturnos. A exposição de Matisse mantém-se até 22 de Setembro. De realçar, igualmente, a importante exposição de fotografia de Annie Leibovitz, que se pode contemplar, até dia 6 de Setembro, na Sala de Exposições Alcalá de Madrid. “Annie Leibovitz - Vida de uma fotógrafa, 1990-2005”, compõe-se de duas centenas de instantâneos, entre imagens de grande formato, fotografias do lado mais íntimo e familiar da norte-americana, paisagens a preto e branco e retratos de pequeno formato, também a preto e branco.

Outra experiência notável (especialmente para as minhas duas filhas pequenas) ocorreu com o visionamento de um filme no Cine Imax. Trata-se da projecção mais sofisticada e avançada de sempre, visto que utiliza na mesma sala dois ecrãs gigantes (um tem 900m2, o maior da Europa) com a mais alta qualidade de imagem (3D) e de som digital. A esta inovação de alta tecnologia é chamada de Imax Integral. O sentido de imersão do espectador com as imagens é muito mais intenso do que um vulgar filme de sala comercial em 3D (como o recente "Up"). O desenho da sala é em estilo de anfiteatro romano, com uma incrível inclinação de 45º das cadeiras, permitindo uma visão perfeita de todos os pontos da sala. O filme visionado foi "Gigantes do Oceano", um simpático documentário narrado por Johnny Depp e Kate Winslet. Valeu pela experiência sensitiva de ver um tipo de projecção vanguardista. Veremos se o novo filme de James Cameron irá bater esta tecnologia Imax.
Um aspecto menos positivo de Madrid é a considerável quantidade de músicos-pedintes nas ruas mais movimentadas e no metro. Alguns são banais intérpretes instrumentais, mas outros há que parecem ter saído directamente de uma orquestra profissional, dada a destreza técnica revelada. Cheguei a ver, à porta do El Corte Inglés, um quarteto de cordas a tocar, maravilhosamente, as "Quatro Estações" de Vivaldi, em troca de umas singelas moedas dos transeuntes...
Na passagem pelo Teatro Lope de Vega (em plena Gran Via) não deixei de reparar no enorme cartaz que anuncia o musical "Spamalot" dos Monty Python (a partir de 10 de Setembro), numa produção do famoso grupo Tricicle.
Entretanto, a minha maior descoberta de Madrid foi a livraria especializada em cinema "Ocho Y Medio", bem ao lado da Plaza de Espanha, sobre a qual darei mais informações num próximo post.
Imagem 1: pormenor da Puerta del Sol.
Imagem 2: pormenor da entrada do CineImax.

sábado, 22 de agosto de 2009

Felicidade e conhecimento (ou a falta dele)


O conhecimento contribui para o estado de felicidade? Somos mais felizes quanto mais conhecimentos tivermos? Sócrates (o filósofo, não o outro) dizia que o saber não só não fazia feliz como levava ao sofrimento e à fragmentação do sujeito. Ou seja, quanto mais conhecimento acumulado, mais gerador de angústias e de ânsias em querer saber mais, com tudo o que isso acarreta em termos psicológicos e emocionais para o indivíduo. Supostamente, vivendo na superficialidade do saber, no limiar da ignorância e na ausência de referenciais culturais, o indivíduo tem melhores condições para ser feliz. Mas será que esta premissa não contradiz o sentido da evolução do conhecimento e da cultura na sociedade actual, entendidos como factores considerados essenciais para uma maior (e melhor) cidadania e bem estar social?
Dando um salto desta temática para a o cinema, se há realizador que mais satirizou os que julgam muito saber - mas que no fundo são uns frustrados - esse realizador é Woody Allen. Em "Annie Hall" (1977), há casos paradigmáticos, como já referi aqui. Woody Allen é um atentíssimo observador do comportamento humano, e um indivíduo culto que sabe que o pedantismo intelectual ofusca a verdadeira essência da natureza humana. Para além do exemplo patente no link acima, há outra situação interessante no filme "Annie Hall" em que o personagem Alvy Singer (na imagem) aborda, aleatoriamente no meio da rua, um casal para lhe perguntar isto:

Alvy - "Vocês parecem um casal feliz. É verdade?"
Mulher - "Sim".
Alvy - "A sério? E como se explica isso?"
Mulher - "Oh, eu sou muito superficial e vazia, não tenho ideias nem nada interessante para dizer".
Homem - "E eu sou exactamente igual".

Woody Allen disse um dia, na sequência deste diálogo e desta complexa questão, que preferia "saber" a não ter ideias e ser superficial. Subscrevo.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Os filmes da vida de Kubrick

A biografia (edição espanhola) que ando a ler do Stanley Kubrick, de J0hn Baxter (de onde retirei a anedota do post abaixo), é riquíssima em informação que até o admirador mais incondicional desconhece. Não é um ensaio teórico aprofundado, mas explana, de forma totalmente acessível e pragmática, o percurso pessoal e profissional tão singular do cineasta de "Laranja Mecânica". O livro contém, por exemplo, muitas citações do próprio Kubrick sobre os mais diversos assuntos (e sabemos quão avesso era a entrevistas), depoimentos que ajudam a compreender melhor a sua arte.
Curiosa foi a selecção de filmes preferidos que Kubrick divulgou um dia a um jornalista (finais dos anos 60, porque a partir de "2001 - Odisseia no Espaço" (em 1969 deixou de comunicar com jornalistas). É uma lista de títulos que mais o marcaram como espectador e que o influenciaram para definir a sua linguagem cinematográfica. O que posso dizer a não ser que se trata de uma lista... previsível? Só não faço ideia que filme é esse "The Band Dick" com W.C. Fileds.
Lista:
"Os Inúteis"
(1953) - Federico Fellini
"Morangos Silvestres" (1958) - Ingmar Bergman
"Citizen Kane" (1941) - Orson Welles
"O Tesouro de Sierra Madre" (1948) - John Huston
"Luzes da Cidade" (1931) - Charlie Chaplin
"Henrique V" (1948) - Lawrence Olivier
"A Noite" (1961) - Michelangelo Antonioni
"The Bank Dick" (19409 - Edward Cline
"Roxie Hart" (19429 - William Wellman
"Os Anjos do Inferno" (1939) - Howard Hughes

Spielberg, Deus e Kubrick

Um dia Steven Spielberg morreu, foi para o céu mas São Pedro não o deixou entrar porque Deus não gostava de realizadores de cinema. Enquanto Spielberg desesperava para entrar no céu, viu passar de bicicleta uma figura desastrada, de barbas fartas, vestida de calças manchadas e sapatilhas rotas. Spielberg perguntou:
- "Esse não é Stanley Kubrick?
São Pedro olha para Spielberg com olhar reprovador e exclama:
- "Não, é Deus. Mas pensa que é Stanley Kubrick".

"Avatar" - À espera da revolução


O filme de ficção científica que promete revolucionar o cinema (é mesmo esta a intenção) já tinha um cartaz promocional. Agora tem o primeiro trailer, revelado pelo jornal El País. Trata-se do muito aguardado novo filme de James Cameron ("Exterminador Implacável", "Titanic"), que está a ser filmado e produzido há pelo menos quatro anos. "Avatar" apresenta efeitos especiais nunca vistos, concebidos através de uma tecnologia digital em 3D totalmente inovadora, criada pelo próprio Cameron ao longo da última década. É o próprio realizador que coloca a fasquia da expectativa numa altura estratosférica, ao defender que o seu novo filme é um projecto tão colossal e ambicioso (em termos artísticos, de produção e financeiros) que faz parecer "Titanic" um "piquenique".
"Avatar" conta a história de um veterano de guerra paraplégico que é levado para uma missão num planeta habitado pela raça humanóide Navi, que possui uma cultura própria e irá mudar a vida deste homem para sempre. O filme tem já data marcada de estreia para 18 de Dezembro e aguarda-se que James Cameron ofereça aos espectadores de todo o mundo um espectáculo audiovisual nunca visto.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

"Fausto" - A luz e a sombra


"Fausto" (1926) de F. W. Murnau representa a essência do Expressionismo Alemão, mesmo numa fase em que este marcante movimento estético se debatia com um claro declínio criativo. Murnau é para mim o melhor cineasta do cinema mudo, seguido de muito perto por Eisenstein, Chaplin e Vertov. Murnau era um realizador tecnicamente perfeccionista, com um domínio perfeito da luz e da sombra, e autor de notáveis inovações formais. A exploração dos desígnios do espírito humano foi (quase) sempre transversal a todas as suas obras. Como grande cineasta que era, não tem um único filme menor, todos eles são manifestos superiores da arte cinematográfica (e nem vale a pena mencionar todas as suas películas).
O mito de Fausto de Goethe é revisitado nesta grande produção alemã, tomando como ponto de partida a conhecida história de Fausto que vende a alma ao Diabo para manter a juventude. Murnau constrói um filme portentoso em termos visuais (incrível fotografia), com inúmeros efeitos especiais revolucionários para a época, num verdadeiro tratado filosófico sobre as fraquezas e forças relacionadas com a alma humana, o amor e a morte.
Mesmo para quem conheça outras edições em DVD deste clássico intemporal, aconselho vivamente visionar esta edição da Eureka (está à venda numa qualquer Fnac a preço convidativo). Trata-se de uma cópia magistral, com uma masterização digital da imagem (sem mácula), com excelentes extras (um rico e longo documentário sobre a história da concepção do filme) e, "last but not least", com uma extraordinária banda sonora original assinada por um dos melhores grupos de música francesa prog-rock-avantgarde-experimental de sempre: Art Zoyd (compuseram a música para o "Nosferatu" de Murnau e o "Metropolis" de Fritz Lang entre outros filmes). Asseguro que visionar "Faust" ouvindo a possante música dos Art Zoyd se torna uma experiência avassaladora e outorga uma nova dimensão à obra-prima de Murnau!

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Os preferidos de Tarantino


É sabido que o realizador Quentin Tarantino desenvolveu o seu gosto cinéfilo quando trabalhava num videoclube de filmes alternativos. Nesses anos, viu todo o tipo de filmes de culto, desde a filmografia integral de George Romero, Sam Peckinpah e Roger Corman, até obscuros filmes de artes marciais de série B. Tarantino costuma dizer que foi graças a esses anos de intensa aprendizagem a ver filmes que se dedicou à realização. E a sua careira é o que se sabe...
Agora o cineasta de "Sacanas Sem Lei" revelou ao site "Skymovies" os seus 20 filmes preferidos dos últimos 17 anos - sensivelmente desde que começou a realizar filmes com o fulminante "Reservoir Dogs". A lista é bastante diversificada e, nalguns casos até, surpreendente. Espanta-me, por exemplo, que Tarantino escolha em 2ºlugar da lista um filme, quanto mim, totalmente menor de Woody Allen - "Anything Else", ou que escolha um filme de mero entretenimento inconsequente como "Team America" como um dos melhores das duas últimas décadas. E surpreende-me, igualmente (mas pela positiva), que o cineasta tenha nas suas preferências filmes tão singulares como "Dogville" de Lars Von Trier ou "O Protegido" de Shyamalan.

Momentos e Imagens - 29


O realizador Sergio Leone a preparar um cena de um dos seus famosos westerns.

50 anos de "Kind of Blue"


"Kind of Blue" de Miles Davis comemorou ontem 50 anos de vida.
O disco que mudou para sempre a história do jazz.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O regresso de Spike Jonze


Spike Jonze sempre se revelou um realizador (e actor) à parte. À parte das linguagens formatadas, das convenções narrativas e visuais. Provas? A coleccção imensa e riquíssima de videoclips que realizou a nata da música pop-rock - Björk, Beastie Boys, R.E.M., The Chemical Brothers, Fatboy Slim, Sonic Youth, Daft Punk, Pavement, Yeah Yeah Yeahs, entre outros. Em todos estes trabalhos de realização de videoclips, Spike Jonze deixou a sua distinta marca audiviosual.
No cinema, as suas duas principais experiências deram que falar pela originalidade das propostas, que em parte, diga-se, se deveram aos argumentos de Charlie Kaufman: "Being John Malkovich" (1999) e "Adaptation" (2002).
Já há algum tempo que se fala do regresso de Jonze à realização de longas-metragens, coisa que irá ocorrer já durante o próximo Outono. O filme é baseado numa clássica história infantil que Spike Jonze explora com o acrescento de um imaginário febril. A película em causa intitula-se "Where The Wild Things Are" ("O Sítio das Coisas Selvagens") e mistura live-action com animação digital. O poster é fascinante, pelo que revela e pelo que sugere. O trailer é ainda melhor, não só pela inspirada montagem, mas também pela música, que se adequa como uma luva às imagens. Trata-se da música "Wake Up" dos canadianos Arcade Fire. A canção (por acaso a minha preferida dos dois discos da banda) foi regravada especialmente para o filme de Spike Jonze. Aguardemos, pois, pelo Outono para poder ver esta nova obra do cineasta que um dia foi casado com Sofia Coppola.
Trailer aqui.

"Up" e o sentido da vida


É um prodigioso filme da Pixar. Mais um. Depois no inovador Wall.E, a Pixar brinda o público de todas as idades com um sublime filme de aventuras e entretenimento de inigualável qualidade. Divertido e emotivo, ao mesmo tempo. Se dúvidas houvesse, "Up" prova uma vez mais que o cinema de animação chegou a um patamar artístico (para já não falar da componente tecnológica) que iguala - e por vezes supera - o cinema de "live-action". Não é por acaso que este foi o primeiro filme de animação a abrir o último festival de cinema de Cannes. Como escrevia o crítico Luís Miguel Oliveira no último Ípsilon, este último filme da Pixar consegue ser um filme bem mais maduro emocionalmente (e em termos narrativos) do que muitos filmes ditos convencionais.
Desde logo, pela brilhante sequência inicial, nos quais em breves minutos percorremos as vivências de Carl Fredricksen (o velhote rezingão com cara de Spencer Tracy) desde a infância até à velhice, num exemplo notável de contenção e eficácia narrativa. Depois, pela forma como a magnífica qualidade visual do filme (o 3D quase nem se nota, e ainda bem) está ao serviço de uma forte ideia de história, cujo argumento é explorado e desenvolvido de forma sublime. E recordo que é a segunda vez, desde a morte da mãe de Bambi (no filme "Bambi", 1942), que um filme de animação se centra, de forma tão verosímil e pungente, na ideia da morte (porque é a morte que despoleta os acontecimentos).
No fundo, "Up" é um filme sobre os mais profundos valores e sentimentos humanos, é um filme sobre a solidão da velhice, sobre a relação inter-geracional, sobre a consciência da defesa animal e ambiental (daí que não se restrinja, unicamente, para crianças!). É também um sensível conto sobre os sonhos adiados e nunca realizados e sobre a necessidade de dar sentido à vida mesmo na iminência da morte. Que esse sonho de Carl Fredricksen seja materializado através da fantasia de uma casa flutuante com balões, é apenas um dos contributos para o incrível imaginário que "Up" desperta.
PS - Só para dizer mais duas coisas: a versão dobrada em português é de grande qualidade; a banda sonora original é sublime, da autoria do cada vez mais interessante Michael Ciacchino (autor da música de séries televisivas - "Lost" - de jogos de vídeo e de filmes como "Star Trek", "Ratatouille" e "Cloverfield").

domingo, 16 de agosto de 2009

Releituras de "Nighthawks"

É uma das pinturas mais conhecidas do século XX, um verdadeiro ícone da cultura americana: "Nighthawks" ("Noctívagos") de Edward Hopper. Foi pintada em 1942 e retrata um café, aberto à noite, com clientes sentados e um empregado a servir. A pintura foi inspirada no bairro Greenwich Village de Manhattan após o ataque de Pearl Harbour e expressa todo o clima de depressão da grandiosa Big Apple.
Hopper interessou-se em explorar os espaços urbanos vazios, a solidão de personagens anónimos, representados por situações quotidianas da vida rural e citadina (estações de serviço, motéis, estações ferroviárias, ruas vazias, cenas rurais da Nova Inglaterra e interiores de escritórios). A pintura realista de Hopper acentua a solidão das grandes cidades, com contrastes em termos de luz e de expressividade plástica. É o que acontece com esta obra "Nighthawks": o estranho vazio nocturno da rua contrasta com o interior fortemente iluminado do bar. Não há carros a passar na estrada, não há transeuntes, não há "acção". As personagens não comunicam, sentido-se no ar a solidão das mesmas, num bizarro ambiente nocturno. Actualmente esta obra encontra-se no Instituto de Arte de Chicago.
Esta pintura de Edward Hopper ganhou enorme reputação e divulgação mundial ao longo das décadas e influenciou, sobremaneira, muita da cultura subsequente, do cinema à música (Tom Waits tem uma canção dedicada à pintura), da literatura à televisão. Os pastiches, citações, paródias e homenagens a "Nighthawks" contam-se por centenas. Vejam-se estas releituras do ambiente de "Nighthawks", desde a perspectiva de Lego à dos Simpsons:






sexta-feira, 14 de agosto de 2009

O Mal nos filmes


Sou da opinião que os vilões no cinema despertam maior fascínio do que os heróis. Moralismos à parte, a verdade é que, na ficção, o Mal é sempre mais fascinante do que o Bem. Há alguém mais fascinante do que Jack Torrance (na imagem, em "The Shining" de Kubrick)? Ou Hannibal Lecter em "O Silêncio dos Inocentes" de Jonathan Demme? Ou Norman Bates em "Psycho" de Hitchcock?
O cinema imortalizou muitos personagens malévolos até à medula, sanguinários e aterradores, monstros medonhos com as piores das intenções. O site List Universe recenseou alguns desses personagens mais ameaçadores em diferentes géneros e épocas. É uma lista limitada a dez personagens, quais os mais incríveis e malvados. A suspresa é, talvez, o personagem que o site listou em primeiro lugar. Bom, pensando bem e depois de ler a explicação, de facto faz todo o sentido que aquela criança, aparentemente dócil e inofensiva, mereça o primeiro lugar dos personagens mais ameaçadores. Ver aqui.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Joaquin Phoenix - o enigma


Ainda a propósito do recente filme "Two Lovers" de James Gray, considerado por muita gente um dos mais interessantes melodramas dos últimos anos, é sabido que foi a última participação no cinema de Joaquin Phoenix, o protagonista do filme. Pelo menos é o que o actor tem, repetidamente, dito nos últimos tempos. A verdade é que Hollywood (e não só) está perplexa com a transformação física e de personalidade de Phoenix. Desde que surgiu de barba, cabelo comprido e óculos escuros, o jovem actor não diz coisa com coisa. É certo que esteve internado há três anos devido ao excesso de consumo de álcool. Agora há quem afirme que se afundou novamente nesta dependência. Várias teorias circulam à volta deste comportamento estranho de Phoenix. Há quem afirme tratar-se de um golpe de marketing muito bem montado pelo próprio actor e que mais cedo ou mais tarde, irá regressar ao grande ecrã. Há quem sustente que o actor está com uma grave depressão e psicologicamente alterado. Na verdade, quem o vê no estado actual ou o vê na excelente interpretação no filme "Two Lovers", é tentado a considerar que não se trata da mesma pessoa.
A "bomba" explodiu em Fevereiro no célebre programa da CBS, "Late Show", com o intrépido jornalista David Letterman, no qual o actor foi entrevistado. Nesta entrevista, Joaquin Phoenix surgiu completamente alienado, com atitudes de total alheamento e desinteresse, não respondeu às perguntas de Letterman, esqueceu-se do nome da actriz Gwyneth Paltrow com quem contracenou, colou uma pastilha debaixo da mesa do entrevistador, disse que não sabia porque se retira da carreira no cinema e que vai enveredar pela carreira de músico hip-hop (rapper). Joaquin Phoenix, que até cantou no filme "Walk The Line", quer seguir uma carreira de rapper, aparentemente, não muito promissora.
A entrevista a David Letterman foi realmente embaraçosa e bizarra, levantando legítimos rumores sobre o estado mental do actor que, com o novo look e estas estranhas atitudes, pode estar à beira de um sério esgotamento ou simplesmente a pôr em prática uma elaborada farsa (afinal é actor) à maneira de um Andy Kaufman (actor cómico que assumia várias personalidades de forma quase esquizofrénica). É que Phoenix já tinha sido entrevistado em 2005 no mesmo "talk-show" e a atitude foi muito diferente. Pessoalmente, dar-me-ia gozo que tudo isto não passasse de uma encenação intencional e que daqui a algum tempo (anos?) o próprio actor desmascarasse o embuste. Seria uma prova do grande actor que Phoenix é.
A verdade de todo este enigma poderá vir ao de cima quando estrear o documentário que o actor-realizador Casey Affleck está a fazer sobre Joaquin Phoenix. Aguardemos, portanto.

PS - O comediante Ben Stiller gozou com Joaquin Phoenix aquando da última cerimónia dos Óscares.

Os gostos de Peixoto


A revista de cinema Premiere de Agosto convidou o escritor José Luís Peixoto a revelar os seus gostos cinéfilos na secção "DVDteca Ideal" - Seinfeld à mistura com Moonspell, Bergman com Guillermo Del Toro:

- "O Sétimo Selo" (1957) de Ingmar Bergman
- "A Doce Vida" (1960) de Federico Fellini
- "Apocalypse Now Redux" (1979) de Francis Ford Coppola
- "A Comédia de Deus" (1995) de João César Monteiro
- "Ganhar a Vida" (2001) de João Canijo
- "Dogville" (2003) de Lars Von Trier
- "O Labirinto do Fauno" (2006) de Guillermo Del Toro
- "Seinfeld" de Jerry Seinfeld e Larry David (série 1990 - 1998)
- "Sete Palmos de Terra" de Allan Ball (série 2001 - 2005)
- "Lusitanian Metal" - Moonspell (2008)

Momentos e Imagens - 28


O realizador Samuel Fuller, na praia em cadeira de rodas, no final da carreira.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

2,6 milhões de euros para 4 realizadores

Como hão-de sobreviver os jovens realizadores portugueses quando até os consagrados e com carreiras feitas têm imensas dificuldades em conseguir subsídios para os seus filmes? O Instituto do Cinema e Audiovisual revelou os contemplados com um subsídio total de 2,6 milhões de euros, unicamente para quatro realizadores: o crónico Manoel de Oliveira (700 mil euros); o chileno Raoul Ruiz (700 mil euros, num projecto do produtor Paulo Branco); Bruno Almeida (600 mil euros, para um filme sobre Humberto Delgado - produzido por... Paulo Branco); e Catarina Ruivo (600 mil euros para um filme denominado "Em Segunda Mão").
Como se vê, Paulo Branco continua, ano após ano, a conseguir milhões de euros de subsídio do Estado para os projectos em que está envolvido. Para que estes quatro realizadores tivessem o dinheiro que receberam, ficaram de fora candidaturas de realizadores tão importantes (e veteranos, alguns deles) como Margarida Gil, José Nascimento, Leonel Vieira, Luís Filipe Rocha, António da Cunha Telles e Joaquim Leitão. É um exemplo de como o cinema português continua a não ser devidamente apoiado. Contam-me amigos que conhecem o meio que há lobbies fortíssimos que monopolizam subsídios e apoios estatais, em detrimento do apoio aos novos cineastas e aos realizadores veteranos. Os subsídios estatais e privados à criação cinematográfica no resto da Europa são muitíssimo mais elevados do que em Portugal. Por cá, tirando Paulo Branco e Manoel de Oliveira, que são sempre beneficiados com subsídios anuais (não retirando o devido mérito artístico aos dois, entenda-se), os jovens realizadores desesperam por apoios para a sua actividade cinematográfica, por mais qualidade que os seus projectos possuam. O cinema, por ser uma arte dispendiosa, não vive sem apoios financeiros avultados (ou minimamente consideráveis), venham de onde vierem.
Mesmo o João Salaviza, jovem e confirmado talento nacional que ganhou a Palma de Ouro em Cannes, vai ter imensas dificuldades em fazer filmes em Portugal. A não ser que tenha um forte apoio de uma figura estabelecida no meio, como Paulo Branco ou outro produtor de referência. José Sócrates confessou que tinha dado pouca atenção à cultura durante o seu mandato. Seria bom que emendasse a mão redefinindo o apoio estatal à criação artística em geral, e ao cinema em particular.

Há 110 anos nascia o Mestre


Amanhã, dia 13, assinala-se o centenário do nascimento do realizador Alfred Hitchcock. Continuo a ler a magnífica biografia do mestre do suspense que tem sido uma leitura saborosa e enriquecedora sobre a vida e obra do autor de "Psycho". Ainda há dias revi na televisão (RTP2) o clássico "Chamada Para a Morte" (1954), um sofisticado e refinado filme de suspense sobre uma tentativa de assassínio de uma esplendorosa Grace Kelly. Um filme minimalista e contido na acção e na "mise en scène" (como um outro clássico, "A Corda"), "Chamada Para a Morte" é uma obra que prova a dimensão estética de um cineasta que soube construir a sua própria linguagem e o seu universo temático. Só não teve maior sucesso porque nesse ano, 1954, Hitchcock assinava outra obra-prima de maior impacto e originalidade - "Janela Indiscreta".
É um exercício mental interessante imaginar que filmes faria hoje Hitchcock, aos 100 anos, se tivesse a saúde de um Manoel de Oliveira. Com o seu humor negro, o seu perfeccionismo técnico e o seu conhecimento da mente humana, que abordagens novas traria ao cinema actual?

Primeira versão do filme "O Homem Que Sabia Demasiado" (1934) que deu o título a este blogue. Hitchcock faria um remake em 1956, com as estrelas James Stewart e Doris Day.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Candidatos a James Brown


Acabo de ler na revista de cinema Premiere que Eddie Murphy recusou interpretar o papel de James Brown para um biopic que Spike Lee pretende realizar sobre o músico. Quais os próximos candidatos a encarnar o rei da soul e do funk no grande ecrã? Will Smith? Jamie Foxx? Denzel Washington? Cuba Gooding Jr.? Wesley Snipes? Forest Whitaker? Se nenhum destes actores aceitar, há sempre dois actores que Spike Lee pode convidar: Morgan Freeman ou Sidney Poitier... no papel de de avô de James Brown, claro.

Esculturas naturais no corpo humano

Eis um exemplo de como na arte contemporânea nem tudo está inventado. Veja-se o caso de Levi van Veluw, um jovem artista plástico holandês (nasceu em 1985) que recorre a um material tão simples quanto eficaz para fazer arte: o seu próprio corpo. Claro que não é o primeiro artista a utilizar o corpo como instrumento ou objecto artístico, mas talvez seja deveras original o método criativo utilizado e o resultado visual subsequente.
Levi van Veluw desenvolveu uma série de fotografias a que chamou "Landscapes", que consiste em auto-retratos nos quais o autor utiliza a sua cabeça (e parte do tronco) como "tela" para as suas próprias criações. Levi van Veluw recorre a ervas, galhos de árvore, madeira, pedras, cabelo e outros materiais do dia-a-dia para conceber, de forma minuciosa, estas esculturas e desenhos sobre o seu próprio corpo. Depois fotografa o resultado, sempre no mesmo ângulo e com a mesma expressão facial, e expõe as respectivas fotografias em galerias de arte de todo o mundo.
“Cada elemento é escolhido conscientemente”, diz o artista. “A minha cabeça é o veículo dessas transformações e combinações, mas o rosto inexpressivo – quase universal – permite ao espectador projectar-se no meu trabalho.” Com esta série de fotografias "Landscapes", o artista holandês pretende trilhar uma espécie de itinerário de memórias visuais resultantes de imagens da natureza que impressionam o homem. A fusão do humano com a natureza, ou escultura naturais no corpo humano.
A originalidade do trabalho de Levi van Veluw tem despertado muito interesse por parte de galerias de arte de todo o mundo, tendo já ganho vários prémios pelo reconhecimento da sua obra, inclusive o de melhor fotógrafo de Belas Artes de 2007 no International Photo Awards, dos Estados Unidos.
Para conhecer melhor o trabalho do artista, ir à sua página oficial.