domingo, 13 de janeiro de 2013

"Samsara" - A desilusão



Finalmente vi "Samsara".
As expectativas eram elevadas, depois da alta fasquia artística conseguida com "Baraka" (1992). Ron Fricke, o realizador, aprendeu tudo quando trabalhou - como director de fotografia - com Godfrey Reggio na fantástica trilogia Qatsi (já por diversas vezes comentada neste blogue). 
As expectativas eram altas porque "Samsara" demorou 5 anos a ser concluído e foi filmado em 25 países diferentes. Mas, quanto a mim, as expectativas não foram alcançadas. Depois de ver o filme uma frustrada sensação invadiu o meu espírito. Visualmente e esteticamente, "Samsara" é de uma notável beleza plástica, mas pouco mais há de novo. Ron Fricke limitou-se a filmar sequências da natureza e das mais variadas culturas do planeta (do Oriente ao Ocidente) sem coerência. "Koyaanisqatsi" ou "Baraka" tinham um fio condutor, uma montagem rigorosa e exigente. "Samsara" parece andar à deriva, salta abruptamente de imagem para imagem sem aparente nexo. Daí que o ritmo se ressinta, visto que a própria música não ajuda. 
Apesar de gostar muito do trabalho de Lisa Gerrard (Dead Can Dance) e de Michael Stearns, a verdade e que a música de "Samsara" quase nunca consegue estabelecer uma relação efectiva com as imagens (ou vice-versa). Ao contrário do irrepreensível trabalho de Philip Glass na trilogia Qatsi, aqui a música não impõe uma coerência ao discurso visual, parecendo mera decoração de fundo. A título de exemplo, a toada ambiental predomina em 80% do documentário e só ao fim dos primeiros 40 minutos de filme houve uma sequência musical com ritmo (para contrastar com os 39 minutos anteriores). 
Não há dinâmica, não há um climax e um anti-climax, não há surpresa nem originalidade em tudo o que "Samsara" apresenta (toda a estética é devedora da herança Qatsi). Minto: houve uma sequência verdadeiramente nova e inquietante que me deixou surpreendido - o momento de uma performance impressionante do francês Olivier de Sagazan chamada "Transfiguration" (que pode ser vista aqui). Tirando essa sequência de grande impacto, nada mais me entusiasmou. 
E é pena, porque Ron Fricke poderia ter feito uma trilogia de elevada qualidade artística à semelhança da trilogia Qatsi - "Chronos" (1985) + "Baraka" (1992) + "Samsara" (2012), mas não o conseguiu.

2 comentários:

Rafael Barbosa disse...

Estou bastante curioso para visualizar este filme. Ainda não vi Baracka mas gosto bastante da trilogia Qatsi.

cumprimentos,
Rafael Santos
(a-loose-tooth.blogspot.com)

Anónimo disse...

"Samsara" é um filme assustador e incrível. É o exemplo da existência de duas realidades, a Natureza e a Humana, ou melhor, a Cultura dela. Natureza como grandiosamente mais soberana que a segunda realidade, grandiosa ao ponto de ser comparada com o louvou de um altar, como mostra em umas das cenas. "Samsara" é um filme onde se há, esteticamente, o uso da imagem exageradamente suficiente para nos mostrar o quanto a Natureza, enquanto soberana, não consegue nos seduzir. Humanos fracos que nós somos, criamos algo para crer, já que não achamos isso na primeira realidade.Homens começam a criar artifícios em que acreditar, por se sentir só, criando seus próprios mecanismos de sedução... Máscaras de tribos, vestes, de forma arcaica, a Religião. Será que a natureza não foi suficientemente sedutora para com os humanos, ou nós humanos somos tão alienados que não nos deixamos seduzir por ela?
Esse filme nos mostra esses dois extremos e os contra-pontos entre eles. É de uma grande sensibilidade.