terça-feira, 26 de novembro de 2013

A vida de um padre pedófilo





















O homem da imagem exerceu o sacerdócio durante quase 40 anos no estado da Califórnia. Este homem de olhar sereno e apaziguado, de humilde origem irlandesa, chama-se Oliver O'Grady e é o mais reconhecido pedófilo da Igreja Católica moderna. Como este padre, houve muitos outros acusados de abusos sexuais a menores, mas O'Grady é o caso mais mediático e, talvez, um dos mais perturbantes dos últimos anos. Sem qualquer vergonha ou qualquer sentimento de culpa, O'Grady usava o seu charme e autoridade para violar dezenas de crianças e famílias Católicas do Norte da Califórnia.
Durante mais de duas décadas, as suas vítimas foram desde um bebé de 9 meses à mãe de um adolescente, que também tinha sido molestado. Apesar das queixas em várias comunidades, a Igreja foi dissimulando o caso para evitar críticas (mas parece que Ratzinger não teve responsabilidade neste processo), transferindo-o de paróquia em paróquia como se isso resolvesse algum problema. Oliver O'Grady acabaria por ser preso, mas cumpriu apenas metade dos 14 anos a que foi condenado. Hoje em dia passeia-se livremente pelas ruas de Dublin.
Sobre a tumultuosa vida deste ex-padre a realizadora Amy Berg realizou um fascinante documentário em 2006 que resultou numa nomeação ao Óscar para a categoria de Melhor Documentário em 2007 (para além de ter ganho cinco outros importantes prémios). O documentário tem, apropriadamente, o título "Deliver us From Evil", com tradução portuguesa literal "Livrai-nos do Mal".
Em Portugal não estreou comercialmente em sala, mas qualquer interessado poderá conhecer o filme comprando o DVD que em qualquer Fnac custa menos de 10€.
"Deliver us From Evil" é um documentário extremamente bem conseguido pela forma inteligente como aborda um tema tão delicado e sensível. A colaboração do pedófilo assumido foi essencial para o bom resultado do filme, visto que, sem pejo nem mostras de arrependimento, O'Grady revela pormenores escabrosos dos abusos que perpetrou durante décadas. Não há recurso habitual à narração em off, nem efeitos visuais vistosos, não há moralismos condescendentes, nem montagem ou música para sensibilizar emocionalmente o espectador. Nada disso.
Toda a informação do filme é transmitida de forma seca e crua, como secos e crus foram os factos vividos pelas vítimas. É um filme perturbante porque neste homem se espelhavam os valores religiosos, os quais foram brutalmente traídos, corrompendo premissas básicas como a verdade, a fé, a inocência, a moral, o amor, a devoção. Oliver O'Grady violou e abusou de dezenas de crianças (e não só), e a hierarquia da Igreja, hipocritamente, tentou sempre ocultar o problema com soluções de supérflua validade (como a transferência do padre para outras paróquias). As vítimas são agora adultas e não revelam medo no modo como manifestam as suas emoções no filme. Sentem profunda revolta, uma revolta que lhes custou a inocência perdida (como conta uma jovem vítima).
"Livrai-nos do Mal" é um exercício de exorcismo para com o padre pedófilo, mas é também um documento para compreendermos como o mal se encerra, muitas das vezes, sob a capa do humanismo e dos valores supostamente incorruptíveis da religião - de resto, a História é pródiga em comprovar este tese (e hoje cada vez com mais acuidade).
Este homem, Oliver O'Grady, que após cada violação ia à Igreja pedir perdão a Jesus Cristo, cumpriu uma parca sentença na prisão pelos seus hediondos crimes. Agora passeia-se nas ruas de Dublin... Alguém falou em justiça?
O filme pode ser visto aqui (legendas em espanhol).

1 comentário:

Hugo disse...

Deve ser um doc de virar o estômago.

Prisão perpétua seria pouco para este sujeito.

Abraço