Não é por acaso que Darren Aronofsky intitulou o seu último filme "Cisne Negro" e não "Cisne Branco". É bom de ver que o que interessou ao realizador foi explorar (como já o fizera em filmes seus anteriormente) o lado mais obscuro e negro da mente humana. É essa estranha força negra que tudo absorve, que tudo destrói. Daí o fascínio pelo lado negro e desconhecido da realidade...
A frágil e doce bailarina Nina é arrastada para o abismo, precisamente, quando sabe que tem de encarnar o cisne negro. É é nesta dicotomia entre dois mundos opostos que o filme de Aronofsky ganha pontos: na forma como encena o bailado como plataforma de uma terrível e alucinada luta interior de uma mulher dilacerada e dividida por duas pulsões antagónicas.
Natalie Portman é sublime na forma como encarna as duas facetas da personagem e o jogo de espelhos que a levará à loucura (a própria refere que o facto de ter estudado psicologia a ajudou na construção da mesma).
Darren Aronofsky é prodigioso no modo como constrói uma narrativa progressivamente opressiva, angustiante e devastadora.
Na minha memória ficará guardada, durante muito tempo, a espantosa sequência na qual Nina se transforma em cisne negro - a dançar no palco e a ficar coberta de penas negras, enquanto a câmara a filma em movimentos circulares.
São bem evidentes, em "Cisne Negro", a influência directa de grandes obras do cinema sobre paranóia e alucinação, como os notáveis "O Inquilino" (1976) e "Repulsa" (1965), ambos de Roman Polanski, "Don't Look Now" (1973) de Nicolas Roeg e alguns filmes de David Cronenberg (pelo lado da metamorfose da carne). O filme de Aronofsky espelha, de certo modo, o ambiente de crescente paranóia e desagregação de personalidades que os filmes citados abordam.
E uma certeza é inabalável: o Óscar não irá fugir a Natalie Portman.
18 comentários:
Don't believe the hype!
Sim, "Repulsa", mas igualmente "Sapatos Vermelhos, estatelando-se ao comprido...
É um filme que não chega a ser.
A Natalie está assombrosa. Passou a ser uma das minhas actrizes de eleição.
A Natalie está espectacular, mas na minha opinião é o que salva o filme. Demasiados clichés. A mãe que projecta na filha os seus sonhos (a cena do bolo, para mim é a melhor do filme), a sexualidade inibida, o "chefe" que acha que a solução para todos os problemas é o sexo, etc. Pessoalmente, estava à espera que Nina, depois da primeira parte do filme em que é o cisne branco, comece a descambar para o cisne negro através de accões. Estava à espera que ficasse egoista, má, vil, que destruisse as concorrentes ao papel, que encarnasse o lado negro da humanidade e procurasse a autorealização através da destuição dos seus oponentes, basicamente, estava à espera de uma "cabra". Mas assim não aconteceu. O cisne negro, baseia-se em alucinações, em "body horror" (que pessoalmente detesto), provocadas por drogas ou por esquizofrenia. tava à espera que nina abraçasse o cisne negro, e não o cisne negro que abraçasse a nina. O filme tinha uma boa premissa, mas que foi mal aproveitada.
cumprimeentos e parabens pelo excelente blog.
João M.
Escrevi sobre o filme no meu blogue, também não gostei especialmente, 3 estrelas max.
Mas caro João M, se o filme se tornasse aquilo que estava à espera, ou seja, que a Nina «ficasse egoista, má, vil, que destruisse as concorrentes ao papel, que encarnasse o lado negro da humanidade e procurasse a autorealização através da destuição dos seus oponentes, basicamente, estava à espera de uma "cabra"», não seria isso um cliché ainda maior do que aquilo que alega ter sido?
Em relação à sexualidade, a sua exploração não é a solução para todos os problemas. Ou como já li noutro lado em que referem que no filme o ballet é reduzido a uma performance que depende apenas da actividade sexual da protagonista.
Eu não concordo nada com isto, em primeiro lugar Nina já é uma bailarina e uma formidável e isso vem de anos e anos de trabalho.
Depois ela é o cisne branco, perfeita nesse papel. A exploração sexual é explorado para um papel em particular o do sedutor Cisne Negro. Basicamente a femme fatale dos cisnes e aqui sim faz-me sentido essa exploração.
Vou concordar com o Loot.
Sobre o sexo: o sexo aqui é retratado de forma leviana, no sentido de que há um claro contraste entre o pudor que Nina representa e a libertação corporal a que se permeia mais tarde. É nesse sentido que a actividade sexual se torna perversamente irascível, contribuindo para o enloquecimento, o afundar da personagem nas suas "auto-trevas".
Sobre ela ser má, etc: Acho que isso sim, poderia resultar em clichê (também poderia não resultar; dependeria da forma como era tratado). Creio que ficou muito mais interessante ela ser completamente abalroada pela sua obsessão (afinal, foi isso que aconteceu em Requiem, The Fountain e The Wrestler; apenas se redimiu o personagem de Pi), foi engolida pelo seu lado negro, porque pura e simplesmente não sabemos nunca lidar com ele - é o que faz de nós Homens e não seres bons ou maus.
Sr. Alexander Sweden, claro que seria. Mas tambem dependeria de como iria o realizador, o reoteirista, etc. construir esse cliché. Não digo, que o filme seja mau, não o é. Só acho que podia ser melhor. Esta mistura de "Lunar Park" com "Saw" não me agradou. Mas é claro que compreendo que muita gente ache o filme uma obra prima, e que ganhe o oscar. Se o filme fosse concensual, então não havia nada para discutir!
Há aqui qualquer coisa que me escapa e parece contraditória. Os filmes e os cineastas citados - Polanski, Roeg e Cronenberg - como grandes influências presentes em "Black Swan" são todos, sem excepção, do meu mais profundo agrado. No entanto, só de ouvir pronunciar o nome "Aronofsky" me causa arrepios - há muito anos que não detestava tanto a maneira de filmar de um realizador. E só vi dois filmes: o pretensioso "Fountain" e o execrável "Requiem". Por isso me admiro muito pelos nomes citados neste post. Terão realmente alguma coisa a ver com o último filme do homem?
Rato: acho que deves ver o “Black Swan” para perceber como se encaixam as tais influências dos realizadores citados. Podem estar bem ou mal citados, mas eles estão lá.
É a primeira vez que vejo alguém classificar “Requiem” como execrável (eu que considero o seu melhor filme, a par do seu primeiro, “Pi”), mas nisto da arte o consenso é algo que não existe (e ainda bem). Já agora, lê a longa dissertação do Gonçalo Trindade sobre a obra integral de Aronofsky - http://www.ante-cinema.com/2011/02/especial-darren-aronofsky-por-baixo-da-pele-dentro-da-mente/
Não foi à toa que lhe atribuí tal epíteto. Podes ler a justificação no comentário que fiz ao filme.
AQUI
O Rato Cinéfilo
Caro Rato Cinéfilo,
Fazia tempo que não via um suposto critico do cinema desprezar tanto a obra do Aronofsky. Ainda tentei ler a sua crítica sobre o Requiem for a Dream, mas não consegui. É a sua opinião, vale o que vale, assim com a minha.
Felizmente para mim tudo me leva a crer que a sua opinião valerá menos do que nada para o Aronofsky; assim mantenho a expectativa que ele continue a fazer bons filmes de acordo com a o critério cinematográfico que tem demonstrado.
Apesar de tudo, acho salutar haver opiniões tão díspares sobre o mesmo assunto.
Caro Alexander Sweden
Olhe que o meu comentário (não gosto da palavra "crítica", pressupõe que quem a faz está já munido de pedras nos bolsos, prontas a serem atiradas, o que não é o caso) não é assim tão longo, lê-se bem num ou dois minutos, ao contrário de algumas novelas e mesmo romances que se publicam por essa blogosfera fora.
Por conseguinte não me considero - longe disso - nenhum "crítico" de cinema, muito menos com veleidades de ser lido ou influenciar quem quer que seja. Sou apenas um grande amante de cinema - paixão que dura há mais de 50 anos - e sempre exprimi livremente as minhas ideias, sem que os gostos por elas representados tenham a obrigatoriedade de seguir padrões generalistas ou de se integrarem em lobbies de opinião - infelizmente o que mais se vê por aí.
Também nada me leva a crer, e também felizmente para mim, que a minha opinião valha alguma coisa para quem quer que seja - e seguramente para o Aronofsky nem sequer essa suposição faz algum sentido, é totalmente descabida e nem entendo muito bem qual a razão pela qual o Alexander a equaciona sequer.
Uma coisa pode ter a certeza - estou-me perfeitamente nas tintas se o meu blogue tem muita, pouca ou zero de leitores. Criei-o exclusivamente para uso pessoal, para poder ir dando alguma ordem às muitas coisas relacionadas com o cinema que tenho acumulando ao longo da vida e que esta ferramenta me parece bastante adequada para esse fim.
Cumprimentos e fique bem
O Rato Cinéfilo
Mas atenção, acho que o seu Blog é uma lufada de ar fresco na blogosfera nacional e que provavelmente já viu filmes que eu nem sequer sabia que existiam! Agora se concordo com muita coisa que por lá escreve? Não; Se gostaria de concordar? Também não!
Se tive dificuldade de ler a sua opinião sobre o "Requiem for a Dream", não porque estivesse mal escrita, mas porque foi um murro no estômago? Tive; Se a considerei um ultraje? Claro que sim; Se voltarei ao seu blog? Obviamente!
Ó Alexander Sweden vai levar no cu
De quem, de ti? Mas tu não és aquele que é além de ser cobardolas é conhecido na blogosfera como o frouxo?
Carambas, ainda falam nas ''conversas de gajas''...que é isto?
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