Reli passagens deste livro de culto e reforcei a opinião de que o bom jornalismo consegue, por vezes, almejar ao estatuto de boa literatura.
Sobre este livro, "O Segredo de Joe Gould" (Dom Quixote, 2001), de Joseph Mitchell, disse António Lobo Antunes: "em poucas ocasiões me ri tanto e admirei tanto: li-o três vezes seguidas num pasmo crescente, num júbilo sempre renovado, e a cada leitura descobri um livro diverso, surpreendente, magistral. R.L.Stevenson garantia que se uma obra não tinha encanto não tinha nada. Esta tem-no para dar e vender."
E atente-se no que refere a escritora Doris Lessing, vencedora do Prémio Nobel da Literatura: "É um livro único. Não conheço nada que se lhe compare." Sobre os elogios a esta obra ainda poderíamos citar Salman Rushdie, Ian McEwan ou Martin Amis.
Mas quem é, afinal, Joseph Mitchell (na imagem) para receber tamanhos e incondicionais louvores críticos? Foi um dos mais importantes jornalistas americanos de sempre. Escreveu para a icónica revista "The New Yorker" nos anos 50. Mitchell percorria as ruas de Nova Iorque à procura de histórias bizarras, sendo um meticuloso observador da realidade (antecipando um outro notável jornalista literário - Truman Capote).
A sua escrita é refinada, atenta ao pormenor e repleta de ironia e humor (a que se refere Lobo Antunes). É uma obra de um só fôlego, imbuída de momentos de supremo gozo literário.
O livro "O Segredo de Joe Gould" contém dois perfis que o jornalista escreveu sobre Joe Gould, um vagabundo que largou tudo (inclusive a família e estudos académicos em Harvard) para escrever "Uma história Oral do Nosso Tempo”. Um suposto e monumental livro, onze vezes maior que a bíblia, onde estaria reunido todo tipo de histórias e conversas que Gould ouvira na vida (recolhendo milhares de diálogos, discussões de rua, bares decadentes de Manhattan, etc). Joe Gould acreditava que, no futuro, essa sua obra seria de grande importância para o estudo histórico de sua época. Tinha como amigos vários escritores, editores, jornalistas e poetas como Ezra Pound ou E.E. Cummings.
Gould morreu em 1957 e o livro que foi escrito nunca foi encontrado - não se sabia mesmo se chegara de facto a existir. Mas a lenda dizia que existia, aumentando a reputação e o fascínio à volta do vagabundo Gould. Em 1964, sete anos após a morte de Gould e mais de vinte anos após o perfil da "The New Yorker", Joseph Mitchell escreveu para a mesma revista outro texto sobre o boémio nova-iorquino - "O Segredo de Joe Gould" -, revelando o mistério guardado por tanto tempo (texto que viria a dar neste livro). Depois dessa reportagem histórica, o jornalista nunca mais publicou sequer um texto. Morreu de cancro em 1996.
"O Segredo de Joe Gould" foi adaptado em 2000para o cinema por Stanley Tucci, num filme com Ian Holm, Steve Martin e Susan Sarandon. Como nunca tive oportunidade de o ver, não sei se o filme está à altura da grandeza e originalidade da obra literária.
Nota: apesar da primeira edição contar já 10 anos, ainda é possível encontrar novas edições do livro nas livrarias. Por um preço que ronda os 11€.
1 comentário:
Este livro é simplesmente fabuloso!
Na feira do livro, sempre se pode comprar a metade do preço (6,50€): Hora H ;-)
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