sexta-feira, 10 de outubro de 2008

20 horas de Beethoven e resolve-se isso


Isto só mesmo na terra do Tio Sam podia acontecer: uma juíza condenou um fã de hip-hop a ouvir 20 horas de Beethoven por este ouvir música demasiado alta no seu carro. O pobre rapaz só conseguiu ouvir 15 minutos do compositor clássico, preferindo pagar a multa. A notícia está no site do Blitz. A juíza justificou a condenação porque "penso que muita gente não gosta de ser forçada a ouvir música, mas acreditava que esta experiência o fizesse abrir horizontes". Esta é uma afirmação interessante que dá que pensar. Ou seja: como é que a juíza podia pensar que, obrigando um adolescente fã de hip-hop a ouvir compulsivamente Beethoven, este poderia vir a gostar do compositor? A senhora juíza, provavelmente, é admiradora de música clássica e abomina hip-hop. Se fosse submetida à mesma experiência - ouvir 20 horas de hip-hop - "abriria os horizontes" ao ponto de se tornar fã de De La Soul ou Busta Rhymes?
É mais do que sabido que o desenvolvimento do gosto cultural de um indivíduo em geral, e do gosto musical em particular, não pode ser incutido a ferros e num curto período de tempo (mais a mais, como forma de castigo). É um processo que exige maturação, aprendizagem e aceitação voluntária dos estímulos musicais. Teria sido bem mais pedagógico e educativo se a juíza tivesse enviado o prevaricador para uma escola de música clássica - aí iria ter contacto com professores e alunos, métodos de ensino, audições instrumentais, aulas da história da música, que poderiam abrir os tais horizontes.
Ou então, como medida radical, a juíza poderia ter optado pelo método utilizado no filme "A Laranja Mecânica" (1971) de Stanley Kubrick, no qual o delinquente Alex é submetido a sessões compulsivas de visionamento de imagens violentas, num processo de ultra-saturação psicológica que o levou a repudiar os seus próprios actos violentos. Deste modo, em vez de Beethoven, o jovem teria de ouvir 20 horas de... hip-hop.

3 comentários:

Rolando Almeida disse...

Ok Vitor, mas há um outro argumento que me parece muito mais interessante: o rapaz foi condenado porque ouvia a música alta, certo? Nesse caso, como se trata de um fã de hip hop o mais provavel é que não fosse fã de música clássica, pelo que a condenação faz algum sentido: agora vais ouvir 20 horas de Beethoven a ver se percebes que nem toda a gente tem de gramar a tua música. A verdade é que eu gramo com a música pimba dos vizinhos e não me desagrada a ideia de um dia os poder condenar a ter de ouvir 20 horas seguidas de Diamanda Galás. É que desse modo estava eu a curtir e eles a lixarem-se! Assim, como não temos juízes nem tribunais criativos, tenho eu de ser injustamente condenado a ouvir 20 horas de Tony Carreira aos sábados e domingos, mais aos dias de festa, mais na Tv e o catano. Ah, na minha terra natal, pela altura da Páscoa, toda a gente tem de ouvir 20 horas de missa live pelos altifalantes da igreja. E que tal um juíz condenar o padreco a ter de gramar 20 horas de Atari Teenage Riot???? Diz lá Victor que a coisa assim até não faz sentido? Ah pois é!

Unknown disse...

Atari Teenage Riot nos ouvidos de um padreco faz MUITO sentido mesmo! :)

VA

Rolando Almeida disse...

Nem mais! Obrigado pela passagem pelo Sonido.Aquele livro que falas lá mais acima também me interessou. Vou mandar vir pelo Corte Ingles.
Abraço