O suplemento do Público da última semana, o Ípsilon, trazia uma longa reportagem sobre a edição nacional da monumental obra literária "O Homem Sem Qualidades" de Robert Musil. Sobre esta edição já escrevi aqui qualquer coisa. Para além da habitual análise à obra literária em si e respectivo escritor, o jornal dedica ainda três páginas ao tradutor, o crítico literário e professor João Barrento. Esta abordagem jornalística ao trabalho do tradutor não é muito habitual, dado que o tradutor fica quase sempre na penumbra quando se trata de analisar um livro estrangeiro. E João Barrento merece, e muito, que os holofotes se dirijam a ele. Barrento tem uma longa experiência de tradução - sobretudo autores consagrados de língua alemã - e aventurar-se na tradução exigente de uma das grandes obras romanescas do século passado, "O Homem Sem Qualidades" (três volumes, perto de 2000 páginas), é meritório e digno de registo. Barrento tem uma cultura literária muitíssimo apurada e abrangente, e nesta entrevista explica os aspectos principais da tradução de Musil. Demorou 3 anos a concluir a tradução e organização dos dois primeiros tomos do livro. Admirável.
Sempre admirei o trabalho de tradutor. Trabalha quase sempre na sombra do nome do escritor, mas é um elemento essencial para o sucesso e reconhecimento crítico de uma determinada obra. Mas não é, certamente, um trabalho fácil. Existe aquela célebre máxima de raiz latina - que muito atormenta os intelectuais - que diz "tradutore, traidore". Ou seja, a tradução é uma traição (à língua original da obra). Pode ser e pode não ser. Se já é difícil traduzir ficção tão complexa como a de James Joyce, Kafka ou Musil, como será com a poesia? Portugal tem grandes tradutores de várias línguas: Vasco Graça Moura, Miguel Serras Pereira e Frederico Lourenço (que traduziu "Homero") são apenas alguns nomes cujos trabalhos já mereceram prémios. A tradução é um trabalho que exige um extraordinário conhecimento cultural das línguas com que se trabalha. É um trabalho tecnicamente árduo, de grande rigor intelectual e desgastante fisicamente. Conheci uma vez um tradutor português que traduzia autores alemães para português, e dizia que era um trabalho gratificante, mas apenas até certo ponto. Exige muita disciplina e empenho intelectual e nem sempre é reconhecido pelos leitores e pelas editoras, que geralmente pagam mal. E são poucos os tradutores portugueses que conseguem viver apenas deste trabalho.
Traduções à parte, tenho um amigo formado em filosofia que foi aprender alemão para ler no original as obras de Heidegger. Tinha outro amigo que dizia que só lendo Proust em francês é que se conseguia captar as nuances da língua e o conteúdo literário da obra. Por outro lado, houve muitos estudiosos estrangeiros que aprenderam português para ler Fernando Pessoa ou Camões (o escritor italiano Antonio Tabucchi foi um deles). Persiste a sensação de que nas traduções se perde sempre qualquer coisa do original, mas aí a criatividade do tradutor e o seu domínio das línguas é fundamental para fazer esquecer, no espírito do leitor, essa possibilidade.
Sempre admirei o trabalho de tradutor. Trabalha quase sempre na sombra do nome do escritor, mas é um elemento essencial para o sucesso e reconhecimento crítico de uma determinada obra. Mas não é, certamente, um trabalho fácil. Existe aquela célebre máxima de raiz latina - que muito atormenta os intelectuais - que diz "tradutore, traidore". Ou seja, a tradução é uma traição (à língua original da obra). Pode ser e pode não ser. Se já é difícil traduzir ficção tão complexa como a de James Joyce, Kafka ou Musil, como será com a poesia? Portugal tem grandes tradutores de várias línguas: Vasco Graça Moura, Miguel Serras Pereira e Frederico Lourenço (que traduziu "Homero") são apenas alguns nomes cujos trabalhos já mereceram prémios. A tradução é um trabalho que exige um extraordinário conhecimento cultural das línguas com que se trabalha. É um trabalho tecnicamente árduo, de grande rigor intelectual e desgastante fisicamente. Conheci uma vez um tradutor português que traduzia autores alemães para português, e dizia que era um trabalho gratificante, mas apenas até certo ponto. Exige muita disciplina e empenho intelectual e nem sempre é reconhecido pelos leitores e pelas editoras, que geralmente pagam mal. E são poucos os tradutores portugueses que conseguem viver apenas deste trabalho.
Traduções à parte, tenho um amigo formado em filosofia que foi aprender alemão para ler no original as obras de Heidegger. Tinha outro amigo que dizia que só lendo Proust em francês é que se conseguia captar as nuances da língua e o conteúdo literário da obra. Por outro lado, houve muitos estudiosos estrangeiros que aprenderam português para ler Fernando Pessoa ou Camões (o escritor italiano Antonio Tabucchi foi um deles). Persiste a sensação de que nas traduções se perde sempre qualquer coisa do original, mas aí a criatividade do tradutor e o seu domínio das línguas é fundamental para fazer esquecer, no espírito do leitor, essa possibilidade.
5 comentários:
E na lista das traduções com mérito absoluto, não nos podemos esquecer da que Pedro Tamen fez, magnificamente, para o colossal (em todos os sentidos) «Em busca do tempo perdido» de Marcel Proust.
Sim, sem dúvida. E Tamem já traduziu Lautréamont, Sade, Breton, Bataille...
e Flaubert...
Depois de, há uns anos, ter lido as traduções que J. Barrento fez da obra de Heiner Müller, fiquei sem qualque dúvida de que ele seria o único "Homem Com Qualidades" para traduzir "O Homem Sem Qualidades", como já tinha escrito num comentário anterior.
O quase anonimato e a pouca importância com que se reconhece o trabalho do tradutor é o lado menos feliz desta profissão. Quem se lembra do nome do tradutor de Proust que, nos anos 50 ou 60, traduziu o "À la recherche..." para a "Livros do Brasil"? Não é um trabalho brilhante, mas merece um enorme respeito.
jP
Desculpem não ter mencionado o nome do tal tradutor - Mário Quintana
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