quinta-feira, 13 de maio de 2010

O dinheiro para o cinema de Oliveira


O filme "O Estranho Caso de Angélica" de Manoel de Oliveira foi apresentado hoje no festival de Cannes e, pelas primeiras reacções críticas, foi muito bem recebido. Ainda bem.
A Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, esteve presente na estreia e referiu que gostou muito do filme, mas gostou ainda mais da música - Chopin interpretado pela pianista Maria João Pires. Não admira esta predilecção, considerando que Canavilhas tem formação musical académica. Mencionou, igualmente, que o Ministério que tutela apoiou o filme de Oliveira com 700 mil euros, num orçamento total que rondou os 2 milhões de euros (co-financiamento oriundo de França e Espanha).
Nesta coisa dos orçamentos para o cinema português não percebo como Pedro Costa - entre outros cineastas portugueses - conseguem fazer grandes filmes com (apenas) algumas dezenas de milhares de euros, quase sem apoios institucionais, comparativamente com Manoel de Oliveira que precisa, em média, um milhão de euros (o último custou dois) para cada novo projecto.
Tanto dinheiro que, à primeira vista, não se vislumbra onde e como é gasto. Dois milhões de euros para a produção? Para a contratação do elenco artístico e técnico? Para a publicidade? Claro que dois milhões de euros, à escala da produção cinematográfica europeia ou americana, é muito pouco. Mas considerando a pequenez do mercado de Portugal e os meios de produção existentes, acho que dois milhões de euros para um filme - mesmo tratando-se de Manoel de Oliveira - é muito dinheiro.

4 comentários:

Gonçalo Trindade disse...

Completamente de acordo. A verdade é que Pedro Costa filmou No Quarto da Vanda, por exemplo, praticamente sozinho. E Juventude em Marcha foi o mesmo (e o resultado foi o que se viu!!). Tendo em conta a escassez de que falas, este assunto devia ser realmente muito mais discutidos. A verdade é que há muitos jovens autores por aì que, certamente, querem começar carreira e não o conseguem por falta de apoio. Não deveria este dinheiro antes ser empregue em ajudá-los? Ou até a ajudar mais autores já estabelecidos, como Pedro Costa, entre outros? A verdade é que, à primeira vista, não consigo perceber onde é usado todo este dinheiro dado a Oliveira na criação dos seus filmes...

Rui Resende disse...

É assim, segundo a Gabriela Canavilhas, o ministério apoia apenas 700 000 euros desses 2 milhões. O resto é dinheiro privado como tal cada um investe como quer o dinheiro que tem.

Seja como for, mesmo que fossem os 2 milhões totalmente patrocinados pelo governo, eu concordava. O que é ridículo é os milhões que não são atribuídos a outros filmes, não é os que patrocinam filmes do Oliveira. 700000 euros realmente não é nada para fazer um filme. E, não tendo visto o filme do Oliveira, realmente não é preciso grandes desvarios para gastar isso e mais num filme. Uma produção competente, e profissional custa dinheiro, mesmo que os ordenados das pessoas envolvidas não sejam muito altos (e certamente não o serão neste caso).

Já o Pedro Costa assumiu desde há anos (depois de Ossos) uma postura intencionalmente pobre na produção do seu cinema. Ele assume que gosta de filmar com uma câmara dv sem luz artificial quase, eventualmente um reflector e pouco mais. É uma questão de abordagem.

O oliveira é provavelmente mais ignorado do que apreciado em portugal, já se sabe, mas tem uma obra sólida, e os filmes dele, ainda que inconstantes em qualidade são uma mais valia para quem gosta de filmes.

por isso, qual é a dúvida? eu discuto os investimentos que Não se fazem nesta área, e vários em filmes ordinários q se vão fazendo por aí (feitos pelo amigo do amigo do amigo...). este não me incomoda.

PortoMaravilha@sapo.pt disse...

Olá Victor ,

Não concordo contigo : Despir Manoel para vestir Pedro não é solução.

Não vi ainda o último filme de Oliveira. Mas a critica é transcendente.

É verdade que o projecto louco de Oliveira ( fazer teatro com uma camera ) o tenha conduzido a experimentação novas e a contra correnta.

Quando vemos "Le soulier de satin ", Oliveira , num filme qye dura sete horas, tenta concretisar a historia do cinema.

Para mim , Oliveira está para o cinema como Proust está para a literatura. Uma busca da essência e do tempo perdido ( que nunca será alcançado com a foto, as réplicas, a camera, o saber ...)

Muito se esquece Aniki bobo o precursor do neo realismo , mas que contem já em si a genese do questionamento entre tempo e duração do tempo.

Talvez esteja completamente fora do assunto , mas a problemática de Oliveira é essa noção de querer parar o tempo . Fazer do tempo uma imagem fixa que interroga o leitor espectador sobre a noção de duração. A imagem , o cinema é reflexão ( pensar e ver em silêncio ) e não é clip.

É muito complicado,

Nuno

Unknown disse...

Nuno: eu não insinuei que o dinheiro a mais que supostamente o Oliveira recebe devesse ir para o Pedro Costa. Não está em causa a qualidade de um e de outro. Também não digo que o Oliveira não mereça o dinheiro que recebe; acho é que a distribuição dos apoios financeiros para o cinema em Portugal é muito, muito desequilibrado e até injusto (sei disto porque tenho amigos realizadores que conhecem o meio e me informam).