quarta-feira, 10 de setembro de 2008

O que é ser rebelde na televisão



As televisões vivem de chavões, de conceitos de moda. Quanto mais previsíveis e fúteis, melhor. Depois da exploração do conceito de "radical" para tudo e para nada, o espectador constata que o que está na moda é o conceito "rebelde". A rebeldia tornou-se o novo paradigma da ficção portuguesa: a nova série juvenil da SIC chama-se "Rebelde Way" e os "Morangos com Açúcar" da concorrente TVI adaptou o subtítulo "Geração Rebelde". Só que a rebeldia juvenil veiculada nestas séries é uma rebeldia que se confunde com pura má educação (entre amigos, pais e filhos), desvios sociais no limite da delinquência e actos pueris de insubordinação comportamental (basta ver 5 minutos de cada uma das séries para confirmar estes dados). Nestes tempos formatados por uma mentalidade que quase anula o espírito crítico (e o "think for yourself"), a rebeldia que interessa ver nestas séries era outra. Uma rebeldia de princípios morais, sociais e culturais. Uma rebeldia ousada, com base numa sólida formação de valores e de atitude crítica. Uma rebeldia de cariz intelectual e defensora de ideais diferentes, inconformista, mas assente em padrões de saudável convivência social. Mas estas acepções de rebeldia são meras miragens. Os argumentistas julgam que usam a rebeldia como conceito para seduzir uma juventude genericamente amorfa. E tentam espicaçá-la com a ideia de rebelde, do tipo "só com rebeldia é que a juventude se pode afirmar na sociedade". Estes actores, que supostamente desempenham papéis de rebeldes, nada têm a ver com a rebeldia de James Dean em "Rebel Without a Cause" ("Fúria de Viver", 1955) de Nicholas Ray. Aliás, saberão estas jovens actores quem foi James Dean ou Marlon Brando?
A rebeldia dos jovens dos "Morangos com Açúcar" e "Rebelde Way" confina-se aos insultos gratuitos aos pais, às bebedeiras colossais em festas inócuas, à verborreia de frivolidades, ao sexo casual e desprotegido, à busca do sucesso imediato e efémero, e por aí fora. Confunde-se o culto da libertinagem vadia com o da irreverência sadia. Por isso faz sentido o vaticínio de uma psicóloga educacional que analisou o conteúdo destas novas séries juvenis: "duvido da sanidade mental de jovens entre os 15 e os 24 anos que vejam isto com entusiasmo". Eu também duvido.

6 comentários:

Ana disse...

Concordo plenamente contigo. Eu nunca vi nenhum episódio desses morangos mas cheguei a ver o primeiro quase até ao fim de rebelde. Digo quase, porque foi tão chato que não consegui ver até ao fim. É um formato já ultrapassado. Entre estes rebeldes sem causa e o verdadeiro rebelde, vai uma grande diferença!
Beijos

Luís A. disse...

Rebeldes com ipod. Foda-se. Enjoam desde o 1º minuto do 1º episodio. O facto de serem um sucesso (?) diz volumes da merda do nosso país.

Beep Beep disse...

Mesmo insultar os pais ou apanhar bebedeiras é coisa que quase ninguém faz aí, ao passo que pedir factura nos cafés e restaurantes toda a gente faz. Tudo cheira a uma noção de "rebeldia dos joves" planeada por indivíduos engravatados numa sala de reuniões. Só que por isso os diálogos e situações são tão inverosímeis (Uma boy-band a recolher consenso entre rapazes e raparigas de 18 anos?) que acabam por servir para boas gargalhadas.

E o nosso "país de merda" não está sozinho no sucesso destas séries.

Sérgio Currais disse...

Sois uns cotas empedernidos. Daqui a bocado estais a dizer que também não gostais da Floribela e da Lucy…

Maria disse...

Bem, é impressionante o quão rebelde esta gente se arroga, quando é precisamente o que diz - libertinagem devassa 'sem causas', princípios, motores de vida para além do show business. Antes fossem ver Dean e Brando, indeed.

João Nunes disse...

Eu também duvido da sanidade mental de quem, na faixa etária que referes, veja isto com entusiasmo. O problema está no facto destas séries terem grande popularidade na faixa etária imediata, a dos 12/15 anos.