Morreu hoje Harvey Pekar, vítima de cancro da próstata. Tinha 70 anos. Era conhecido pela sua imagem de anti-social, rabugento e instável emocionalmente (teve várias depressões). E teve direito a um filme sobre a sua obra, o magnífico "American Splendor", que chegou a estar na linha da frente dos Óscares em 2004.
Ainda há tempos perguntava a um amigo, especialista em Banda Desenhada, se Harvey Pekar continuava a fazer BD ou, sequer, se ainda era vivo (visto que sofria de cancro). Pelos vistos, manteve-se bem activo... até hoje. Pekar era conhecido, há pelo menos três décadas, como um autor de BD alternativa e de culto (ou artista gráfico), e o jornal espanhol El País até o chamava, de forma ousada, como o "Marcel Proust da banda desenhada norte-americana".
A particularidade de Harvey Pekar é que ele não desenhava, apenas escrevia as desconcertantes histórias (quase sempre autobiográficas) sobre os seus problemas existenciais, as suas depressões recorrentes, as suas frustrações quotidianas, sempre ao som da sua música preferida, o jazz.
Essas histórias trágico-cómicas, tão perto das vivências da conturbada sociedade moderna, eram transpostas para banda desenhada por Robert Crumb, outra lenda viva da BD underground.
Há esse belo filme sobre este personagem tão peculiar - "American Splendour" (2003), de Shari Springer Berman e Robert Pulcini, com um soberbo Paul Giamatti como Harvey Pekar.
Uma das últimas novidades interessantes é que Harvey Pekar lançou, em Setembro de 2009, um projecto inovador na internet, chamado "The Pekar Project". Tratava-se de um sítio onde Pekar e um grupo de colaboradores (artistas gráficos e não só) revelavam o universo criativo deste autor tão original, misturando tiras de BD, biografia, textos sobre os mais diversos assuntos, livros e listas de preferências pessoais de Pekar, como a lista dos "10 músicos de jazz mais inovadores". Um sítio repleto de boas surpresas que agora, com a morte do seu irreverente autor, ganha outra magnitude.
4 comentários:
Olá Victor,
Parabéns pelo post. Para mim, seria um desenhador de comics e algo mais. Mas isso não tem interesse nenhum e a fronteira entre os géneros é muito flutuante.
Sou leitor atento do teu blog. Mas um dia só tem 24 horas. Assim, como pelo passado me autorizaste a comentar fora de horas ( nossa lembra o título dum filme ) queria lembrar duas coisas.
Dali e Disney não se entenderam porque, duma parte os estúdios Disney não tinham dinheiro suficiente para satisfazerem as exigências de Dali e, doutra parte, o que Dali propunha não se enquadrava no projecto de Disney e do publico já conquistado pelos estudios Disney.
O que não impdiu Disney e Dali de ficarem em óptimos termos. A revista fr Telerama tem um excelente publicação (numero hors série ) sobre Disney. Data de 2009.
Queria também, com a tua permissão, voltar à ideia de construção de espaços culturais.
Eu penso que não é possível comparar Paris com as outras capitais europeias. Paris ainda é o centro cultural da Europa e sem dúvida do Mundo. Sabias que Paris é a cidade que mais cinemas tem no mundo ?
Tu citas "Le Marais", mas eu poderia acrescentar muitos mais espaços na Lutécia : Rue Mouftard , Le Trocadero, Pigalle, etc... Espaços que por serem históricos facilitam a criação de novos espaços.
Sem citar o louvre, o Museu d'Orsay e tantos mais.
Eu sou a favor da criação de espaços culturais novos. Mas para isso seria também necessário reconhecer que a formação tem que ser feita na fonte. Até hoje, a maioria dos alunos dos liceus Franceses podem estudar teatro, cinema, artes plásticas... parecem que ficam caro e querem destruir estas formações. A dívida parece. Dívida que não é nossa, mas seria um outro assunto.
Não acredito pois em centros culturais que nascem como cogumelos ( se os há tanto melhor e toca a defende-los ).
E olha a Guarda tem patrimonio cultural suficiente para uma politica de criação de polos artisticos em ligação com o seu passado.
Desculpa se aborreci,
Nuno
Nuno: o teu contributo é sempre bem-vindo.
Deixa-me dizer-te que há coincidências incríveis: antes de ler o teu comentário, estive a ler algumas páginas do livro "A Cultura-Mundo" de Gilles Lipovestsky e Jean Seroy, páginas essas que abordavam, precisamente, a questão das indústrias culturais como motores de dinamismo económico e social das cidades. Lipovetsky falava (escrevia, bem entendido) que Paris perdeu a hegemonia cultural como farol europeu que tinha no final do século XIX e primeiras décadas do século XX - ao nível da criatividade na dança, literatura, pintura, música e cinema. E o autor lembrava também que não são apenas os espaços institucionais (como salas de cinema, óperas ou teatros) que, HOJE, promovem o desenvolvimento das cidades modernas. A cultura da massificação e da economia cultural, da tecnologia da comunicação e das indústrias culturais actuais, devem promover novos espaços de lazer e fruição, novas relações com os cidadãos, novas dinâmicas criativas.
E já agora, deixa-me dizer-te que Lipovetsky faz um diagnóstico arrasador da sociedade francesa actual a todos os níveis: cultura, educação, arte... Que no fundo estende a toda a Europa. Em mutias coisas estou em total concordância com ele.
É muito interessante esse livro (que daria temas para muitos debates) que deves encontrar facilmente em França.
Abraço.
Victor : Estou em total desacordo com os autores que citas.
A França conhecerá um declínio logo após a segunda guerra. Os ianquis obrigarão a que as salas de cinema Francesas passem uma quota importante de filmes ianqui. E sabemos que o cinema ajuda a fota e por aí fora. Era a dávida a pagar, para reembolsar a dívida de guerra.
Mostrar, apresentar e difundir o modo de vida us !
Resistiu a Bd. E os comics não entraram em França, devido às publicações de Bd ( franco belgas )católicas e comunistas.
O que não suportam os dois autores que citas, é a excepção cultural Francesa que decidiu financiar e apoiar a cultura Francesa e Europeia.
Foi assim que Pedro Costa esteve presente na Cinematheque Française, durante 15 dias ao alcance de todos ( lembrei isso no cosmeticas )
Se esta instituição não existisse quem conheceria Pedro Costa ? Seria possível levar estudantes a verem filmes de Pedro Costa de graça ou quase, se não existisse esta instituição ?
São os espaços institucionais que permitem a abertura ( quando se vive em democracia claro ).
Salvo erro meu, o que criticam,em pano de fundo, os dois autores que citas são as ajudas que recebem as instituições culturais do estado.
Mas poderia, outro exemplo, M de Oliveira ter realizado "Le Soulier de Satin" sem esse espaço institucional ? E igual quanto ao filme de M. de Medeiros ?
A França é um país que hoje vive ao ritmo da regionalização. As regiões promovem, no âmbito cultural, realizações fantásticas.
Sem dúvida que já ouviste falar do festival de teatro de Avignon, dos encontros internacionais de fotografia de Arles, o festival de cinema de Deauville, o festival de cinema de Arcachon, ... Pega na lista de festivais de verão e verás a produção fantástica, a inovação ,a liberdade, que existe em França a todos os níveis.
Sim : São subvencionados. E depois ?
Salvo excepções : Já viste um mecena perder dinheiro ?
Os dois autores que citas não suportam a ideia que a cultura esteja ao alcance de todos.
E Gilles Lipovetsky poderá citar todos os mundialismos do mundo.
Ou queremos cidadãos livres ? Aí a cultura não tem preço.
Ou queremos cidadãos consumidores ? Aí a cultura é mercadoria.
Sob pretexto de abertura, os teus dois autores não suportam que a cultura não se auto-financeie. Em suma, que não obedeça às notas de uma agência económica de notação
Abraço,
Nuno
Olá Victor !
Felizmente que o comentário passou. É que quando mandei o comentário, houve aqui um bug.
Fui um pouco radical no que acima apresentei. Mas bom...
Vou te dar um exemplo que conheci com o meu filho. Acompanhei-o a Versalhes a uma loja especializada em lápis disto e daquilo. A dita loja tem uma galaria de pintura. Perguntei-lhes se conseguiam vender. A resposta foi simples : Sabe como estamos ao lado do "Chateau (Versailles)" temos sempre quem compre.
Aí aparece a dialética entre o passado e o presente.
E deste ponto de visto, creio-o sinceramente, Portugal tem um património fantástico e também poderia optar por essa dialectica.
E sobretudo, mas não só,a tua cidade. Mas penso que já to disse.
Actualmente, a cidade de La Rochelle apresenta um festival dedicado a uma grande retrospectiva sobre as artes urbanas ( Ernest Pignon ). A entrada é gratuita ( ou simbólica ) para os estudantes e menores.
Victor : Tu que gostas de cinema. Já pensaste que em Paris podes ver filmes a preto e branco a cores em 3D de todos os países ?
E que a cidade da moda é ainda Paris :-) !
Desculpa a chatice,
Abraço,
Nuno
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