quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Contra certos conceitos de cultura

- A cultura do comodismo e do conformismo, porque destrói o espírito crítico e anestesia o exercício da cidadania.

- A cultura da fama fácil, imediatista e mediática incrementada junto dos adolescentes que julgam ter talentos geniais a rodos: imposição do paradigma insidioso “Morangos com Açúcar” e “ídolos” em toda uma geração.

- A cultura da alienação televisiva, da telenovela/reality show pós-noticiário da TV, porque embrutece o gosto estético e louva a letargia mental.

- A cultura da maledicência: “dizer-mal-por-dizer-mal-porque-apetece-dizer-mal”.

- A cultura da “formatação radiofónica” e da ditadura da "playlist" generalizada que subverte o conceito de serviço público e oblitera a diversidade musical e cultural.

- A cultura do desprezo pelo êxito artístico de outrem, porque revela esse sentimento tipicamente português: a inveja.

- A cultura da intolerância e/ou menosprezo face a modelos sociais, culturais e artísticos diferentes, minoritários e alternativos.

- A cultura da informação televisiva como espectáculo superficial e de jogos de manipulação (numa espécie de “circo mediático”), porque trata o espectador como imbecil e mentalmente domesticável.

- A cultura desproporcional e eufórica que os media dedicam ao futebol, porque distrai a atenção e a análise séria das coisas realmente importantes da sociedade e da vida.

- A cultura do aproveitamento propagandístico e publicitário em redor da Selecção Nacional de Futebol (bancos, batatas-fritas, detergentes, cervejas, seguros, autarquias, gelados, electrodomésticos, iogurtes…) esse desígnio irrepreensível do qual parece depender o presente e futuro do país.

- A cultura exponencial do entretenimento digital (Internet, videojogos, telemóvel, I-Pod, gadget electrónicos, Playstation…).

- A cultura das pseudo-elites culturais e intelectuais "tugas" e suas inúteis diatribes intestinas na praça pública.

- A cultura dos livros “pop-light” escritos por apresentadores de televisão, cantores, actores e aspirantes a tal, e inerente massificação aterradora dos sub-produtos de aproveitamento comercial.

- A cultura patética dos records nacionais para o Guiness: somos os melhores do mundo nas coisas mais fúteis - a maior feijoada, a maior bandeira, a maior tarte, a bicicleta mais comprida, o maior Bolo Rei…

- A cultura dos neo-liberais e da burguesia instalada, do imberbe jet-set, da ostentação, das festas do “social”, do plasma de última geração na sala de jantar, das férias na Patagónia, e das opiniões saloias-sobranceiras de tudo e de todos sobre tudo e sobre nada.

- A cultura da imagem: para vingar pessoal e profissionalmente, exige-se beleza top-model, roupa fashion de costureiros, visual sofisticado, postura “yuppie” ou “blasé”, em conformidade com os modelos copiados da televisão e do cinema.

- A cultura do “facilitismo” e do “trabalhar para a estatística”: no sistema de ensino, na política, no consumo cultural, na função pública, na vida social.

- A cultura do primado economicista em detrimento dos valores mobilizadores da sociedade: a educação, o investimento, a qualificação/profissionalização, a formação, a arte, a cultura.

- A cultura hype da pseudo "contra-cultura e rebeldia" que certos programas e séries pretendem conotar os jovens.

- A cultura generalizada da iliteracia galopante das novas gerações e consequente ausência de competências e qualificações mínimas para a exigência da vida profissional, social e cultural contemporâneas.

- A cultura alarve dos pacotes de pipocas tamanho XXL e potes de Coca-Cola XXXL e do mau comportamento nas salas de cinema.

- A cultura do fato de treino como indumentária oficial dw muitas famílias passeantes no shopping durante os fins-de-semana.

- A cultura de um certo jornalismo parcial, pouco incómodo e interveniente, acomodado, dependente de critérios económicos e populistas para sobreviver.

- A cultura da mentira, da hipocrisia política, do pedantismo, da futilidade, da injustiça social, da subserviência ao patrão, da aparência enganadora, do sensacionalismo bacoco.

19 comentários:

pedroguerra disse...

A propósito do último filme de Eastwood, o que João Lopes salienta é... que pode ser candidato ao Oscar!
Parece-me que este blog é o melhor exemplo da influência inviesada que JL exerce sobre uma certa blogosfera. Uma pena.

pedroguerra disse...

A propósito do último filme de Eastwood, o que João Lopes salienta é... que pode ser candidato ao Oscar!
Parece-me que este blog é o melhor exemplo da influência inviesada que JL exerce sobre uma certa blogosfera. Uma pena.

Joel Ferreira disse...

Bem, dá-me a sensação que podes então declarar guerra a toda a cultura portuguesa.

trepadeira disse...

A cultura do copo,palavrão e pinote;
A cultura da tradição mais retrógrada,cruel,bárbara e imbecilizante,e
a cultura mais implantada,a venda por meia merenda.
Cordialmente,
mário

blueangel disse...

Joel Ferreira este seu comentário é algo intrigante? O que é para si a Cultura Portuguesa?
E o que é que o seu comentário tem a ver com o que está escrito no post acima?

Flávio Gonçalves disse...

Grande post.

Rui Gonçalves disse...

Excelente manifesto! Assino por baixo, integralmente.

Vasco disse...

Assino por baixo...excepto aqui:
"- A cultura do fato de treino como indumentária oficial dw muitas famílias passeantes no shopping durante os fins-de-semana."
Qual é o mal? Parece-me um género de comentário "à" "jetset tuga".
Não é a roupa que vai dizer o que sou ou o que penso.

Vasco

Silly Little Wabbit disse...

O maior problema vem da mentalidade geral que se preocupa com futilidades e pratica a cultura do futebol. Enquanto o povo continuar a entreter-se com distracções estaremos longe de uma mudança.

João Ruivo disse...

Onde é que se assina?

Ricardo disse...

Subscrito na íntegra.

Pedro Emanuel Cabeleira disse...

Tenho que admitir que gostei bastante do post. Surge como um género de um novo "Manifesto Anti-Dantas", um grito de revolta! Por vezes sinto-me tão cheio de todas estas "culturas", tão enjoado pelo sistema que o nosso país tem vindo a vomitar. Gostei da maneira como destacou muitos pedaços da forma de viver do nosso país, penso que cada um é uma raiz bem funda de como o nosso país se encontra cadavérico na arte (principalmente na arte!), temos artistas, é possivel saber quem eles são, muitos deles são reconhecidos no exterior, mas o povo, esse, não os quer conhecer, povo esse como diz gosta de desligar o pensamento e cair em sensacionalismos fáceis. Analisar os problemas, embora não tenha qualquer legitimidade para nomear estes contra correctos conceitos de cultura como problemas, é simplesmente o inicio. Agora, irei propôr-lhe um desafio, desafio que é livre de rejeitar, para si, o que poderá inverter esta situação ou qual a cultura correcta que há em alguns portugueses, caso esta exista?

Elsa disse...

Não me diga que trabalha mesmo aqui ao pé de mim :).
Tirando o fato de treino, estou rodeada de comportamentos que resultam dessas culturas.
É muito cansativo acredite.
Eu também assino.

João Palhares disse...

Concordo e adorei ler este post..

Petit Joe disse...

Cultura é um conceito muito abrangente. Até demais...

Daniel Stilb disse...

excelente reflexão em forma de manifesto, parabéns Victor.

Anónimo disse...

Bem, já sabemos que os mass media são controlados, e que estes, controlam os jovens que por sua vez controlam os pais...
E desde formatações cerebrais em frente à TV em que não há programa porque os programados somos nós, à cultura "estar in", ser da elite pela forma de vestir ou pelo carro que se possui, ao plasma que ou mede 150 cm de diâmetro ou 2 cm de espessura, às tradições saloias que nos tornam mais animais do que os que estão na arena, ao back door man ou portas do cavalo que se abrem na nossa vida, invejas, incertezas, certezas do nada e brilhantismo fácil, haverão sempre outras culturas e subculturas que ditarão o nosso estilo, ideologia, educação ou proveniência.

Choose your way. Choose your life!

Johnny Guitar

Manuela disse...

Gostei de ler. Serve bem para reflctirmos sobre o que é, afinal, a cultura.

Anónimo disse...

Concordo plenamente, e um dos meus receios é cair nessas culturas fáceis, algo que me ocupa os pensamentos regularmente.

Assino por baixo,

João P. Cardoso