terça-feira, 28 de setembro de 2010

O tédio mortal


Numa certa aula do 12º ano o meu professor de filosofia, após uma breve discussão sobre religião, acusou-me de ser um "perigoso existencialista ateu". Eu respondi que perigosa era a "evangelização" filosófica que os manuais pretendiam transmitir obliterando o desenvolvimento do espírito crítico dos alunos.
Insistiu, perguntando-me se não me angustiava perante a fatalidade da morte. Respondi que o que mais me atormentava não era a previsibilidade da morte, mas sim o tédio em vida (que pode levar à morte).
Para consolidar a ideia, socorri-me de um brilhante dissertação de Kierkegaard sobre a "raiz de todo o mal":
"Não admira, pois, que o mundo vá de mal a pior e que os males aumentem cada vez mais, à medida que aumenta o tédio, e o tédio é a raiz de todo o mal. A história deste pode acompanhar-se desde os primórdios do mundo. Os deuses estavam entediados, pelo que criaram o homem. Adão estava entediado por estar sozinho, e por isso foi criada Eva.
Assim o tédio entrou no mundo e aumentou na proporção do aumento da população. Adão aborrecia-se sozinho, depois Adão e Eva aborreceram-se juntos, depois Adão e Eva e Caim e Abel aborreceram-se em família; depois a população do mundo aumentou e os povos aborreceram-se em massa. Para se divertirem congeminaram a ideia de construir uma torre tão alta que chegasse ao céu. Esta ideia, por sua vez, é tão aborrecida como a torre era alta, e constitui uma prova terrível de como o tédio se tornou dominante."

3 comentários:

Unknown disse...

O tédio é mesmo a raiz de todo o mal!

Flávio Gonçalves disse...

Concordo em pleno.

Já viste o primeiro filme do Haneke, O Sétimo Continente, não já? Disso trata precisamente. E é brilhante nesse aspecto.

Manel Barbas disse...

Tédio Boys