Houve um tempo no qual os programadores de televisão tinham critério na programação de cinema no pequeno ecrã. Houve um tempo em que se viam westerns clássicos ao sábado à tarde e filmes de culto em horário nobre nos dias de semana. Houve um tempo em que o noticiário era rigoroso, formal, objectivo e de duração certa. Agora pode demorar duas horas com notícias fúteis e acessórias (às vezes com "não-notícias"). Houve um tempo no qual até os programas de entretenimento tinham dignidade e entretiam sem envergonhar ninguém.
Isso foi num tempo em que a ditadura das audiências e a feroz política comercial dos canais privados não representavam obsessões quase paranóicas. Desde há muitos anos a esta parte, o serviço público de televisão é um conceito inexistente (que me perdoe Paquete de Oliveira), um mito que já não tem justificação no paradigma audiovisual moderno.
O jornalista Ignacio Ramonet tem razão quando reflecte, num dos seus livros - que são de estudo obrigatório para estudantes de comunicação social - que a televisão se rege unicamente por critérios sensacionalistas, superficiais e vocacionados para o espectáculo efémero. Os programas de entretenimento são fátuos e de qualidade zero (no mínimo duvidosa), a informação é ditada pelo lado trágico da vida, pelo lado sensacionalista e mediático, como se vivêssemos num enorme programa perverso de “reality show”.
Por outro lado, a televisão pública tende a ser constantemente manipulada pelo poder político. Cultura, ciência, educação, debate de ideias são conteúdos que assustam os responsáveis pela programação televisiva. À parte um ou outro programa da RTP2 com conteúdos educativos ou culturais (para fazer de conta que calam os críticos), o resto do panorama televisivo é de uma confrangedora boçalidade.
Já os Disposable Heroes of Hiphoprisy cantavam: "Television, the drug of the Nation, breeding ignorance and feeding radiation".
Quem demasiada televisão (sobretudo os quatro canais abertos), acaba por se submeter a um lento e subtil entorpecimento mental. Daí que defenda sempre a velha máxima de Groucho Marx: "A televisão é muito educativa: sempre que alguém a liga, vou a correr tirar um livro da prateleira para ler".
5 comentários:
Grande verdade.
No tempo que só tinhamos dois canais, eu lembro-me de ouvir que tinhamos uma das melhores televisões da Europa.
Não acreditei, mas depois quando chegou a concorrência das privadas acabei por dar razão a esta máxima, e percebi o que era má televisão...
Man, concordo plenamente com o que escreveste.
Perfeito. É exactamente isso.
Texto fabuloso. Grande verdade, infelizmente.
Olá !
O melhor é mesmo não ver televisão. Será ? Vivemos bem melhor sem a estranha lucarna. Não deixa de ser curioso, segundo os últimos dados que li, que a rádio é o média preferido dos Franceses.
No que diz respeito a Ignácio Ramonet não o aprecio muito. Na altura teve um editorial completamente delirante no "Le Monde Diplomatique". Aquando o assassinato dum vareador no país Vasco, já lá vão alguns anos, a Espanha conheceu a sua maior manifestação de sempre na sua história. Intão, sim intão, não é que o homem nos explica que se os Vascos se mobilizaram em massa é porque o vareador assassinado se chamava Jesus Maria.
Estava completamente fora do assunto !
Nunca mais assinei o dito jornal. E não fui o único.
Nuno
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