Alfred Hitchcock divertia-se quando lhe diziam que a cena do assassinato no duche de "Psycho" (1960) tinha provocado pesadelos a muitos espectadores. E que, inclusive, um pai se queixou que a sua filha nunca mais quis tomar banho sozinha depois de ter visto o filme. A verdade é que esse filme de Hitchcock foi dos primeiros cineastas a utilizar a casa de banho como cenário importante de um filme. Aliás, conta-se, igualmente, que nesse filme com Anthony Perkins, mostra-se pela primeira vez, alguém a fazer a descarga do autoclismo (a actriz Janet Leigh, momentos antes de entrar no chuveiro).
A verdade é que só depois do filme icónico de Hitchcock é que a casa de banho revelou ser, para os realizadores, um local onde muita coisa se passa (das situações mais cómicas às mais trágicas). Em virtude deste facto, lembrei-me de enumerar as sequências mais interessantes que ocorrem no WC no mundo do cinema:
"Trainspotting" (1996) de Danny Boyle - Uma cena surreal e grotesca de um drogado que se afunda numa retrete assustadoramente imunda.
"Nascido Para Matar" (1987) de Stanley Kubrick - uma das mais tensas e alucinantes sequências de todo o cinema de Kubrick.
"BZ, Viagem Alucinante" (1990) de Adrian Lyne - Tim Robbins é um homem que balança perigosamente entre a realidade e o delírio. A sequência da alucinação na banheira é arrepiante.
"Shining" de Stanley Kubrick - Jack Nicholson à volta com os seus fantasmas numa alucinada casa de banho quase incandescente de tão vermelha.
"Psycho" de Alfred Hitchcock - a memorável cena do terror com sons estridentes de violino de Herrmann e a faca de Norman bates.
"The Party" (1968) de Blake Edwards - a louca incursão de Peter Sellers numa festa indiana onde a casa de banho se torna num obstáculo hilariante.
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Outras cenas: o suicídio na banheira em "As Regras da Atracção" (2002) de Roger Avery; o suicídio falhado de Luke Wilson em "The Royal Tenenbaums" (2001) de Wes Anderson; a morte de Vincent em "Pulp Fiction" (1994) de Tarantino; os olhares aterrados no espelho do WC de Christian Bale no filme "O Maquinista" (2004) de Brad Anderson, etc...
12 comentários:
Ainda bem que a casa de banho existe, nem que fosse só para se fazer aquela cena de 'Nascido Para Matar'! O resto é tudo secundário.
Abraço
IrmandadeDoUrso.blogspot.com
Boas observações, nunca tinha pensado bem nisso. Mas há muitos mais...acho que até devias pegar nessa ideia, aprofundares e criares tipo uma rubrica. É só uma ideia..
Abraços
E ainda a curta metragem académica "Freud pour enfants", toda ela passada numa casa de banho :)
http://www.youtube.com/watch?v=BsJPgO_lxpQ
Lembrei-me logo do filme "Le Fantôme de La Liberté" de Luis Buñuel (1974) em que há uma troca: as pessoas retiram-se ocasionalmente para uma pequena sala para comeram, e sentam-se em sanitas à volta de uma mesa.
Quanto ao Shining, para mim, a pior cena passada na casa de banho é a do quarto 237.
Há, também, um filme do Woody Allen (não me lembro qual) em que ele vai para a casa de banho dar um jeito ao seu visual , depois da campaínha ter tocado, e atrapalha-se todo, entornando água de colónia, etc. Aquelas cenas caricatas de um tímido num momento de aflição.
Por falar do filme The Party, todo ele é hilariante (principalmente a cena inicial da trompete).
Há toda uma epistemologia da sanita por fazer (muito embora Zizek já definiu o que é a ideologia através da comparação de diferentes modelos de sanita: o francófono, o alemão e o americano)
A casa de banho ainda é o único local de privacidade protegido pela lei, onde não se pode ter câmaras nem nada parecido. Ou seja, a casa de banho é o local de intimidade por excelência, uma verdadeiro casulo da subjectividade.
Joe: gostei desta tua frase - "Há toda uma epistemologia da sanita por fazer" ;)
América proibida: quando no final o miúdo é morto na casa de banho também foi um momento poderosíssimo.
A propósito de casas de banho, lembro-me vagamente de uma cena do "Morrer em Las Vegas" em que a Elisabeth Shue, depois de ser violada, se sentou numa sanita. Lembro-me que, num dos vários visionamentos desse filme, me dizia um amigo: "Não é nada habitual no cinema verem-se os personagens a fazer as suas necessidades e em pleno acto do uso do papel higiénico". Por me parecer interessante este momento cinéfilo no que à "epistemologia da sanita" diz respeito, partilho-o.
Cumprimentos cinéfilos!
Ursdens:
Há uma cena dessas no filme Eyes Wide Shut (Kubrick) com a Nicole Kidman.
Há sim senhor, embora o filme do Kubrick seja posterior ao do Figgis... Lá está a originalidade, ou a falta dela... eheh!
Ou apenas quando se pretende retratar cenas vulgares de um quotidiano na intimidade de um lar. É mais uma daquelas cenas, como arrumar a loiça no armário ou pôr a mesa...
Poderá ser...
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