quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Cultura Humanista (ou a falta dela) nos jovens


Eduardo Prado Coelho, escritor, professor, cronista, ensaísta, pensador, polemista (que tanta falta faz a Portugal), morreu em Agosto de 2007. Um mês antes de falecer, escreveu uma crónica no Público em que abordava o conceito de "cultura jovem" na actualidade. Na altura recortei essa crónica e guardei-a algures. Redescobri-a agora, no meio de papéis perdidos, e resolvi publicar o texto (quase) na íntegra. Isto porque me parece que o teor da visão crítica sobre o tema de EPC é altamente pertinente e cada vez mais actual. Talvez falte dizer que concordo, grosso modo, com ele.
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"Culturas Jovens"

Primeiro ponto fundamental: a transmissão cultural de tipo vertical, das gerações mais velhas para as mais novas, que permitia a passagem daquilo a que chamamos a "cultura humanista" está a desaparecer. O que acontece hoje é que os pais se desinteressaram desse processo e incubiram a escola de se ocupar do problema da formação cultural dos jovens, o que deixa os professores numa posição particularmente desconfortável e delicada. Até porque a identidade das novas culturas jovens se faz, acima de tudo, através da relação entre os próprios jovens e o uso intensivo das novas tecnologias.
O que resulta daí? Que as culturas dos jovens se afirmam por um esquecimento ou mesmo uma rejeição da cultura de tipo humanista (em particular da leitura, da música clássica ou erudita) e por uma impregnação da cultura comercial apresentada como "cultura popular". A cultura humanista é considerada como algo de ultrapassado, de "burguês e aqueles jovens que ainda revelam interesse por estas matérias são objecto de troça ou de marginalização.
Os pais não procuram regular o acesso à cultura dos filhos. Dão-lhes total liberdade de escolha, dinheiro para comprarem aparelhagens, os pais só entram nos quartos dos filhos depois de baterem à porta respeitosamente, e não censurarem qualquer escolha. Os telefones, as inúmeras mensagens por telemóvel, mails, chats, fazem com que as relações entre os jovens prossigam em casa e que, portanto, a chapa cultural que essas relações vão impondo se prolongue no quarto e ao longo da noite.
Eduardo Prado Coelho
In Público, 10 Julho 2007

2 comentários:

Francisco disse...

Tenho de dizer que concordo com o sr. Eduardo Prado Coelho.
A educação dos filhos é entregue a "outros", em parte porque é menos uma preocupação para (alguns) pais, mas também porque a alguns "pais" não lhes interessa ter um filho "erudito", mas sim um "novo" ator/pop-star dados a conhecer por eventos televisivos onde reina o facilitismo.

Abraço

PortoMaravilha disse...

Víctor,

Vais demasiado depressa. Os rosários de posts não dão tempo de comentar tudo. É o meu sentimento.

Tenho que voltar ao de André Breton. Mas quando ?

Conheci Eduardo Prado Coelho. Assiti a algumas intervenções dele, quer em debate, quer em conferências, quer em roda dum café.

Não concordo com que é dito :

Os acontecimentos actuais em França mostram que a juventude não perdeu os seus ideais humanistas. Antes pelo contrário.

Terá mudado isso sim o suporte da mensagem ?!

No fundo, o que aqui elaboras mostra bem que a imagem se sobrepôe ao texto.

Poderíamos escrever por provocação que o teu blog, assente essencialmente em imagens, não é humanista,ou seja, que perdeu o fio da memória e a escrita ?

Penso que é porque bato à porta do quarto da minha filha e do meu filho, antes de entrar, que estes são solidários com os jovens e velhos que manifestam, em França e Navarra, pelo direito à dignidade na velhice.

O respeito pede respeito !

Nuno