segunda-feira, 18 de abril de 2011

Entrevista Póstuma (4) - Jimi Hendrix


O Homem Que Sabia Demasiado - Em 1965 disse: 'Quero fazer com a minha guitarra o que Little Richard fez com a sua voz'. O que queria dizer com esta afirmação?

Jimi Hendrix - O Little Richard tinha uma forma de cantar muito própria, com uma tremenda garra, soltava as frases com ritmo e geria muito bem os momentos enérgicos com os mais calmos. Por isso foi uma lenda e um visionário do rock 'n' roll, com o qual tive o prazer de tocar durante um ano. Tentei, por isso, fazer da minha guitarra uma espécie de extensão da maleabilidade vocal de Richard. Modéstia à parte, creio que o consegui.

O Homem Que Sabia Demasiado - Não só conseguiu igualar essas qualidades como, claramente, as superou. Por algum motivo é considerado o guitarrista mais influente de todos os tempos.

Jimi Hendrix - Bom, nunca lidei muito bem com essa classificação tão linsonjeira. No meu tempo houve outros grandes guitarristas tão bons como eu - Chuck Berry, Buddy Guy, Bo Diddley, B.B. King... Todos eles foram tão influentes quanto eu. E a seguir a mim vieram outros grandes guitarristas. A diferença que eu incuti é que inovei na forma de tocar rock e blues com a guitarra eléctrica, com um dedilhar só meu, solos que me saiam das entranhas da alma, e uma atitude em palco que muitos jornalistas consideravam "magnética".

O Homem Que Sabia Demasiado - E não foi só por isso, dado que o Jimi foi também inovador ao utilizar o próprio estúdio de gravação como elemento de criação musical, originando uma nova metodologia de gravação musical.

Jimi Hendrix - Sim, é verdade que fui dos primeiros músicos a utilizar a estereofonia e outras técnicas de gravação que enriqueciam musicalmente o meu trabalho. Mas isso foram apenas recursos técnicos, nada faria sentido se não houvesse a mínima criatividade ou a exploração de ideias novas.

O Homem Que Sabia Demasiado - É impossível falar em si sem falar do Festival de Woodstock de 1970, esse acontecimento mítico da cultura popular da segunda metade do século XX.

Jimi Hendrix - Oh, Woodstock!... Haveria tanto para contar sobre esses loucos dias. A verdade é que foi um acontecimento único de partilha de emoções fortes de toda uma geração que partilhava valores comuns. E não era apenas o movimento "flower power" que centralizava a atenção mundial, era a música associada, as ideias que defendiam, a disseminação do amor livre e o combate feroz à guerra do Vietname. Tudo isso confluiu para um festival que marcou várias gerações e...

O Homem Que Sabia Demasiado - E que marcou também pela negativa por causa das drogas.

Jimi Hendrix - As drogas faziam parte inerente da forma de viver de toda essa geração. Os escritores da Beat Generation e o jazz também se juntaram a nós e foram um rastilho para criar um espírito comum mais livre das convenções e da moralidade da sociedade conservadora. Admito que tomei algumas drogas, nesse contexto específico, mas foram essenciais para criar a minha música e para tocar da forma como tocava.

O Homem Que Sabia Demasiado - Em 1967, num concerto em Londres, Jimi Hendrix incendiou, pela primeira vez, uma guitarra em palco. Qual a razão?

Jimi Hendrix - Muitos disseram que era a droga que me incentivava a queimar as guitarras. Nada mais errado. O fogo é o elemento mais mágico das tribos, o elemento mais purificador. No auge das minhas actuações - e sobretudo quando corriam bem e sentia a energia da parte do público - era levado a queimar a guitarra, símbolo do rock, para a purificar, o momento de êxtase total. Era o meu momento de puro ritual, de libertação depois das descargas de adrenalina rock.


O Homem Que Sabia Demasiado - Se tivesse que escolher um guitarrista actual que pudesse ser, de certa forma, o seu discípulo, quem escolheria?


Jimi Hendrix - Humm... Muito difícil responder. Mas talvez escolhesse Thurston Moore, dos Sonic Youth. Acho que, nas últimas duas décadas, foi o guitarrista que mais se assemelhou à minha energia e criatividade guitarrística.

1 comentário:

abc disse...

um dia ainda aparece um livro com estas entrevistas postumas...