quarta-feira, 27 de abril de 2011

Entrevista Póstuma (5) - Buster Keaton



O Homem Que Sabia Demasiado - É célebre a sua expressão "Tragedy is a close-up; comedy, a long shot". O que queria dizer com isto?

Buster Keaton - A tragédia e a comédia são dois campos que se tocam, o reverso da mesma moeda. Experimentar ambas só enriquece o ser humano e o torna mais sensível, mais compreensivo para com as contradições da própria vida. O filme "The General" é prova disso: com um tema sério, a guerra, eu construi uma comédia mordaz. Até na violência e na hostilidade se podem criar momentos de humor. O importante é saber equilibrar o lado da tragédia e o da comédia.

O Homem Que Sabia Demasiado - Nos seus filmes sempre houve essa espécie de "sentimento trágico da vida", apesar de toda a enorme carga de humor que era evidente.

Buster Keaton - Sempre foi esse factor que me diferenciou de Charles Chaplin. Ele tinha um lado sentimental da comédia, eu tinha um lado quase negro, quase trágico. Sempre entendi e usei o "gag" cómico como uma ferramenta de interpretação do mundo, das relações entre homens e mulheres, etc.

O Homem Que Sabia Demasiado - Cultivou um semblante sempre impassível, incapaz de expressar emoções, de feições neutras. Porquê?

Buster Keaton - Por um lado, foi uma forma de construir uma personagem icónica, capaz de resistir impávido à cena mais irresistivelmente cómica. Por outro lado, o facto de nunca rir, permitiu que o espectador pudesse projectar em mim as suas próprias emoções segundo o que via.

O Homem Que Sabia Demasiado - O seu humor era muito físico e consta-se que nunca recorreu a duplos nas cenas mais arriscadas.

Buster Keaton - É verdade. Sempre assumi os riscos da profissão que escolhi. Cresci no mundo do "vaudeville", que misturava circo, teatro, com muitos números cómicos arriscados. Aprendi a moldar e a controlar o meu corpo para quedas e saltos mais mirabolantes. Mas houve uma vez que andei com o pescoço partido durante um ano sem quase me dar conta...

O Homem Que Sabia Demasiado - O seu período de ouro foi durante a década de 20, em que realizou e interpretou várias obras-primas do cinema. A partir de 1930, com o contrato que fez com o estúdio Metro, entrou claramente em decadência.

Buster Keaton - É verdade, infelizmente. Nem foi por causa da ascenção do sonoro. Foi porque a partir desse momento perdi totalmente o controlo artístico dos filmes, e fui forçado a fazer filmes com argumentos e montagens impostos pelo estúdio.

O Homem Que Sabia Demasiado - Em 1952 entrou no filme "Luzes da Ribalta" de Chaplin. Como foi esse encontro?

Buster Keaton - Um momento único de dois artistas que fizeram carreira quase em simultâneo. ao contrário do que se dizia, nunca fomos adversários ou concorrentes no cinema. Cada um tinha o seu espaço, a sua arte, o seu espaço. Nesse filme interpretámos dois palhaços decadentes que faziam números em conjunto. Um filme melancólico que serviu quase como uma metáfora para as nossas carreiras naqueles anos.

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