sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

O mal da cidade dentro do homem banal

Qual é o mal da nossa sociedade? O que é que a corrompe por dentro? O que leva um cidadão comum, com uma vida comum, um emprego comum, a rebelar-se contra tudo à sua volta, no espaço real de poucas horas? A podridão, a corrupção, o consumismo, a publicidade enganosa, o crime, o calor excessivo, a comida de plástico, a violência veiculada pela TV, os pequenos nadas que, acumulados, fazem enlouquecer esse homem comum? Afinal, ele só queria chegar a tempo a casa para o aniversário da filha. Mas a grande cidade, oh a grande cidade que tudo engole e não quer saber do indivíduo para nada, colocou-lhe milhentos entraves ao longo do seu percurso. O primeiro dos quais, logo ao raiar do dia, numa fila de carros. Uma fila de carros igual a todos os outros dias. Mas nesse dia em particular, a paciência rebentou. Esse homem comum, igual a todos nós, com camisa e gravata, trabalhador cumpridor, canetas no bolso e pasta preta, começa nesse momento a perder o controlo. Liberta-se e parte à descoberta do lado negro da cidade.
Uma viagem ao abismo dele próprio e da sociedade que o gerou, "Um dia de Raiva" ("FallingDown", 1993) é um incisivo e denunciador filme de Joel Schumacher. É a queda de um indivíduo comum que passa, de repente, de insípido cidadão a protagonista de um dia na cidade. Um dia. De raiva. Esse indivíduo é Michael Douglas, numa das suas melhores prestações de sempre, encarnando esse homem enraivecido por um conjunto de acontecimentos que fugiram ao seu controlo. Um filme que é um autêntico manifesto sociológico sobre os tempos modernos.
Todas as manhãs, ao ligar a televisão e ver as hercúleas filas de trânsito no acesso a Lisboa e Porto, lembro-me deste filme. E imagino o desespero estampado no rosto de cada um desses automobilistas, à espera de prosseguir a marcha por mais uns metros, para depois parar de novo e esperar, esperar, esperar, até chegar ao emprego. E espanto-me perante esta dúvida: não há, afinal, naqueles condutores, um Michael Douglas em potência?


3 comentários:

Bluesy disse...

A minha experiência nas hercúleas filas diz-me que sim... mas às tantas acaba-se por ficar um bocado "numb" a essas coisas, como a tantas outras: à confusão, às romenas que te tentam lavar o vidro de carro, ao louco do metro do campo grande que grita a plenos pulmões frases sem nexo, aos miúdos que tocam acordeão e fazem truques com um cãozito... E talvez não se devesse.

RUTE disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
RUTE disse...

Vitor, eu odiei esse filme. Saí da sala de cinema completamente transtornada.

O ser humano tem de aprender a controlar todos os sentimentos negativos.

Todos os dias é uma correria, mas porque corremos nós? Afinal o dia de aniversário não são todos os dias? Porque atribuimos especial atenção a aniversários, natais, fim-de-ano, páscoa, etc...

Porque stressamos por chegar a horas, por comprar todas as prendas antes daquele dia??!!

O que é preciso é chegar, são e salvo. Se não se comemora num dia, comemora-se noutro. Há que ser mais descontraído.

E porque funcionamos todos em "manada"? Porque temos todos os meus horários laborais? Porque é que nos convencemos que existe 1 só formato de vida?

Somos prisioneiros de nós mesmos! Essa é que é essa.