A irracionalidade dos fãs

Há fenómenos que, apesar da sua natureza distinta, se aproximam nos efeitos. É o que acontece na relação que podemos estabelecer entre o fanatismo religioso, futebolístico ou artístico. Entre todas estas três tipologias fanáticas (ou fundamentalistas), a racionalidade das coisas toma contornos difíceis de ajuizar. Do fanatismo religioso ou futebolístico, já todos conhecemos exemplos de actos de total e cega devoção à causa que os torna dependentes, psicológica e emocionalmente. Do fanatismo artístico (se esta categoria não existe, invento-a eu agora), há também muitos e bons casos curiosos pela extrema devoção. Os fanáticos por um artista (geralmente musical) calcorreiam o país (e por vezes o estrangeiro) com o único intuito de assistir aos concertos dos seus ídolos. Coleccionam tudo o que há para coleccionar, compram tudo que há para comprar, aguardam horas por um rabisco a que chamam autógrafo, num afã febril que ousa riscar do dicionário a palavra “racionalidade”. No limite, vivem em função do artista que veneram, não pensam em mais nada, canalizam o dinheiro que ganham para investir em mais objectos e causas alusivas a esse artista. E esta análise é válida para todos os géneros musicais: do heavy metal às boysband, do rock à música pimba. Vem isto a propósito do concerto deste sábado desse ícone da música nacional chamado Mickael Carreira, filho de outro ícone das massas, Tony Carreira. Mães de família houve que fizeram 600 km e dormiram duas noites à porta do Coliseu do Porto para conseguir ficar na fila da frente. Outros fãs afirmam, com o orgulho estampado no rosto, que assistiram aos 40 concertos que Carreira deu em 2007. Repare-se no preciosismo: não assistiram a 4 ou 5 concertos na periferia da vila ou cidade onde moram. Foram 40, de Norte a Sul do país. Isto é, assistiram a todos os concertos da digressão nacional do artista. O jornalista questiona os fãs, no sentido de saber-se porque agem desta forma tão devota. Não sabem responder. Gostam e mais nada. Ponto.

Eu propunha ao Governo que profissionalizasse a vocação de fã de artistas. Certamente que seria uma medida oportuna para diminuir drasticamente o índice de desemprego deste país.