sexta-feira, 28 de março de 2008

Jarboe - é impossível explodir o vazio


Houve um tempo em que Nova Iorque era o centro nevrálgico da actividade musical dita underground. Na era pré e pós No-Wave, no final dos anos 70, a emergência de novas propostas, arriscadas e nervosas, transformou-se num fluxo prolífero de renovadas linguagens estéticas. Cruzaram-se múltiplas sensibilidades musicais e abriram-se horizontes imprevisíveis no espectro da música rock (e não só). Desse caldeirão de novas referências, podemos referenciar músicos e bandas como Glenn Branca, Lydia Lunch, Foetus, Sonic Youth, Teenage Jesus and The Jerks e, inevitavelmente, os Swans. Michael Gira, o líder desta banda marcante nas décadas de 80 e 90, soube como poucos traduzir em sons a efervescência existencial (sexo, morte, religião, decadência, podridão eram temas recorrentes) em perturbantes e negros registos como “Cop” (1984), “Greed” (1986) ou o fundamental “White Light Form The Mouth of Infinity” (1991). Como complemento vocal (e instrumental, nos teclados), havia nos Swans um discreto mas influente elemento: Jarboe. A sua voz, ora melodiosa, ora irascível, tornou-se numa referência absoluta no panorama das vocalistas femininas do espectro rock e experimental, onde pontuam também os nomes incontornáveis de Diamanda Galás e Lydia Lunch.Ainda na regência dos Swans, em finais dos anos 80, surge um dos mais interessantes projectos paralelos à actividade do grupo, os Skin, fruto da cumplicidade entre Michael Gira e Jarboe. Desta efémera aliança surgiram dois excelentes álbuns - “Blood, Women, Roses” de 1987, e “Shame, Humilty, Revenge” de 1988. Depois do fim da carreira seminal dos Swans, Jarboe trilhou um percurso musical próprio, feito de colaborações diversas e de discos cada vez mais pessoais e intimistas, não deixando de lado a faceta mais negra e experimental que sempre a caracterizou. Por seu turno, a veia criativa de Jarboe expandiu-se para novos territórios de exploração e novas congeminações musicais. Álbuns a solo como “Beautiful People Ltd” (1993) e “Sacrificial Cake” (1995), este último editado pela Alternative Tentacles, confirmaram Jarboe como uma intrépida exploradora de emoções e pesquisadora de soluções sonoras surpreendentes (nomeadamente, com a introdução de samples electrónicos).
Em 1998,
“Anhedoniac” vê a luz do dia. Registo duro e directo, no qual Jarboe, como é seu apanágio, transgride e subverte todos os limites: estilhaça qualquer vislumbre de formato de canção, alterna melodias encantatórias com devaneios guturais, constrói labirínticos puzzles instrumentais e abre a porta da colaboração a gente da electrónica experimental como os Pan Sonic. O disco “Anhedoniac” foi posteriormente reeditado pela editora Atavistic, num trabalho de remasterização, novo design gráfico e com “bonus tracks”. Sob a máxima “You Can’t Explode What’s Empty”, Jarboe expõe os males do mundo numa descarnada entrega emocional. Musicalmente, a ex-Swans vagueia por entre músicas lamurientas, densas e repletas de insinuações inquietantes sobre a condição humana no mundo moderno. Jarboe cruza texturas aparentemente desconexas, cria ambientes soturnos e alegóricos, provoca e desconcerta o ouvinte. No fundo, tal e qual como fazem todos os grandes artistas.

1 comentário:

Anónimo disse...

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