Hay-on-Wye podia ser o nome de uma bebida estranha ou um trocadilho fonético inventado por algum comediante de "stand-up". Mas Hay-on-Wye é, surpreendentemente, o nome de uma pequena vila do País de Gales que faz fronteira com Inglaterra e que tem menos de 3 mil habitantes. A razão desta cidade ser mundialmente conhecida não se restringe, unicamente, ao seu nome original e às suas bucólicas paisagens naturais, mas sobretudo porque esta terra tem o maior número de livrarias por cada habitante. A proporção é, precisamente, de uma livraria para cada 35 habitantes!
No total Hay-on-Wye tem 38 livrarias, muitas vendem livros em segunda-mão, outras livros novos, e há muitas livrarias especializadas sobre os mais diversos temas: música, ornitologia, religião, fotografia, história, apicultura, criminologia, etc. Uma livraria que me interessaria sobremaneira é a Hay Cinema Bookshop, que tem nas suas prateleiras 400 mil livros sobre... cinema. Em poucas décadas, a vila transformou-se numa Meca dos bibliófilos de todo o mundo, um verdadeiro paraíso para os amantes de livros e literatura. Este fenómeno crescente de proliferação de livrarias transformou por completo a economia local e o fluxo turístico. Uma livraria em quase cada esquina da cidade. Mais: há estantes de livros ao ar livre espalhadas pelas ruas, que se chamam Honesty Bookshop (o nome diz tudo) - ninguém controla as vendas, existindo um pequeno pote no qual cada comprador deposita o dinheiro pela aquisição de um determinado livro. Seria possível este conceito em Portugal?
Este fenómeno de crescimento exponencial de livrarias numa tão pequena cidade, ficou a dever-se a um homem, Richard Booth, que começou a vender livros em segunda mão ao quilo no antigo quartel dos bombeiros em 1961. A enorme quantidade de livros de Booth atraiu um grande número de negociantes de livros e coleccionadores para a cidade, que rapidamente ficou conhecida como a Vila dos Livros. Negócio puxa negócio e Hay-on-Wye não pára de chamar novos investidores e turistas. A dimensão de livrarias por metro quadrado proporcionou a criação de um festival anual de literatura (apoiado pelo jornal The Guardian), chamado Hay Festival, considerado o maior festival de literatura da Grã-Bretanha (atrai 80 mil pessoas ao longo de 10 dias desde 1988), e por onde já passaram figuras mundiais como Harold Pinter, Martin Amis, Bill Bryson, Salman Rushdie, ou John Irving. O próprio Bill Clinton, ex-presidente dos EUA, descreveu este festival com a sintomática frase: "Um Woodstock do cérebro".
No fundo, o fenómeno cultural que Hay-on-Wye representa é um belo exemplo de como ideias simples podem promover o desenvolvimento de uma localidade. Seria muito interessante que houvesse um conceito semelhante em cada país (já não digo em cada cidade).
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