O conhecimento contribui para o estado de felicidade? Somos mais felizes quanto mais conhecimentos tivermos? Sócrates (o filósofo, não o outro) dizia que o saber não só não fazia feliz como levava ao sofrimento e à fragmentação do sujeito. Ou seja, quanto mais conhecimento acumulado, mais gerador de angústias e de ânsias em querer saber mais, com tudo o que isso acarreta em termos psicológicos e emocionais para o indivíduo. Supostamente, vivendo na superficialidade do saber, no limiar da ignorância e na ausência de referenciais culturais, o indivíduo tem melhores condições para ser feliz. Mas será que esta premissa não contradiz o sentido da evolução do conhecimento e da cultura na sociedade actual, entendidos como factores considerados essenciais para uma maior (e melhor) cidadania e bem estar social?
Dando um salto desta temática para a o cinema, se há realizador que mais satirizou os que julgam muito saber - mas que no fundo são uns frustrados - esse realizador é Woody Allen. Em "Annie Hall" (1977), há casos paradigmáticos, como já referi aqui. Woody Allen é um atentíssimo observador do comportamento humano, e um indivíduo culto que sabe que o pedantismo intelectual ofusca a verdadeira essência da natureza humana. Para além do exemplo patente no link acima, há outra situação interessante no filme "Annie Hall" em que o personagem Alvy Singer (na imagem) aborda, aleatoriamente no meio da rua, um casal para lhe perguntar isto:
Alvy - "Vocês parecem um casal feliz. É verdade?"
Mulher - "Sim".
Alvy - "A sério? E como se explica isso?"
Mulher - "Oh, eu sou muito superficial e vazia, não tenho ideias nem nada interessante para dizer".
Homem - "E eu sou exactamente igual".
Woody Allen disse um dia, na sequência deste diálogo e desta complexa questão, que preferia "saber" a não ter ideias e ser superficial. Subscrevo.
6 comentários:
acho bem dificil tal comparação, cada um que é algo teria de não ser algo para sentir o outro e comparar com o anterior, independente de qual lado ou angulo esteja isso já parece ser uma intenção de conhecer mais..
penso tambem que tem diferentes tipos de conhecimento os que expandem e os que limitam.. se procurarmos conhecimentos que expandem seremos mais e melhores (para nós mesmos), mas não que garanta a felicidade.. mas não sei nada exatamente sobre o que disse também.. são puras viagens..
acho que a questão é bem mais simples e intrínseca: ao chegar ao fim da sua busca por conhecimento e sabedoria, o ser humano vai ser finalmente feliz quando perceber a razão do "ser". Por outro lado, o ignorante já era feliz há milénios.
Não será a busca do ser humano uma demanda pelo óbvio ou pelo menos pela felicidade absoluta, livre de sabedoria?
Não trará o saber também felicidade? A felicidade que advém do saber não é tão imediata. Uma grande peça que mostra a luta entre o amor e o saber http://www.teatro-cornucopia.pt/htmls/conteudos/EEluAVplyucgrOzcNq.shtml
Caro Victor, não sei se és dados a selos e correntes blogosféricas (eu tem dias), mas de qualquer forma acho este blogue viciante:
http://aescadadepenrose.blogspot.com/2009/08/vicios.html
Parece realmente uma contradição, mas acho que quanto mais sabemos mais conscientes estamos do mundo e de nós próprios, e como Dostoievski disse : "O sofrimento é a única causa da consciência".
ps: nem de propósito anotei esta frase à pouco tempo ao ler Cadernos do Subterrâneo (ainda não o acabei), e acho que se aplica aqui.
Nan-In, um mestre japonês durante a era Meiji (1868-1912), recebeu um professor de universidade que lhe veio inquirir sobre o Zen. Este iniciou um longo discurso intelectual sobre suas dúvidas.
Nan-In, enquanto isso, serviu o chá. Ele encheu completamente a chávena de seu visitante, e continuou a enchê-la, derramando chá pela borda.
O professor, vendo o excesso se derramando, não pode mais se conter e disse:
“Está muito cheio. Não cabe mais chá!”
“Como esta chávena,” Nan-in disse, “você está cheio de suas próprias opiniões e especulações. Como posso eu lhe demonstrar o Zen sem você primeiro esvaziar sua chávena”
Enviar um comentário