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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Um massacre estilizado



6 de Dezembro de 1989. Um jovem armado entra na Escola Politécnica de Montreal (Canadá), uma instituição voltada para a formação de engenheiros. Aparentemente motivado pelo ódio às feministas, o jovem dispara com toda a calma do mundo contra estudantes (sobretudo mulheres), causando um massacre com o saldo de 14 mortes e dezenas de feridos. O ataque é resultado de um plano de anos e os alvos foram pré-escolhidos. Os eventos são contados a partir de três pontos de vista: o do atirador, que conta os seus motivos e culpa terceiros pela sua frustração, o de uma aluna chamada Valérie e o de seu amigo Jean-François. Apesar do filme retratar um acto sanguinário mostrando o homicídio de 14 mulheres e outras dezenas feridas, não deve ser visto apenas com esse olhar de filme de suspense clássico. É muito mais.

O realizador, Denis Villeneuve (47 anos) é sobretudo conhecido por ter realizado em 2013 o filme "Enemy" com a estrela Jake Gyllenhaal. A sua curta carreira começou em 1998 e em 2009 realiza o filme "Polytechnique" sobre o massacre real da escola politécnica canadiana. Filmado num preto e branco de grande contraste, com um trabalho de câmara em registo quase documental, "Polytechnique" é um magnífico pequeno filme (em duração) que segue as coordenadas estéticas de "Elephant" (2003) de Gus Van Sant (este sobre o massacre do Liceu de Columbine). A diferença é que no filme de Sant as cores eram fortes e intensas e o ritmo narrativo bastante mais lento; no filme de Villeneuve o branco da neve contrasta com o escuro do sangue e dos corpos, a ambiência é estilizada e quase (por vezes) onírica, a violência não é gratuita nem explícita. Mas o horror está estampado no rosto do jovem assassino atormentado e no dos colegas que persegue e mata.

"Polytechnique" é um belo exercício de estilo de Villeneuve, quase como se fosse Alain Resnais da fase "Hiroshima, Mon Amour" a filmar esta tragédia. A fotografia é esplêndida, os ângulos e planos originais, a montagem simples e eficaz, as metáforas visuais deveras sugestivas. E a música é de puro bom gosto que sabe acompanhar e sublinhar as imagens. Um filme que só agora vi e que considero uma pequena pérola do cinema independente contemporâneo.

Fica o trailer:

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

O bom cinema que veremos em 2015

Agora que 2015 começou há que antecipar o ano em termos culturais. No que diz respeito ao cinema, a imprensa e as redes sociais têm indicado muitos títulos que irão marcar o ano. 
Na minha humilde opinião começo por destacar os filmes que serão totalmente dispensáveis de ver:

- "As Cinquenta Sombras de Grey"
- "Velocidade Furiosa 7"
- "Vingadores: a Era de Ultron"
- "Resident Evil 6"
- "Taken 3"
- "Rambo 5"
- "Mission Impossible 5"
- "Terminator: Genisys"
- "Paranormal Activity: The Ghost Dimensions"
- "Hitman: Agent 47"
- "The Fantastic Four"
- "[REC] 4: Apocalypse"
- "Ted 2"
- "The Hunter Games: Mockingjaxy part 2"
- "Superman vs Batman"
- "Mad Max: Fury Road"

Ou seja, fujo de tudo quanto cheire a blockbuster de entretenimento repetitivo e com fórmulas mais do que gastas, a sequelas e prequelas de blockbusters para consumir pipocas no meio da assistência apática de adolescentes imberbes.

Posto isto, vamos ao verdadeiro cinema enquanto Arte. E assim, os filmes que vão estrear (pelo menos em Portugal) em 2015 que mais me suscitam (muita) vontade de ver são (e não digam que não vai ser um grande ano de cinema!):

- "Flashmob" - Michael Haneke
- "Onomatopoeia" - Jean-Luc Godard 
- "Blackhat" - Michael Mann 
- "Leviathan" - Andrey Zvyagintsev
- "Silence" - Martin Scorsese
- "The Hateful Height" - Quentin Tarrantino
- "American Sniper" - Clint Eastwood
- "Inherent Vice" - Paul Thomas Anderson
- "Olhos Grandes" - Tim Burton
- "Queen of the Desert" - Werner Herzog 
- "I Walk With The Dead" - Nicolas Winding Refn
- "Sierra-Nevada" - Cristi Puiu
- "The Early Years" - Paolo Sorrentino
- "Sea of Trees" - Gus Van Sant 
- "Life" - Anton Corbijn
- "Francophonia: Le Louvre Under German Occupation" - Aleksandr Sokurov
- "The Assassin" - Hou Hsiao-hsien 
- "Idol's Eye" - Olivier Assayas
- "Dance of Reality" - Alejandro Jodorwosky 
- "Ferryman" - Wong Kar-Wai
- "D" - Roman Polanski
- "Sunset Song" - Terence Davies 
- "Mountains May Depart" - Jia Zhangke 
- "Crimsom Peak" - Guillermo del Toro
- "The Lost City of Z" - James Gray
- "Uma Dívida de Honra" - Tommy Lee Jones
- "Regression" - Alejandro Aménabar
- "Pasolini" - Abel Ferrara
- "Babi Yar" - Sergei Loznitsa 
- "Birdman" - Alejandro Gonzales Iñarritu
- "Cemetery of Kings" - Apichatpong Weerasethakul 
- "Knight of Cups" - Terrence Malick 
- "Women’s Shadow" - Philippe Garrel 
- "Three Memories of Childhood" - Arnaud Desplechin 
- "Louder Than Bombs" - Joachim Trier 
- "Arabian Nights" - Miguel Gomes 
- "Montanha" - João Salaviza
- "Carol" - Todd Haynes  
- "The Last Vampire" - Marco Bellocchio 


E certamente que esta lista não está fechada. 
Outros filmes de qualidade serão anunciados para enriquecer ainda mais este ano cinematográfico. 


terça-feira, 10 de junho de 2014

Biopic sobre os VU?

Os biopics de personalidades musicais estão na moda em Hollywood. Os próximos sonantes são os filmes sobre a vida de James Brown e de Whitney Houston
Na realidade, há poucos bons filmes biográficos de músicos que me interessam. O melhor dos últimos anos foi "Control" sobre Ian Curtis/Joy Division. Haveria um biopic que me interessaria muito: The Velvet Underground.
Mas para tal era preciso saber qual seria o realizador ideal para tal empreitada (e numa segunda fase, saber quais seriam os actores). Que cineasta poderia reunir os requisitos artísticos e a sensibilidade (cinematográfica e musical) para levar a bom porto um projecto destes? 
Eu arrisco: 

- Anton Corbijn 
- Gus Van Sant 
- Paul Thomas Anderson
- Abel Ferrara
- Martin Scorsese 
- Jim Jarmusch 
- Clint Eastwood 
- Darren Aronofsky 
- Steven Soderbergh 
- Joel e Ethan Coen

domingo, 21 de julho de 2013

Diálogos minimalistas


Há filmes com muitos diálogos e filmes minimalistas com quase nenhuns diálogos. Ter muitos ou poucos diálogos num filme não é forçosamente um indício de filme medíocre ou de filme muito bom. Depende de outros factores, como a qualidade do enredo, da realização e, sobretudo, da interpretação. 
O site Flavorwire elaborou uma lista de 10 filmes caracterizados por uma espartana economia de diálogos. Por acaso, desta lista, considero que são todos filmes bons e interessantes, mas fazendo um esforço de memória dou-me conta que faltam exemplos demonstrativos do minimalismo de diálogos no cinema, como: "Gerry" (2002) de Gus Van Sant, "Duel" (1971) de Steven Spielberg, "O Cavalo de Turim" (2012) de Béla Tarr, "Solaris" (1972) de Andrei Tarkovski, "O Náufrago" (2000) de Robert Zemeckis, "Ossos" de Pedro Costa, "Ariel" (1988) de Aki Kaurismaki ou "Mãe e Filho" (1997) de Alexander Sokurov.
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Na imagem, "O Samurai" (1967) de Jean-Pierre Melville.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Entrevista Póstuma (12) - Kurt Cobain




O Homem Que Sabia Demasiado - Será sempre recordado como o líder de uma geração inquieta, cujo lema musical está patente em "Smells Like Teen Spirit"?

Kurt Cobain - Bah! Nunca quis ser modelo de ninguém, muito menos de uma geração. E essa música, apesar de ter sido a que mais sucesso comercial teve com os Nirvana, é das que gosto menos.

O Homem Que Sabia Demasiado - Durante toda a sua vida lutou contra o vício da heroína, depressão, fama, imagem pública e pressões profissionais. Como lidou com tudo isto?

Kurt Cobain - Como acha que lidei? Sempre odiei a exposição pública e o mediatismo que, a dada altura, os Nirvana me trouxeram. As depressões eram decorrentes dessa sensação de permanente insegurança. A droga foi uma libertação e, ao mesmo tempo, uma maldição toda a vida.

O Homem Que Sabia Demasiado - E a sua vida familiar também não foi fácil...

Kurt Cobain - Pois não. Eu tinha vergonha dos meus pais. Eu não poderia enfrentar alguns dos meus amigos na escola porque eu, desesperadamente, queria ter a família típica. Mãe, pai. Eu queria a segurança, mas só senti ressentimentos para com os meus pais. E na escola passei por um inferno porque fui vítima de violência e bullying.

O Homem Que Sabia Demasiado - E que papel teve a sua educação religiosa?

Kurt Cobain - Bom, os meus pais educaram-me com os valores religiosos, mas à medida que crescia procurei outras soluções, como o Budismo, que tinha outra hierarquia de valores mais importantes para mim. Foi do Budismo que retirei o nome da banda - Nirvana.

O Homem Que Sabia Demasiado - Gostou do filme que o realizador Gus Van Sant fez vagamente inspirado na sua vida - "Last Days" de 2005?

Kurt Cobain - Detestei. Tudo: a realização lenta e monótona, a interpretação do tipo que, supostamente, fazia de mim, a forma como foi utilizada a música no filme... Tudo. Aquilo é tanto sobre a minha vida como "Psico" é sobre a Madre Teresa de Calcutá.

O Homem Que Sabia Demasiado - Casou com Courtney Love em 1992 já ela estava grávida da sua filha. Que papel teve Courtney na sua vida?

Kurt Cobain - Preferia não falar dela. Houve demasiados equívocos e problemas que acabaram por me destruir a vida, e Courtney contribuiu para isso. Sempre achei que as maiores loucuras são as mais sensatas alegrias, pois tudo que fiz ficou na memória daqueles que um dia sonharão ser como eu: louco, porém, feliz.     

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Os filhos de grandes realizadores


Será que em Hollywood "filhos de peixes sabem nadar"? Talvez sim, talvez não.
Há filhos de actores e actrizes famosos que vingaram no cinema no passado e estão a vingar agora - o caso mais recente de reconhecimento é o do jovem Henry Hopper, filho do grande actor Dennis Hopper (que protagoniza "Restless" de Gus Van Sant).
Ora, no que se refere a filhos de realizadores famosos, já não é tão fácil encontrar bons estreantes no cinema. A fazer fé na lista em baixo, apenas Sofia Coppola representa uma confirmação absoluta.
Os filhos dos outros realizadores estão a começar agora (ou começaram há poucos anos) e, aos poucos, vão conquistando - ou não - reconhecimento artístico, alguns talvez à custa da boleia dos apelidos célebres. O caso mais sério talvez seja o de Jason Reitman (na imagem), que realizou nos últimos anos os aclamados filmes "Nas Nuvens" e "Juno".
Já o caso de Duncan Jones, filho de David Bowie (apesar deste não ser realizador, a sua carreira também passou pelo cinema), teve uma estreia auspiciosa com o filme de culto de ficção científica "Moon".
Quanto aos filhos de Oliver Stone ou Steven Spielberg, são casos ainda imberbes que estão a iniciar-se no mundo do cinema. Veremos, com o passar dos anos, o que esta geração com apelidos sonantes irá oferecer ao mundo da sétima arte.
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Jason Reitman - filho de Ivan Reitman
Sofia Coppola - filha de Francis F. Coppola
Max Landis - filho de John Landis
Jake Kasdan - filho Lawrence Kasdan
Sam Levinson - filho de Barry Levinson
Sean Stone - filho de Oliver Stone
Max Spielberg - filho de Steven Spielberg
Duncan Jones - filho de David Bowie

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Gus Van Sant sobre Béla Tarr

Já se sabia que o realizador Gus Van Sant nutria uma especial admiração pelo cinema do húngaro Béla Tarr. Prova desta profunda admiração são os filmes "Gerry", "Elephant" e "Last Days", realizados sob a clara influência estética de Tarr.
Ora, o que eu nunca tinha lido era um artigo do próprio Gus Van Sant a explicar porque é que considera Béla Tarr um dos raros cineastas visionários da modernidade. Esse artigo foi escrito em 2001 a propósito de uma retrospectiva do cinema do realizador húngaro no MoMA (EUA).
Eis o artigo de Gus Van Sant a explicar a sua veneração.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Sophie e Henry: o peso dos apelidos

Eis dois casos bem sucedidos que comprovam o adágio popular que diz "filho de peixe sabe nadar": dois jovens filhos de grandes talentos artísticos (cujos apelidos dizem tudo). Por um lado, Henry Hopper, filho do grande actor de culto Dennis Hopper. Tem apenas 21 anos e é actualmente a estrela do novo filme de Gus Van Sant ("Restless").
Sophie Auster, 23 anos, por seu lado, carrega a responsabildiade do apelido do pai, Paul Auster, um dos grandes escritores norte-americanos vivos. Entrou pela primeira vez num filme aos 8 anos mas é a música que a tem submetido debaixo dos holofotes internacionais. Editou um álbum há uns anos, está a caminho de lançar um segundo e esteve há dias no Estoril & Lisbon Film Festival a mostrar o ar da sua graça.
Duas jovens promessas, repletas de potencial, criatividade e beleza que, certamente, com o futuro exigente das suas carreiras, irão honrar os pesados apelidos que ostentam.
Henry Hopper
Sophie Auster

domingo, 28 de agosto de 2011

A rentrée do cinema


No último suplemento Ípsilon do jornal Público foi publicado um destaque à chamada "rentrée" cultural que se avizinha (de Setembro a Dezembro deste ano).
De todas as dezenas de referências enumeradas ao nível de filmes, as que eu mais aguardo ansiosamente são:
- "O Hospício" - John Carpenter
- "Meia-Noite em Paris" - Woody Allen
- "Cave of Forgotten Dreams" - Werner Herzog
- "Sangue do Meu Sangue" - João Canijo
- "Restless" - Gus Van Sant
- "La Piel que Habito" - Pedro Almodóvar
- "Habemus Papam" - Nanni Moretti

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Cannes prometedor


Grandes realizadores concorrem para a Palma de Ouro no próximo festival de Cannes: Pedro Almodóvar, Terrence Malick, Nanni Moretti, Aki Kaurismaki, Nuri Bilge Ceylan, Lars Von Trier, Jean-Pierre e Luc Dardenne, Alain Cavalier, entre outros.
E na sempre interessante secção "Un Certain Regard" ainda vão estrear os novos filmes de Woody Allen, Jodie Foster e Gus Van Sant.
Um festival prometedor.
Visto aqui.

sábado, 2 de abril de 2011

Kurt Cobain no seu labirinto

É a melhor cena do filme "Last Days" de Gus Van Sant sobre os últimos dias de vida (ficcionados) de Kurt Cobain, mítico líder dos Nirvana: um único plano-sequência (à Béla Tarr, grande influência na realização de Gus) mostra-nos Cobain a expulsar, em crescendo de intensidade, os seus demónios interiores, tocando guitarra, bateria e vomitando gritos de raiva, numa mansão isolada no mei da floresta. Há qualquer coisa de pujante e misterioso nesta cena, que é sentido pela música, mas também pela actuação de Michael Pitt (que encarna Kurt Cobain) e pelo lento e suave movimento de câmara. Dir-se-ia que Kurt Cobain estava a libertar-se da sua solidão e do seu labirinto mentalmente caótico.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A (fascinante e terrível) América psicótica


O fascínio que os americanos, no geral, têm pela cultura das armas e pela violência advém das reminiscências do Oeste selvagem. O tema foi explorado por Michael Moore no seu documentário “Bowling for Columbine”, e inúmeros ensaios, livros e estudos, têm tentado explicar o fenómeno (ainda há dias uma notícia dava conta de um plano falhado de um jovem em matar colegas de escola). A América não é o país mais violento do mundo. México, Colômbia ou até o Brasil têm índices mais elevados de violência.
No que os EUA são diferentes são no tópico "homicídios sem motivação aparente", aqueles crimes que espantam a opinião pública com os massacres nas escolas ou outros locais públicos. É quase sempre nos EUA que surgem os casos de violência mais espectaculares e mediáticos.
A América é a terra natural dos serial killers (estatisticamente falando), é a terra dos massacres improváveis, dos crimes mais hediondos, inexplicáveis e intrincados (vide o filme “Zodiac” de David Fincher, ou "Elephant" de Gus Van Sant, ou "Henry - Retrato de um Assassino", ou...), dos assassínios de figuras públicas, etc.
E a obsessão dos americanos pela violência e pelo crime é historicamente fértil. Paralelamente, a investigação forense também exerce um grande fascínio junto do cidadão comum. O estudo da mente de um criminoso (sobretudo da de um serial killer) é matéria vasta para dissertações teóricas e científicas. O lado negro da mente humana emerge como matéria de fascínio e de desconcerto perante a racionalidade das coisas.
Na literatura, no cinema e nas séries de televisão, a criminologia, a morte violenta, e as patologias sociais associadas, são temas extremamente recorrentes e explorados até à saciedade. Os sucessos dos últimos anos no campo das séries televisivas têm forte relação com este panorama – CSI, 24, Dexter, Prison Break, Ossos, Lei e Ordem são apenas alguns exemplos.
Na literatura, basta referir o sucesso de Truman Capote com o livro “A Sangue Frio”, espantoso relato semi-jornalístico, semi-ficcional, de um homicídio brutal na América rural dos anos 50.
Haveria muito mais para mencionar, mas fico-me apenas por mais este exemplo: “American Psycho” (na imagem), livro do escritor da chamada Geração X, Bret Easton Ellis (autor de outro livro de culto - "Menos Que Zero"), perturbante retrato de uma viagem ao abismo na violência mas sádica e desbragada, numa sociedade americana dos anos 80 afogada em yuppies corretores de bolsa e endinheirados consumistas.
O livro foi adaptado para cinema pela realizadora Mary Harron (em 2000), com o actor Christian Bale possuído como um urso em fúria. Bale é Patrick Bateman, durante o dia um cumpridor executivo da bolsa, obcecado pelos bens materiais, usa fatos de alta-costura, cultiva o corpo, é calculista e frio, e frequentador de restaurantes elitistas. À noite, Patrick transforma-se num monstro sanguinário e implacável, assassinando, sem dó nem piedade, almas penadas que vagueiam pelos becos de Nova Iorque. Os bens materiais não o satisfazem, e procura excitação na violência mais alucinada.
A visão ficcionada e aterradora do livro de Bret Easton Ellis recalca a ferida aberta que é a violência desmedida e sem motivação aparente na sociedade actual. Reflecte o mal civilizacional e a deriva de um homem que se tornou reflexo da era do vazio, amoral, libertina. Uma América cada vez mais psicótica. Uma América que gosta de ostentar a bandeira da liberdade, da democracia e das oportunidades, mas que também vive num limbo de sordidez, sombras e violência.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Béla Tarr - um realizador único


Se me perguntarem qual o melhor realizador vivo em actividade, muito provavelmente responderia: Béla Tarr. No panorama do cinema de autor contemporâneo, Béla Tarr é o realizador mais talentoso e original. Mais do que Sokurov, do que Kaurismaki, do que Nuri Ceylan, o cineasta húngaro é o esteta por excelência, o visionário que desenvolveu uma linguagem visual própria (só filma a preto e branco), que abordou a deriva existencial do homem moderno em filmes fascinantes. Os seus filmes são como poemas visuais em permanente estado de graça. Personagens cruas e paisagens desoladoras, histórias minimalistas e místicas (na senda da inevitável referência Tarkovski), fotografia absorvente e intrigante. Depuração plástica a toda a prova. Tarr é um estilista da imagem que joga com a luz e as trevas. E trabalha os movimentos de câmara com uma perícia e minúcia como mais ninguém faz hoje.
Béla Tarr filma como se não existisse câmara, como se o olhar do espectador fosse a própria câmara. A forma como compõe a extraordinária "mise-en-scène" dos seus filmes e o modo como opera os longos movimentos de câmara (tem planos-sequência de 10 minutos) são estímulos para os sentidos. Gus Van Sant é um admirador do cineasta realizou o magnífico filme "Gerry" a pensar em Béla Tarr (não só este filme, como também "Elephant"). Conheci o seu trabalho com uma edição em DVD de dois dos seus mais célebres filmes: "Damnation" (1988) e "Werckmeister Harmonies" (2000), à venda na Amazon.com.
Béla Tarr é um dos realizadores mais radicais na opção pelo recurso do plano-sequência. Impressiona pela maneira como os seus filmes progridem como se se tratasse de um transe colectivo, que contamina os actores, a encenação e, por consequência, o espectador, desde que este se deixe envolver pelas histórias que se transformam em adágios visuais a preto e branco.
A obra de Tarr mais ambiciosa, bela, negra e épica é o filme "Sátántangó" ("Satan's Tango"), com sete horas de duração. Um espantoso fresco moderno sobre a vida conturbada de uma família rural húngara. Não é um cinema fácil e de aceitação imediata, sobretudo para os espectadores habituados à linguagem "videoclip" do cinema de Hollywood (ou de grande parte do cinema de Hollywood). O cinema de Béla Tarr é um cinema de estilo e austero, de muitas subtilezas visuais, de um ritmo pausado e de grande exigência formal, que solicita do espectador uma atenção e assimilação especiais.
O seu último filme, estreado no festival de Cannes 2008, baseado num conto do escritor policial George Simenon, é o magnífico "The Man From London" (é o único filme em DVD de Tarr à venda em Portugal) sobe o qual escrevi neste post.
Béla Tarr é um assumido "outsider", não tem site oficial, recusa entrevistas de jornalistas, não faz campanhas de promoção dos seus filmes. É um genial artista solitário e misantropo, como tantas das suas personagens dos seus filmes. Dedica-se de corpo e alma à sua arte.
De seguida, uma sequência do filme "The Man From London", das poucas sequências disponíveis no YouTube deste filme. É um único plano-sequência de 2'30''. Repare-se na mestria como a câmara se move e filma os personagens. Quem mais filma desta maneira em todo o mundo? Mais: em comparação do que escrevi a propósito da música no filme "Inception", constate-se a forma como a música é empregue nesta sequência: brilhantismo e total originalidade.

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Paulo Furtado em grande


A carreira de Paulo Furtado continua de vento em popa. O seu projecto Legendary Tiger Man é aplaudido pela crítica internacional e já chegou ao conhecimento de artistas consagrados a nível mundial. É o caso do realizador Gus Van Sant. O cineasta de "Milk" convidou o músico português a participar no seu próximo filme intitulado "The Lonesome Man".
Van Sant comentou à Entertainment Weekly que Paulo Furtado é "um músico invulgar com uma personalidade que se adequa à personagem que quero desenvolver no meu filme. A sua música vai buscar inspiração às raízes da música americana, facto que também me interessa explorar".
O músico português terá um papel secundário num filme que conta a história de um homem solitário que faz uma viagem de costa a costa dos EUA à procura de um sentido para a vida após um acontecimento traumático. A banda sonora será assinada pelo próprio (como entidade Legendary Tiger Man). O papel feminino, já confirmado, será interpretado pela actriz Rachel Weisz.
O filme começará a ser rodado em Julho próximo a tempo de estrear no festival de Cannes de 2011. Aguardemos, pois, por esta projecção auspiciosa de Paulo Furtado no cinema internacional!

quinta-feira, 18 de março de 2010

Perguntas indiscretas - 25

Li algures que o próximo filme da saga "Crepúsculo" ("Twilight") vai ser realizado por um dos seguintes realizadores: Gus Van Sant ou Sofia Coppola. Eu sei, custa a acreditar. Mas a ser verdade, qual destes cineastas teria melhor perfil para fazer um filme sobre vampiros deveras original e ousado?

domingo, 7 de fevereiro de 2010

O que os outros realizadores dizem de Kubrick

Ler comentários de realizadores consagrados sobre um determinado colega de ofício é perceber melhor a essência desse mesmo realizador. No caso, Stanley Kubrick. Recolhi um série de testemunhos de cineastas famosos sobre o autor de "Laranja Mecânica", os quais me parecem elucidativos sobre a dimensão artística de Kubrick:

MARTIN SCORSESE: “Watching a Kubrick film is like gazing up at a mountaintop. You look up and wonder, how could anyone have climbed that high?”

JAMES CAMERON: “I remember going with a great sense of anticipation to each new Stanley Kubrick film and thinking, “Can he pull it off and amaze me again?” And he always did. The lesson I learnt from Kubrick was, “Never do the same thing twice.”

STEVEN SPIELBERG: “He created more than movies. He gave us complete environmental experiences that got more, not less, intense the more you watched them.”

ORSON WELLES: “For me, Kubrick is a better director than Huston. I haven't seen Lolita but I believe that Kubrick can do everything."

DAVID LYNCH: "I really love "Eyes Wide Shut". I just wonder if Stanley Kubrick really did finish it the way he wanted to before he died."

OLIVER STONE: “He was the single greatest director of his generation. He influenced me deeply.”

LUIS BUNUEL: “A Clockwork Orange is my current favourite. I was very predisposed against the film. After seeing it, I realize it is the only movie about what the modern world really means.”

SIDNEY LUMET: “Each month Stanley Kubrick isn’t making a film is a loss to everybody.”

FLORIAN VON DONNERSMARCK: “My megalomaniac goal is to make a film that could stand next to the films of Kubrick.”

BRYAN SINGER: "Kubrick showed us something special. Every film was a challenge, and a direct assault on cinema's conventions."

LARS VON TRIER: "I don't think that matters. I have a great affection for Kubrick and this film only strips things further."

MARTIN SCORSESE: "One of his pictures is equivalent to ten of somebody elses".

BRIAN DE PALMA: "It took me 20 years to appreciate Kubrick. I put Barry Lyndon on in my hotel room and couldn't look away. That's great film making."

PAUL THOMAS ANDERSON: "We're all children of Kubrick, aren't we? Is there anything you can do that he hasn't already done?"

GUS VAN SANT: "There's usually some of Kubrick in all of my films."

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Perguntas indiscretas - 12

Na sequência do post anterior, lanço uma pergunta: qual seria o realizador ideal para fazer um filme sobre os The Velvet Underground? Que cineasta reúne os requisitos artísticos e a sensibilidade (cinematográfica e musical) para levar a bom porto um projecto destes?
Eu arrisco:
- Anton Corbijn
- Julian Schnabel
- Gus Van Sant
- Martin Scorsese
- Jim Jarmusch
- Clint Eastwood
- Darren Aronofsky
- Steven Soderbergh
- Joel e Ethan Coen
(...)

domingo, 12 de julho de 2009

Plano-sequência de acção

Gosto de filmes que tenham boas montagens. De Eisenstein a Scorsese, de Hitchcock a Cronenberg, muitos foram os grandes cineastas que fizeram da montagem uma linguagem artística e expressiva. No oposto deste recurso, está o plano-sequência, que não admite cortes na filmagem. Mas também gosto muito de realizadores que recorrem, com notável mestria estética e técnica, ao plano-sequência. Desde a clássica abertura de "A Sede do Mal" (1958) de Orson Welles até "A Arca Russa" (2002) de Sokurov, ou aos filmes de Béla Tarr, Tarkovski e Gus Van Sant, o plano-sequência elevou-se a verdadeira expressão de arte.
Ora, eu julgava que o plano-sequência era sobretudo utilizado pelos realizadores como instrumento de contemplação, em sequências lentas e meditativas. Pensava que não havia grandes plano-sequência em filmes de acção, que privilegiam, precisamente, a montagem frenética. A verdade é que me enganei. Há dias descobri um filme que tem uma sequência espantosa filmada em plano-sequência e que é um filme de acção puro e duro. É um filme tailandês de artes marciais e acção.
O título americano é "The Protector" (2005) e é realizado por um tal Prachya Pinkaew. Na Internet vi comentários afirmando que se trata de uma sequência tão bem filmada e original quanto a cena inicial de "A Sede do Mal" de Welles. Não diria tanto, mas este plano-sequência é deveras um trabalho incrível ao nível do movimento de câmara (que parece que voa atrás do protagonista) e ao nível da coreografia da acção. Por vezes faz lembrar os movimentos de câmara do filme pioneiro "The Shining" (1980) de Stanley Kubrick, pela forma ágil como a "steadycam" se movimenta à volta do protagonista. O melhor é mesmo ver:
PS - Lembrei-me agora que há um filme de acção com bons planos-sequência - "Children of Men.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

As Palmas de Ouro


Começou hoje o melhor festival de cinema do mundo, Cannes. A lista de realizadores com novos filmes que vai ser mostrada ao mundo nesta edição é verdadeiramente estonteante: Alain Resnais, Quentin Tarantino, Pedro Almodóvar, Lars von Trier, Francis Ford Coppola, Terry Gilliam, Gaspar Noé, Johnnie To, Ang Lee, e muitos outros grandes cineastas de autor da actualidade vão estar representados. Muitos deles, irão competir pela desejada e prestigiada Palma de Ouro, o galardão que rotula para sempre o filme (e respectivo realizador) como obra de arte cinematográfica contemporânea (ainda que haja, por vezes, discussões à volta da definição deste conceito e da justiça da atribuição do prémio).
E por falar em Palma de Ouro, estive a verificar a lista de premiados e apeteceu-me elaborar uma lista com os 10 filmes galardoados de que mais gosto. Assim, por ordem de preferência, e compreendendo apenas os filmes vencedores dos últimos 20 anos (entre 1989 - 2009):

1 - "Pulp Ficion" (1994) - Quentin Tarantino
2 - "Barton Fink" (1991) - Joel e Ethan Coen
3 - "Underground" (1995) - Emir Kusturica
4 - "O Pianista" (2002) - Roman Polanski
5 - "Coração Selvagem" (1990) - David Lynch
6 - "Elefante" (2003) - Gus Van Sant
7 - "Dancer in The Dark" (2000) - Lars Von Trier
8 - "O Piano" (1993) - Jane Campion
9 - "4 Meses, 2 Semanas e 2 Dias" (2007) - Christian Mungiu
10 - "O Quarto do Filho" (2001) - Nanni Moretti