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quarta-feira, 18 de março de 2015

A educação do meu gosto - 3

A educação do  meu gosto - Literatura

Somos o que somos e gostamos do que gostamos porque estivemos sob influências de determinadas condicionantes. Ou como diria Ortega y Gasset: “Eu sou eu e a minha circunstância”.




Comecei a ler relativamente tarde. Ao contrário do meu gosto pela música que começou bastante cedo (12 anos), a leitura foi um prazer tardio. Lembro-me de ler durante horas banda desenhada – Hugo Pratt, Michel Vaillant, Quino (Mafalda), Lucky Luke, Asterix e super-heróis da Marvel. A leitura de livros sem imagens foi iniciada volta dos meus 17 anos com policiais: Agatha Cristie, George Simenon e Raymond Chandler. O mesmo amigo que me despertou para Tarkovski era um fã de Franz Kafka e passou-me esse entusiasmo: “A Metamorphose” e “O Processo” foram um choque. 

De Kafka passei para os contos de Edgar Allan Poe e Lovecraft, os surrealistas (André Breton, Apollinaire…) e essas obras negras e fascinantes chamadas “Os Cantos de Maldoror” de Lautréamont e "Filosofia na Alcova" do Marquês de Sade. A leitura de "Siddharta" de Herman Hesse aos 19 anos foi toda uma epifania. O mesmo amigo que me gravava as cassetes “Heterodoxos” introduziu-me nas teorias sociais e culturais revolucionárias do Situacionismo com o livro “A Sociedade do Espectáculo” de Guy Debord e nos movimentos de ruptura artística do Dadaísmo, Futurismo, Beat e Fluxus. Desenvolvi um gosto pelos autores "malditos" e fora do mainstream literário. O meu gosto pela leitura foi-se acentuando até ler autores tão díspares quanto Holderlin, Artaud, Proust, Hemingway, Bukowski, Camus, Genet, Michaux, Burroughs, Schopenhauer, Kierkegaard, Stig Dagerman, James Joyce, Albert Cossery, Italo Calvino, Unamuno, Oscar Wilde, Henry Miller, Philip Roth, Conrad, Mishima, Bataille entre dezenas de outros. Não sei bem porquê mas nunca consegui adentrar-me nos russos (Dostoievski, Tolstoi, Tchekov, Gogol...).

Desenvolvi um fervor especial pela leitura de livros de ensaios de música, arte, cinema e livros históricos sobre a 2ª Guerra Mundial, tendo um fascínio especial pela história do Holocausto. Interessei-me pelas (auto)biografias de artistas e por vastos temas relacionados com a cultura digital/cibernética dos nossos dias.

Não sei exactamente em que medida, mas sei que a leitura (e aquilo que li ao longo da minha vida) foi essencial para definir o que (sei) sou hoje.

Imagem: pormenor da minha biblioteca.

domingo, 15 de março de 2015

A educação do meu gosto - 1

A educação do meu gosto - Cinema



Somos o que somos e gostamos do que gostamos porque estivemos sob influências de determinadas condicionantes. Ou como diria Ortega y Gasset: “Eu sou eu e a minha circunstância”.  

Durante a minha adolescência gostava de filmes do Rambo e filmes de acção em geral. Mas também nessa altura comecei a ver filmes clássicos na televisão (RTP2), épicos históricos, de gangsters e westerns. A televisão espanhola passava aos sábados à tarde grandes filmes clássicos de Hollywood que via com sofreguidão. Um dia, numa noite num bar da minha cidade encontrei-me com um amigo mais velho. Um amigo com uma cultura vasta e de qualidade. Começámos a falar de cinema e fixei para sempre uma frase que me disse: “Tens de conhecer o cinema de Andrei Tarkovski, é um cinema metafísico de grande exigência estética”. Nunca tinha ouvido falar do cineasta russo mas fiquei altamente motivado para tal. Numa época sem internet e poucas enciclopédias disponíveis, lá procurei por esse Tarkovski. Até que um outro amigo, estudante de Comunicação Social, me gravou uma cassete VHS com o filme “Stalker” (na imagem). Vi-o nessa mesma noite e quase não consegui dormir atormentado por tantas interrogações que o filme me suscitou.

A descoberta de Tarkovski foi, certamente, o início da minha formação de gosto pelo bom cinema. A partir daí comecei a ler religiosamente as críticas de cinema nos jornais e revistas, os catálogos da Cinemateca, a procurar todos os livros sobre cinema da biblioteca pública e a conhecer cada vez mais a história do cinema desde as suas origens. Ou seja, o gatilho que me despertou para o cinema de qualidade foi o encontro com esse amigo num bar em finais dos anos 80. 
Obrigado, António.

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Jovens alegres no Lee Strasberg





A revista Sábado publicou uma reportagem sobre quatro jovens (na imagem) portugueses que se encontram a estudar no principal conservatório de artes dos EUA, isto é, no Lee Strasberg Theatre and Film Institute, em Nova Iorque.
Famoso desde há décadas por ser uma instituição que formou alunos como James Dean, Robert De Niro ou Marlon Brando, o Lee Strasberg Intitute é reconhecido mundialmente como uma das escolas mais exigentes e elitistas no mundo do teatro e do cinema. Ora, não é todos os dias que jovens estudantes portugueses frequentam esta escola.
A Daniela Ruah (actualmente numa série de sucesso na Foz americana) ou o Ivo Canelas foram dois actores portugueses que aprenderam a arte de interpretar segundo o famoso método de Lee Strasberg. No total, estudam 250 alunos naquela instituição, a maior parte estrangeiros (que pagam 25 mil euros de propinas!). 
Os quatro jovens que actualmente estudam nesta instituição, refere a Sábado, têm entre 19 e 23 anos. Os quatro têm muito empenho, vontade de trabalhar e muitos sonhos que querem ver concretizados. Nada de errado, até aqui. 
O que achei estranho foram certas afirmações sobre estes estudantes: "Eles querem ser actores famosos, adoram ver filmes mas não percebem muito da história da profissão. Cinema mais antigo e europeu é para esquecer e sobre os trabalhos que se fazem em Portugal sabem zero. Os seus actores de referência são Russel Crowe, Johnny Depp, ou Meryl Streep. Não descartam a possibilidade de fazer novelas em Portugal, porque isso seria uma oportunidade para melhorar o currículo". 
Perante declarações destas, custa-me constatar que jovens aspirantes a actores manifestem ignorância e desprezo relativamente à história clássica do cinema e às suas referências. Mais: a fazer fé nestas declarações, parece que os jovens procuram apenas fama fácil no mundo do estrelato e vedetismo de Hollywood, como que imbuídos da "cultura" de séries juvenis como a inócua e superficial "Morangos Com Açúcar". O talento e a criatividade não se coadunam com esta demanda da fama.
É como se estudantes de música portugueses que frequentassem a Berklee College of Music (Boston), a mais prestigiada escola de música dos EUA, viessem dizer que "queremos ser músicos famosos, adoramos ouvir música mas não percebemos muito da sua história. Música mais antiga e antiquada é para esquecer e sobre a música que se faz em Portugal sabemos zero. Os nossos músicos de referência são David Guetta, Pablo Alborán e Bruno Mars."

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Plano Nacional de Cinema

Afinal, não são apenas más notícias que assolam Portugal: o Plano Nacional de Cinema, um projecto para promover a criação de novos públicos a partir das escolas, será apresentado na próxima sexta-feira, na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa. O Plano Nacional de Cinema será uma iniciativa conjunta da tutela da Cultura com o Ministério da Educação, com o objectivo de introduzir nos planos escolares listas de filmes para os alunos verem.
Esta iniciativa vai ao encontro da legislação que refere que o "Estado promove um programa de literacia para a cinema junto do público escolar para a divulgação de obras cinematográficas de importância histórica", em particular, filmes portugueses.
Em Março, numa visita a uma escola, Francisco José Viegas equiparou o Plano Nacional do Cinema ao actual Plano Nacional de Leitura, que existe para estimular os hábitos de leitura dos estudantes. O objectivo é que os estudantes do ensino básico e secundário melhorem a sua cultura cinematográfica e "percebam que o cinema não começou há cinco anos, começou há cem anos. Nós precisamos de criar públicos, este é o essencial da nossa acção, em termos de política cultural que é insistir no factor educação", defendeu na altura do secretário de Estado.
Segundo dados da SEC, em Portugal há uma reduzida adesão de público ao cinema português: 1,9 por cento, em 2010, e 0,7 por cento, em 2011, quando a média europeia, em 2010, foi de 11,6 por cento.
Durante o presente ano lectivo, o Plano Nacional de Cinema vai decorrer num modo experimental em escolas previamente escolhidas do país. Se a conclusão deste projecto for positiva, certamente que para o ano será alargado a toda a restante rede escolar. Falta agora saber quais serão os filmes destinados aos alunos e que planos pedagógicos complementares serão anunciados. Seja como for, é deveras um passo importante que o actual Governo está a dar para a inclusão do cinema na escola como veículo cultural, artístico e educacional.

sexta-feira, 18 de março de 2011

António Lopes e o seu sonho


Quem frequenta um curso de cinema sabe que esta arte necessita de dinheiro para ser concretizada na prática. Os jovens estudantes e futuros realizadores têm conhecimento das dificuldades que terão pela frente. Mas talvez não contassem que essas mesmas dificuldades surgissem ainda durante a frequência do próprio curso. Devido aos constrangimentos económicos das Universidades, fazer pequenas experiências de cinema em Portugal, mesmo nos cursos especializados, torna-se cada vez mais difícil.
Que o diga o jovem António Lopes, finalista do curso de cinema da Universidade da Beira Interior (Covilhã), que se viu limitadíssimo com o escasso orçamento que aquela instituição de ensino superior lhe atribuiu para realizar uma curta-metragem de final de curso. Visto que os valores para levar a cabo esse projectoeram quase irrisórios, António Lopes não desistiu e procurou apoios diversos e recorreu à Internet com o objectivo de angariar fundos para o seu filme, lançando uma campanha para receber donativos voluntários.
Quem quiser ou puder contribuir, o António Lopes agradecerá com humildade. Mais a mais porque o título do seu filme é "Vendedor de Sonhos", e António está a fazer tudo para concretizar o seu sonho de realizar a curta-metragem e de se tornar realizador de cinema.
Boa sorte, António.

sábado, 9 de outubro de 2010

Portugal: a corda a rebentar

Passei pelo Público online e fiquei deprimido com algumas notícias que li:
- "Cortes nos salários levam médicos espanhóis a abandonar o país".
- "FMI avisa que Portugal será a pior economia da UE em 2015".
- "PSD prepara chumbo do orçamento e adensa-se cenário de crise política".
- "Taxa de desemprego vai subir ainda mais do que na Grécia".
______
O futuro - o ano de 2011 e não só - afigura-se negro para Portugal. A situação económica vai de mal a pior, afectando gravemente o nível de vida, a produtividade e a... criatividade. É que só se tem falado do impacto que a grave situação económico-financeira nacional está a ter na Função Pública (a classe mais sacrificada) e no funcionamento de vários organismos do Estado. E a cultura? O apoio aos jovens artistas e criadores? O financiamento à gestão dos equipamentos culturais do país? Com os cortes e as medidas de austeridade (que não vão parar por aqui!), o funcionamento das estruturas culturais e de criação artística em Portugal vai ser fortemente abalado.
Dos 15 Ministérios do actual Governo e do Orçamento de Estado para 2010, a verba mais baixa foi atribuída ao Ministério da Cultura. Tem sido assim todos os anos com o Governo de José Sócrates: a cultura é sempre o parente pobre do investimento público do Estado. Não é entendido como um factor de desenvolvimento do país. O orçamento para a Cultura é de 235 milhões de euros, mas subiu em relação a 2009 - uns inexpressivos 0,4% - uma estratégia que serviu para calar os críticos e fazer a afirmação populista que o orçamento "aumentou". Mas a verdade é que se tratou de um valor que nem dava para pagar uma parcela das despesas hercúleas de uma grande obra pública como o TGV ou um novo aeroporto. E é neste contexto que o país é gerido pelos governantes: sem uma estratégia de desenvolvimento sustentado, com despesismo chocante em obras e ordenados públicos astronómicos, com hipócritas pedidos de sacrifício aos mais carenciados, com uma visão política enevoada e de curto alcance acerca da cultura e da educação, etc.
Como refere o ex-Ministro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, é necessário uma profunda reforma do pensamento político, novos ideias em cima da mesa. Caso contrário, este país vai estar a saque não tarda muito...

sexta-feira, 20 de março de 2009

A educação pelo cinema - agora em livro


Há quase um ano escrevi sobre o peculiar caso de um pai que educou o filho com recurso aos filmes porque este tinha deixado a escola. Esse relato pode ser lido aqui. Entretanto, leio na edição online do jornal espanhol El País que esse caso resultou em livro. O título é "Educado pelo Cineclube" e conta a incrível experiência de David Gilmour que educou o filho Jesse com filmes de Frank Capra, Luís Buñuel, David Cronenberg ou Oliver Stone. O livro está traduzido em 13 línguas. Esperemos que uma delas seja a portuguesa.
Para ler a reportagem na íntegra, ver aqui.

segunda-feira, 2 de março de 2009

Educação da imagem


O realizador alemão Wim Wenders passou pelo Festival Fantasporto e concedeu uma interessante entrevista à agência Lusa, na qual afirmou que "a doença do nosso tempo é a falta de tempo". Ora, Wenders não disse nada de novo, mas o que disse não deixa de ser uma afirmação certa e verdadeira (tal como também explanei aqui). A velocidade frenética dos tempos actuais não deixa respirar o indivíduo ao ponto de usufruir, plenamente, da vida.
Outra declaração pertinente que li dessa entrevista de Wim Wenders é a que diz: "Vivemos num mundo regido por imagens, há que ensinar às pessoas a distinguir o trigo do joio". Nem mais. Uma sociedade na qual a "verdade das coisas" parece residir unicamente no poder da imagem (e das suas diversas configurações), massificada e global, torna-se urgente levar a cabo uma séria "educação da imagem". Educação que deveria constar desde a mais tenra idade das crianças, numa área disciplinar que deveria prosseguir ao longo dos anos e lhes desenvolvesse o espírito crítico perante a vasta e contraditória cultura visual contemporânea. Uma educação que educasse o olhar, a interpretação, a capacidade de identificar a imagem de "boa qualidade" da "má qualidade". Encaro esta educação da imagem de forma abrangente (no fundo, trata-se de comunicação visual), a qual passaria pela exploração da história da pintura, do cinema, da fotografia, da televisão e de outros meios tecnológicos modernos de veiculação de imagens (e suas mensagens).

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Livro - futuro incerto


O questionário não tem carácter científico, mas tem um significado próprio: o jornal espanhol El País lançou a pergunta - "Crê que o livro digital irá superar o papel a médio prazo?". Num total de 1600 votantes, 35% acredita que sim, e 64% que não. No entanto, a mesma edição online publica um artigo, a propósito da abertura, hoje, da maior feira do livro do mundo, a Feira do Livro de Frankfurt, em que se assegura que 1000 profissionais do mercado livreiro de 30 países acreditam que daqui a dez anos (2018), o livro em papel será suplantado por diversos formatos e suportes digitais de informação escrita - audiolivro, e-books, DVDs e leitores digitais, como o cada vez mais popular Kindle da Amazon ou o da Sony (na imagem). Como complemento a esta estimativa, 40% dos inquiridos da Feira garantem que o acontecimento no mundo do livro mais importante dos últimos 60 anos foi o "boom" da venda de livros pela internet, que baralhou dramaticamente as regras do mercado de venda de livros a nível global.
Como modesto leitor, e apesar da minha crença nos benefícios que a cibercultura acarreta para a evolução da sociedade, sou da opinião que o objecto livro dificilmente algum dia possa vir a desaparecer. O mercado dos formatos digitais de livros irá crescer e implementar-se nos hábitos de milhões de consumidores em todo o mundo, isso é certo (e cada vez mais nas futuros gerações); mas conviverá, de forma pacífica, com o formato livro tradicional. Não concebo uma livraria ou biblioteca, daqui a 50 ou 100 anos, apenas com formatos digitais expostos nas prateleiras (se é que vai haver exposição destes formatos), em substituição total do objecto físico e cultural que é o livro. Caso contrário, o conceito de biblioteca iria mudar radicalmente. Mas com a febre das novas tecnologias (veja-se o caso do computador português "Magalhães) introduzidas nas escolas e nos hábitos de trabalho dos estudantes de todos os níveis de ensino, vislumbro que o futuro não seja muito animador para a sobrevivência do livro como objecto de consumo cultural. A indústria do livro a nível mundial terá de se adaptar aos novos hábitos de consumo digital e encontrar soluções de compromisso para que Gutenberg não dê voltas no túmulo por causa da eventual morte de um objecto que inventou e que mudou o mundo.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

20 horas de Beethoven e resolve-se isso


Isto só mesmo na terra do Tio Sam podia acontecer: uma juíza condenou um fã de hip-hop a ouvir 20 horas de Beethoven por este ouvir música demasiado alta no seu carro. O pobre rapaz só conseguiu ouvir 15 minutos do compositor clássico, preferindo pagar a multa. A notícia está no site do Blitz. A juíza justificou a condenação porque "penso que muita gente não gosta de ser forçada a ouvir música, mas acreditava que esta experiência o fizesse abrir horizontes". Esta é uma afirmação interessante que dá que pensar. Ou seja: como é que a juíza podia pensar que, obrigando um adolescente fã de hip-hop a ouvir compulsivamente Beethoven, este poderia vir a gostar do compositor? A senhora juíza, provavelmente, é admiradora de música clássica e abomina hip-hop. Se fosse submetida à mesma experiência - ouvir 20 horas de hip-hop - "abriria os horizontes" ao ponto de se tornar fã de De La Soul ou Busta Rhymes?
É mais do que sabido que o desenvolvimento do gosto cultural de um indivíduo em geral, e do gosto musical em particular, não pode ser incutido a ferros e num curto período de tempo (mais a mais, como forma de castigo). É um processo que exige maturação, aprendizagem e aceitação voluntária dos estímulos musicais. Teria sido bem mais pedagógico e educativo se a juíza tivesse enviado o prevaricador para uma escola de música clássica - aí iria ter contacto com professores e alunos, métodos de ensino, audições instrumentais, aulas da história da música, que poderiam abrir os tais horizontes.
Ou então, como medida radical, a juíza poderia ter optado pelo método utilizado no filme "A Laranja Mecânica" (1971) de Stanley Kubrick, no qual o delinquente Alex é submetido a sessões compulsivas de visionamento de imagens violentas, num processo de ultra-saturação psicológica que o levou a repudiar os seus próprios actos violentos. Deste modo, em vez de Beethoven, o jovem teria de ouvir 20 horas de... hip-hop.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

A violência num país sereno e desenvolvido


O que motivou o jovem finlandês Matti Saari (na imagem) para chacinar, indiscriminadamente, 10 colegas a tiro? Provavelmente, a mesma motivação que levou o estudante Pekka-Eric Auvinen a matar 8 colegas, há apenas 10 meses atrás, também numa escola finlandesa. Provavelmente, a mesma motivação que levou ao massacre no Virgina Tech há um ano e meio. Sem querer fazer o papel de psicólogo social, porventura, uma motivação que deriva de vários factores conjugados: paixão exacerbada por armas de fogo e pela violência dos videojogos, maior susceptibilidade às mensagens das bandas de rock gótico, propensão para pensamentos auto-destrutivos, etc.
A pergunta essencial passa também pelo contexto social em que ocorreu (pela segunda vez em menos de um ano) este massacre. Num país com altíssimos índices de desenvolvimento e de qualidade de vida económica e social, cujo sistema educativo é referência mundial, como se explicam actos tresloucados como este? Poderá o bem-estar social e a abundância financeira gerar tamanho mal-estar interior num indivíduo? Será esta uma sociedade na qual não existem outros valores senão os paradigmas do ultra-consumismo e do ultra-materialismo? Que Finlândia é esta cuja primeira causa de morte dos jovens entre os 20 e 24 anos é o suicídio? Uma sociedade quase isenta de criminalidade e delinquência, mas cujos dois recentes massacres obrigam a repensar que juventude é esta que mata e se mata. Uma sociedade da opulência material mas vazia, desorientada e sem ideais de vida.
No Público de hoje, pode-se ler um perturbante depoimento de uma cidadã finlandesa sobre a sociedade finlandesa e que pode explicar (em parte), este segundo caso de extrema violência na terra da Nokia: “Acho que estamos a viver bem demais. Em tempos de guerra, as pessoas entreajudam-se e têm um propósito de vida. Nos tempos actuais, os finlandeses não têm desafios, nem nada por que lutar.”

domingo, 29 de junho de 2008

O fantasma de Salazar


No passado dia 27 passou mais um aniversário da morte de António Oliveira Salazar, esse lúgubre timoneiro da pátria durante 40 obscuros anos da vida portuguesa. Como professor, lido com muitas crianças e jovens. E ano após ano, quase sempre por ocasião do 25 de Abril, tenho-me deparado que as novas gerações revelam mais desconhecimento e ignorância perante o Portugal salazarista e do Estado Novo (e esta constatação não advém apenas da preocupação recentemente veiculada pelo Presidente Cavaco Silva). A última vez em que pude constatar mais um flagrante exemplo de ignorância dos jovens perante o período do Estado Novo e da figura de Salazar, foi no dia 27 de Maio. Nesse dia, o Café Concerto do TMG recebeu o músico e cantor Pedro Abrunhosa para uma conversa numa tertúlia informal (moderada por mim). Durante uma hora e meia, os temas da conversa foram variados (de música à política) e sempre objecto de uma análise acutilante por parte de Pedro Abrunhosa.
Goste-se ou não da sua música (e eu não gosto) ou da sua imagem (e eu não gosto), a verdade é que Abrunhosa revela um discurso fluente, assertivo e pragmático - com opiniões próprias. Considera que as suas opiniões são quase sempre inconvenientes e inconformadas, fruto da sua formação política adquirida ainda muito jovem (foi no 25 de Abril, quando o cantor tinha 13 anos, que a sua consciência social e política desabrochou). Pedro Abrunhosa confessou-se desiludido com a classe política, com o estado débil da democracia e com o conformismo da sociedade portuguesa perante os problemas crescentes. Considera que os políticos deveriam ouvir o que têm para dizer os artistas (filósofos, músicos, escritores), visto que encontra na arte o último recurso para desvendar novas soluções para os problemas da sociedade. Defende ainda que o papel da arte deve ser o de subverter e o de inovar, de modo a alargar os horizontes culturais, ideológicos e estéticos da população.
E onde se encaixa o tema de Salazar neste contexto? Aqui: num determinado momento da conversa, Abrunhosa disserta sobre o panorama político, soltando as mais rudes críticas à actuação dos políticos perante uma depressiva situação social e cultural do pais. Num dado ponto do seu discurso, refere o estado lastimoso a que chegou a educação e a gritante ausência de coordenadas políticas no sector cultural. Quando os espectadores da tertúlia puderam intervir formulando perguntas ao cantor, houve uma jovem estudante (do secundário ou superior, não posso precisar) que fez a seguinte pergunta (cito de memória): "o Pedro Abrunhosa disse que a educação em Portugal está má e que isso se deve ainda à herança de Salazar; mas não concorda que Salazar era um maior defensor da educação e da cultura do que os actuais políticos?". Pedro Abrunhosa respondeu peremptoriamente que não concordava, e passou a explicar porquê, dando uma autêntica aula de história de Portugal à jovem. No fundo, explicou o óbvio a uma estudante que ignorava os factos ou fazia de conta que os desconhecia: referiu porque é que o ditador do antigo regime era um político amarrado no tempo, avesso ao progresso, retrógrado nas ideias, ultra-conservador e responsável pelo atraso cultural, educativo e social de um povo aprisionado na trilogia dos três F’s defendida por Salazar: Fátima, Futebol e Fado.
Não sei se este caso desta aluna reflecte a realidade geral dos jovens, mas a verdade é que grassa muita ignorância sobre os valores perniciosos do regime fascista e sobre as conquistas da Revolução de Abril. Culpa das escolas? Dos políticos? Dos jovens que vivem afanosamente o presente e desprezam a história do passado recente? Da contra-informação disponível na net que legitima a figura fascista do "Obreiro da Pátria"? É que basta entrar neste site para ficar, seriamente, assustado (o desvario vai ao cúmulo de se lançar um abaixo-assinado para substituir a designação de ponte 25 de Abril por ponte Oliveira Salazar!).

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A educação: Finlândia e Portugal


No jornal da RTP, a propósito dos exames escolares, vejo uma reportagem sobre uma conferência internacional em Lisboa cujo tema principal é a educação nos países desenvolvidos. Nessa conferência estavam representantes de vários países cujos sistemas de educação constituem um modelo de sucesso a nível mundial. Não apenas no aspecto estatístico (como parece ser a obsessão do Ministério da Educação português) mas também numa perspectiva do próprio sistema de ensino-aprendizagem, da qualidade do mesmo, da relação professor-aluno, da qualidade dos equipamentos escolares, etc.
Como não podia deixar de ser, a Finlândia, país considerado o mais evoluído em termos de educação, fez-se representar. Questionado pelo jornalista de serviço sobre quais as reais razões do sucesso educativo no país nórdico, o representante da Finlândia argumentou que é por causa da alta qualificação dos professores e do acompanhamento - desde o ensino primário (1º Ciclo do Ensino Básico em Portugal) - de alunos com dificuldade. Ouvi e achei a explicação demasiado simplista. Portugal também tem bons e qualificados profissionais de educação (também tem maus, é verdade, como em todas as profissões) e as crianças também têm um acompanhamento pedagógico desde que ingressam na escola. Ora, a realidade é que no sistema de ensino português continua a haver um elevado índice de abandono escolar, insucesso escolar, desmotivação profissional na comunidade educativa (alunos, professores e funcionários). Um abismo separa a Finlândia e Portugal em todos os índices de desenvolvimento. É impossível explicar o sucesso do modelo educativo da escola finlandesa apenas com os dois critérios apontados. É toda uma política diferente que está em jogo, uma filosofia de ensino que incentiva a criatividade, o empenho e o trabalho dos alunos. Os equipamentos escolares são muitíssimo mais bem apetrechados e organizados, possuem mais recursos, mais dinheiro, mais qualificação especializada, entre muitos outros aspectos que incutem dinâmica ao sistema. Para além disso, não esqueçamos um ponto fulcral: a Finlândia é um dos países mais desenvolvidos do mundo, onde o investimento na cultura, na vertente social, na educação, são traves mestras de toda uma sociedade.
Mesmo que Portugal conseguisse, a partir de hoje mesmo, implementar os mesmos critérios finlandeses de desenvolvimento, só daqui a duas ou três gerações é que teríamos resultados visíveis. Daí que o atraso português no domínio da educação é de várias décadas comparativamente com a Finlândia. Só.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Como disse?

Leio e esfrego os olhos. Releio para ver se percebi bem. Perante o espanto, dou a ler à pessoa ao meu lado para ver se tem a mesma interpretação que eu. Ambos concordamos na análise: "que disparate é este?". Na capa da revista "País Positivo" do jornal Público, vem inscrita a seguinte frase de Helena Pereira, vice-reitora da Universidade Técnica de Lisboa: "As universidades são hoje reconhecidas como fontes de saber e de investigação".
É uma afirmação disparatada à La Palisse ou é assumida como verdadeira? Ou seja: se as universidades nunca foram (só o são agora, reconhece a vice-reitora) fontes de saber e de investigação, então algo de muito errado existe na concepção de educação e dever das instituições de ensino superior!

sexta-feira, 30 de maio de 2008

O cinema pedagógico de Buñuel


No mundo académico são habituais as teses sobre pensadores, cientistas, filósofos, escritores, investigadores. O que já não é muito habitual é haver estudiosos que dediquem o objecto da sua investigação a um cineasta em particular, menos ainda, a um cineasta tão particular como o espanhol Luís Buñuel. Foi o que fez o professor Vítor Reia-Baptista, na altura na Universidade do Algarve. O título da tese de mestrado, escrita em inglês, é certeiro e pragmático: “The Heretical Pedagogy of Luis Buñuel - A Study of the Pedagogical Character of the Heresies and Moralities in the Cinema of Luis Buñuel”. Nunca me teria lembrado de olhar o cinema de Buñuel pela perspectiva pedagógica (ainda que heréitca), pelo que esta tese publicada na Biblioteca On-Line de Ciências da Comunicação da Universidade da Beira Interior se torna interessante de ler para os estudiosos do cinema e para meros curiosos na obra de um dos mais provocadores realizadores de sempre. Ler aqui a tese.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

A importância do desenho


Fernando Lemos, pintor surrealista, artista gráfico, fotógrafo e poeta português emigrado no Brasil desde 1953, deu uma entrevista ao Jornal de Letras. A dado momento, faz esta observação: "O desenho está em tudo. A escrita é feita de palavras, as palavras e as letras de desenho. O desenho escreve, inventou as letras para se exprimir. Uma das grandes falhas na educação é não se obrigar as crianças a desenhar na escola, tal como se escreve. É a mesma coisa, sendo que o desenho é uma linguagem universal. Quando ouço alguém a dizer 'desculpe mas não sei desenhar', é como se dissesse, 'desculpe, mas sou analfabeto".
Descontando o tendencioso exagero da afirmação, convenhamos que o pensamento do artista faz muito sentido num sistema de educação que não valoriza a expressão individual, a criatividade e, em última análise, o sentido estético e a arte.

sábado, 10 de maio de 2008

E não se podem exterminar?


- Chega de "ef-erre-ás" e "xi-ri-bi-tá-tá-tá-tás!
- Chega de capinhas, fatinhos, sainhas e chapéuzinhos!
- Chega de Quim Barreiros e Xutos e Pontapés!
- Chega de pimbalhada e boçalidade!
- Chega de falso espírito académico!
- Chega de guerrinhas histéricas entre cursos!
- Chega de comas alcoólicos e bebedeiras hercúleas!
- Chega de figuras tontas e deprimentes!
- Chega de pretensa superioridade académica!
- Chega de serenatinhas e tunazinhas irreverentes!
- Chega de associações académicas inúteis!
- Chega de universitários ignorantes e mal-educados!
- Chega de festas académicas previsíveis e repetitivas!
- Chega, chega, chega!