Há dias, a mítica ponte Golden Gate de São Francisco comemorou 75 anos de existência. Houve festa, comemorações oficiais e foguetes pela celebração de uma das Sete Maravilhas do Mundo Moderno. Mas houve também espaço para recordar a macabra fatalidade que esta ponte transporta: a altíssima taxa de suicídios (até à data, foram 1558 e muitas outras tentativas).
Sobre o fenómeno dos suicidas da ponte Golden Gate existe um notável documentário intitulado "A Ponte" (2006) de Eric Steel. O que leva tanta gente desesperada a cometer suicídio deitando-se abaixo de uma das pontes mais belas do mundo? Que fascínio mórbido é este? E porque é que as autoridades não tomam medidas preventivas que possam diminuir drasticamente esta estatística doentia? O documentário não dá respostas a nenhuma destas questões. Nem pretende fazê-lo. O que faz é mostrar, friamente, o fenómeno suicida na ponte de São Francisco, sem interpretações morais, éticas ou políticas.
Steel filmou durante um ano (2004) a ponte 24 horas por dia, captando os 23 suicídios dos 24 ocorridos naquele ano. Uma média de um suicídio a cada 15 dias (fora as tentativas). O realizador mostra a morte como se fosse em directo, num registo de voyuerismo mórbido que em nada anula a carga de dramatismo da matéria filmada. Complementarmente, Eric Steel entrevista familiares e amigos dos suicidas, tentando compreender as motivações, as personalidades, o porquê. Aí ficamos a saber que a maior parte dos que se suicidam sofrem de depressões e que a taxa de sobrevivência da queda na água é baixíssima (o documentário dá conta de um pungente testemunho de um jovem sobrevivente).
Dos vários casos relatados no filme, o que mais me impressionou é o de Gene Sprague: um jovem, vestido todo de negro, cabelo comprido, óculos escuros, encontra-se encostado à grade da ponte. Olha para um lado e para o outro. O vento forte agita-lhe os longos cabelos. Senta-se na grade durante uns momentos. De um instante para o outro, Gene coloca-se de pé na grade e lança-se hirto de costas para o rio. A sua queda até à morte demorou 4 segundos, a 100km/h:
As autoridades referem que colocar uma vedação mais alta no tabuleiro da ponte iria danificar a estética da obra, para além de significar o investimento de milhões de dólares. Enquanto isso, dezenas de homens e mulheres, vindos de todos os pontos da América, continuam a deslocar-se até à ponte Golden Gate para pôr fim trágico às suas vidas (uma média de 30 suicídios por ano e muitas mais tentativas).
"A Ponte" é um filme forte, sem concessões, que alerta para um drama social de proporções grotescas. É um documentário que apela ao mais íntimo do ser humano, à nossa consciência e ao nosso espírito.
"A Ponte" é um filme forte, sem concessões, que alerta para um drama social de proporções grotescas. É um documentário que apela ao mais íntimo do ser humano, à nossa consciência e ao nosso espírito.