O Homem Que Sabia Demasiado - A sua reputação como cineasta é enorme, apesar de só ter realizado 8 longas-metragens. Como explica este facto?
Leni Riefenstahl - Bom, o meu percurso foi bastante longo, de cerca de sete décadas, mas estive muitos anos sem filmar depois do fim da Segunda Guerra Mundial. Fiz os meus filmes sobretudo entre 1932 e 1945, depois do fim da Guerra, como sabe, tive imensos problemas para desenvolver os meus projectos.
O Homem Que Sabia Demasiado - A que se deveram, no seu entender, esses problemas?
Leni Riefenstahl - Basicamente, por causa da minha ligação a Adolf Hitler e os dois filmes que fiz para o regime Nazi: "O Triunfo da Vontade" (1934) e "Olympia" (1938). O mundo inteiro acusou-me de colaboradora do regime hitleriano, mas isso não é bem verdade. Apesar do que se diz, não fui eu que ofereci os meus serviços como realizadora a Hitler. Ele é que me convidou depois de ter visto o meu primeiro filme, "A Luz Azul" (1932). Eu ainda declinei, sugerindo que fosse convidado um grande realizador alemão, Walter Ruttman, mas Hitler insistiu que fosse eu e, como estava ansiosa de trabalhar num grande projecto, resolvi aceitar. Como aconteceu a muita gente, eu fiquei fascinada quando ouvi o poder de oratória do Kaiser, e era difícil resistir ao seu incrível magnetismo. Nos anos em que fiz os filmes, desconhecia ainda as atrocidades cometidas contra os Judeus. Pode-ma chamar de ingénua, mas foi isso que aconteceu.
O Homem Que Sabia Demasiado - Acha justo que critiquem os seus filmes pela inevitável propaganda política mas que os elogiem, ao mesmo tempo, pela sua inovadora linguagem estética e formal?
Leni Riefenstahl - Sim, não me importo que as pessoas façam essa análise. Tive muitos meios técnicos ao meu dispor para filmar a convenção Nazi de Nuremberga e por isso inventei novos enquadramentos, novos movimentos de câmara, novas formas de montar as imagens.
O Homem Que Sabia Demasiado - Muitos anos depois, na década de 70, desiste do cinema e torna-se fotógrafa, fazendo reportagens nas tribos do Sudão.
Leni Riefenstahl - Desisti do cinema porque achava que já tinha tido as experiências estéticas que me realizaram. E como senti sempre obstáculos e boicotes para continuar a filmar por causa da minha alegada simpatia com o Nazismo, então experimentei a fotografia, uma outra arte nobre e extremamente gratificante. E com 80 anos descobri outro prazer único: a fotografia submarina! Em 2002, quando fiz 100 anos de idade, realizei um documentário sobre esse fascinante mundo subaquático.
O Homem Que Sabia Demasiado - O seu percurso artístico é indissociável do percurso político do regime Nazi e de Hitler. Há pouco tempo, o estilista John Galliano disse que simpatizava com a figura de Hitler; ontem o realizador Lars Von Trier, referiu que compreendia Hitler e se sentida nazi. A que se deve este fenómeno de "empatia" com uma figura tão terrível da hstória?
Leni Riefenstahl - É difícil explicar, ainda mais para mim, que vivi todos aqueles anos loucos e frenéticos na Alemanha de Hitler. Não creio que Hitler seja citado por ser uma personalidade cruel e responsável por milhões de mortes. Creio que é referenciado porque existe uma total ausência de liderança política na Europa e Hitler, para o bem e para o mal, encarnou um líder carismático, determinado, seguro e com grande poder de fascínio junto das populações. Se houvesse um líder político europeu actual com estas características, mas sem a brutal carga maléfica que lhe é atribuída, talvez as pessoas se esquecessem rapidamente que Hitler existiu.