segunda-feira, 30 de junho de 2008

Nova realidade, novas formas de consumo


É mais um exemplo de como se pode contornar a crise discográfica que afecta editoras e artistas. No programa "Câmara Clara" (RTP2) de Paula Moura Pinheiro, a fadista Aldina Duarte explicou como teve de sair da editora EMI e arriscar para investir numa editora com vista à edição dos seus próprios discos. Apesar desta solução não ser inédita, não deixa de configurar um investimento deveras arriscado para os tempos que correm. Ou seja, a edição de autor afigura-se como uma das vias possíveis para a sobrevivência dos músicos, uma vez que as editoras arriscam cada vez menos (ou praticamente nada) em artistas que não assegurem lucros mínimos. A cibercultura e seus novos hábitos de consumo alteraram profundamente as regras do jogo.
O panorama está de tal ordem que acredito ser uma questão de tempo até que o suporte físico (CD) se extinga para dar lugar a uma nova forma de consumo cultural. E essa nova modalidade de consumo só pode passar pela imaterialidade do objecto físico, isto é, a internet vai passar a ser o meio tecnológico de compra directa de discos e filmes (livros são outra matérias distinta, mas a ver vamos...). As editoras discográficas, durante décadas imprescindíveis, vão deixar de ser importantes como mediadoras do processo editorial. Por isso, os concertos vão ser (são já) uma das mais importantes fontes de rendimento para o músico. Não digo nenhuma novidade, sei-o bem, mas tenho reparado que ainda existe muita gente descrente nesta possibilidade do consumo cultural passar a ser feito, exclusivamente, por via virtual (internet), sem mais nenhum formato físico e material (supremacia do ficheiro mp3) .
Apesar dos recorrentes movimentos nostálgicos e resistentes em redor do culto do vinil e do CD, a verdade é que os sinais do mercado apontam para um processo irreversível de extinção dos mesmos (ou pelo menos, de redução dos objectos a uma expressão residual). Não defendo que seja bom ou mau, sou dos que aprendi a gostar de música (também) pelo lado fetichista do objecto, pela capa dos discos de vinil, das gravações em cassetes áudios e da compra de CDs. Só que a velocidade da sociedade da informação digital e as mudanças que esta acarreta para todos nós, dita leis que alteram os hábitos culturais.

1 comentário:

Anónimo disse...

Victor,
Este post é muito interessante pois relança uma discussão que deveria estar mais activa. A minha posição sobre o assunto mudou ao longo dos recentes anos e vou explicá-la de modo muito breve. Quando começou a mania do mp3 eu apreciei e vi na internet e nas borlas o el dourado comercial, que potenciaria a divulgação de artistas underground que, de outro modo, nunca poderiam viver da música. Acontece que a internet não revelou ser o el dourado esperado e por uma razão. A internet passou a viver da publicidade. Hoje em dia basta clicares num spot publicitário, mesmo sem comprares nada e alguém está a encher os bolsos com isso. Ora, artistas mainstream como os Radiohead podem dar-se ao luxo de oferecer o seu disco e cada consumidor só paga o que quiser. Como os Radiohead são conhecidos à escala planetária, basta que 1000 consumidores paguem 1€ e vê lá quanto estão já a ganhar os músicos. Mas tu se quiseres colocar o teu disco à borla dificilmente alguém vai pagar 1€. Acontece que tu não podes viver da tua arte e os Radiohead sim. Só a publicidade paga as suas vidas. Mas que publicidade vai pagar a tua vida? Ora, poderias dizer que nunca viverias da tua música, mesmo sem a internet. Isso é verdade. Acontece que o sistema de borlas da internet prejudica gravemente os pequenos criadores e engrandece ainda mais os criadores estabelecidos. É assim que a internet passou a estar dominada por somente 4 ou 5 gigantes. O caso da Google é sintomático. Em troca de Spam e publicidade, lixo atrás de lixo publicitário, dão-te tudo, oferecido de mão beijada, para que sejas tu o criador à borla dos conteúdos, com blogs, músicas nos my spaces entre outros.. e isto é uma espécie de nova escravatura em que os criadores trabalham de borla para os gigantes. Um pequeno criador ou trabalha de borla ou então está literalmente tramado e tem de ser jardineiro e criador nas hras vagas, ao passo que os grandes estão protegidos pelos lucros astronómicos da publicidade. É um pouco o que se passou com a TV generalista. Ela é o que é, uma miséria, pois teve de se vender à publicidade para a poderes ter de borla em tua casa. As coisas tem todas um preço e o preço da borla é sempre o lixo publicitário, a sociedade do espectáculo. Eu não estou aqui a defender que a internet é a causa da decadência de uns. Só estou a defender que é uma ilusão pensar que as coisas quando são gratuitas, são mais livres, porque fogem aos esquemas capitalistas. Isso é pura ilusão. Creio que em Portugal temos um problema muito particular pois já vivemos alguns luxos culturais, mas continuamos a pensar que o trabalho artístico e intelectual deve ser gratuito, uma ideia socialista que tem um alto preço a pagar: o desaparecimento precoce dos artistas e intelectuais. Esta gente não vive do ar que respira, precisa de ganhar dinheiro como todos nós e se o seu trabalho fosse pago muitos dos pequenos artistas poderiam viver do seu produto artístico e intelectual. É uma questão de mentalidade e ilusão psicológica, esta de pensarmos que a arte deve ser gratuita. A realidade, como disse o Abrunhosa no debate que moderaste, é que não precisamos de arte para matar a fome, mas precisámos dela para evoluirmos como civilização, cultura e, por conseguinte, sair dos marasmos económicos.
abraço