quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Filmes - legendar ou não


Ao fazer zapping pelos canais de televisão, passei por um canal espanhol. Estava a passar o filme “Pearl Harbour”. O filme é dispensável (quanto a mim), mas nem foi isso que me chamou a atenção. A questão é que o filme era dobrado em castelhano, coisa a que já não estava acostumado há muitos anos. Devido ao facto de viver junto à fronteira espanhola, habituei-me quando era miúdo a ver filmes nos canais televisivos espanhóis, sobretudo aos sábados à tarde (grandes westerns eu vi pela primeira vez nessas sessões). Espanha possui, há muitos anos, uma verdadeira indústria de dobragem de filmes estrangeiros, com actores profissionais que se dedicam quase em exclusivo a este negócio (é uma arte, mas também um negócio). Os defensores das dobragens de filmes de língua estrangeira garantem que é uma forma de salvaguardar a língua e a cultura nacionais. É e não é.
A legendagem também promove o exercício da leitura e, acima de tudo, respeita a integridade artística inerente ao trabalho dos actores, dado que a voz de um actor representa um elemento preponderante, e por vezes essencial, da sua interpretação. Por outro lado, quando via filmes na televisão espanhola, era frequente conhecer as vozes dos actores espanhóis que dobravam estrelas de Hollywood. E não era raro deparar-me com um filme em que o mesmo actor que dobrava Marlon Brando, dobrava também Chuck Norris. Felizmente que em Portugal a legendagem vingou em detrimento da dobragem (esta só se aplica, e bem, a filmes infantis), fenómeno que já vem do tempo do Estado Novo (é estranho como Salazar não optou pela imposição da dobragem, já que era tão defensor dos valores conservadores da cultura nacional). Em Espanha a tradição dos filmes dobrados continua em força, mesmo nas estreias na sala de cinema – são poucos os filmes em exibição na versão original. A dobragem, por melhor que seja feita, acaba sempre por desvirtuar a arte da interpretação e torna-se irritante ver continuamente a dessincronia entre a expressão labial e a fala. Ao fim e ao cabo, será que tem o mesmo efeito ouvir Robert Duvall dizer no “Apocalypse Now” a célebre afirmação “You smell that? Napalm, son. Nothing else in the world smells like that. I love the smell of napalm in the morning” em inglês, em castelhano, em francês ou em mandarim?

5 comentários:

Shelyak disse...

Só de pensar o Humphrey Bogart, especialmente no Casablanca, falando em espanhol, até dá arrepios... Como é possível reproduzir uma voz como esta (para não falar de outras) ?
Acabámos por ter sorte, em Portugal...

Anónimo disse...

a propósito deste post e também do comentário deixado pelo Shelyac, recordo sempre que se fala em dobragem e legendagem, da emoção e até diria da comoção que alguns dos meus melhores amigos alemães tiveram quando, com quase 30 anos de idade, escutaram pela 1ª vez em minha casa a voz original de Humphrey Bogart em Casablanca, de John Wayne em Rio Bravo e até a de Marylin Monroe em "Men prefer blondes".
E, quem terá a "coragem" de dobrar Laureen Bacall na célebre frase: " do you how to smoke? Just put your lips together and...blow"?
abraços
jPinto

Unknown disse...

Bem lembrado.
Dezenas de outros exemplos (com grandes actores e frases célebres) poderiam ser referidos.
VA

Anónimo disse...

Já para não falar de que ao ouvirmos os filmes na língua original aprendemos, de forma consciente ou não, essa língua.

amebix disse...

O Salazar não optou pela dobragem devido a condicionamentos monetarios,ja Espanha tem que se queixar de Franco que optou pela dobragem como forma mais cara,mas mais segura de controlar e mudar as mensagens dos filmes