domingo, 19 de abril de 2015

Uma obra-prima redescoberta



Um dos melhores filmes que vi nos últimos tempos tem... 90 anos. Trata-se de uma obra-prima japonesa do período do cinema mudo. Esteve quase cinco décadas perdido até ter sido encontrada uma cópia em 1971, o que possibilitou revelar ao mundo um filme extraordinário. Chama-se "Uma Página de Loucura" (1926) do realizador Teinosuke Kinugasa. 

Contemporâneo de Murnau e Eisenstein, Teinosuke Kinugasa mistura a atmosfera psicológica do primeiro com a montagem frenética do segundo. Os corredores cinzentos e a iluminação expressionista de um manicómio servem de pano de fundo para a historia de um marinheiro que se torna varredor para estar próximo da sua mulher que sofreu um colapso no passado e se encontra internada no hospício.


O ambiente do filme transparece loucura e profunda inquietação: personagens que dançam de forma esquizofrénica e gritam com as suas bocas sujas e escancaradas. A câmara capta ângulos ousados e subjectivos e movimenta-se à mercê da espiral de desespero dos personagens. Ao contrário da grande maioria de filmes mudos, este não possui intertítulos nem narração. Kinugasa foi um artista vanguardista que em nada fica atrás do formalismo estético de realizadores como Dziga Vertov, Sergei Eisenstein ou Walter Ruttmann. "Uma Página de Loucura" é um espantoso trabalho de construção visual e plástica que o mundo desconheceu durante décadas mas cuja idade não belisca em nada a sua modernidade. Uma pérola cinematográfica, portanto.

O filme na íntegra (60 minutos) está disponível no Youtube em baixo. Chamo a particular atenção para a espantosa banda sonora musical e sonoplástica do Aono Jikken Ensemble. Uma banda sonora nada convencional feita de ruídos, melodias orientais e percussão caótica - como no incrível e intenso momento a partir do minuto 23.

Sem comentários: